Flor a Flora - Capítulo 7
Felipe Caprini
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FLOR A FLORA
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Segundo conto da Série Urdidura das Feiticeiras
Capítulo 7
"Jaci"
🌹- I
Terça feira, 29 de maio de 1928
Salaí acordou no meio da madrugada ouvindo as Batidas na porta de seu apartamento, assim que abriu os olhos e assaltou na cama totalmente destrambelhado com o lençol enrolado em suas pernas, rapidamente apanhou a faca que deixava escondida sob o leito, alguém batendo na porta no meio da noite com certeza não era coisa boa. Vestiu uma bermuda gasta que mantinha apoiada encosto da cadeira da escrivaninha, saiu pelo corredor na ponta dos pés afim deaté se aproximar da porta de entrada que ficava diante da pequena sala.
— Quem está aí? — olhando pelo olho mágico não conseguiu identificar a pessoa no corredor escuro — Porra de Luz elétrica, não dá pra ver nada...
— Sou eu, Henrique.— disse a voz chorosa vinda do corredor.
Salaí retirou o trinco de corrente da porta e assim que abriu se deparou com Henrique com o rosto molhado de lágrimas e os olhos muito vermelhos como de quem havia chorado por todo o dia. Sem dizer nada ele deixou que o rapaz entrasse, Henrique sentou no sofá de Couro Caramelo da sala enquanto Salaí foi até a cozinha preparar um copo de água com açúcar.
Desde que haviam desembarcado do Cruzeiro cada um tomara seu próprio rumo, Henrique voltou para casa de Doralice e Salaí foi para o apartamento que alugava em um edifício de quatro andares no centro da cidade. Não houve briga nem nada naqueles dias, eles apenas ignoraram um ao outro, não falavam nada com medo de piorar a situação. Mas salaí sabia o motivo do Choro, algumas horas mais cedo a Entidade com qual ele trabalhava, um espírito chamado Exu Meia Noite, havia vindo dar-lhe a notícia de que muitas entidades da falange das Rosas haviam sido destruídas e entre elas uma que não era daquele grupo mas que estava na hora errada e no lugar errado, Cigana Sarah já não e existia mais.
— Obrigado.— disse Henrique apanhando o copo de água e sorrindo sem graça quando a ponta de seus dedos tocaram os de Salaí.
— Então você já soube?— Salaí sentou ao lado dele no sofá.
— Já sim, Tentei falar com Sarah ontem o dia todo, achei que já havia dado tempo dela me perdoar ou pelo menos estar aberta uma conversa, mas ela não me respondeu.
— Quem te contou? Rudá?
— Não. De tarde ouvimos um som estranho vindo da mata, parecia um lamento e Doralice acreditou que fosse um Urutau cantando, ela saiu para investigar e quando voltou disse que não era um pássaro e sim Kainana que chorava a morte de uma amiga. Então ela me contou.
— Ela deve ter ficado arrasada, era amiga da Cigana desde de...
— Desde que chegou ao Brasil. Eu não sabia que era possível uma alma morrer, achei que como já estavam desencarnadas eram incorruptíveis, mas Sarah morreu... E ela morreu com raiva de mim.
Salaí passou um braço sobre os ombros de Henrique e o puxou para perto, então deixou que o rapaz encostasse a cabeça em seu ombro e chorasse.
— Quer dormir aqui hoje?
— Posso? — Henrique pigarreou entre as lágrimas.
— Pode.
🌹- II
Belladonna nitidamente não estava nada bem, seu ar sarcástico havia desaparecido e aqueles rompantes de raiva não foram vistos pelos últimos três dias, estava ali sentada na cama de seu quarto de hotel olhando pela janela o entardecer enquanto Isaura andava de um lado ao outro do quarto colocando os perfumes e os cremes dentro da necessaire de couro disposta bem ao lado daquela mulher calada que brincava com uma pedra de citrino passando de uma mão a outra.
— Nossa quanta coisa...— disse Isaura cansada.
Perto da porta já estavam as duas enormes pilhas de cinco malas grandes cada repletas de roupas, o que era de se espantar pois quando haviam chego a Itália Isaura apenas trazia uma mala e Beladona carregava duas consigo, a própria Isaura agora tinha três Belladonna ia embora com sete.
— Eu não estou inválida, posso fazer minhas malas. — disse Belladon mal humorada.
— Não, o médico foi categórico, sem esforços pelos próximos sete dias.
— Pelo menos me deixe fumar.
— Só cigarro, aquele outro tipo de coisa não.
— Que vida triste.— Belladonna choramingou.
— Jorn nunca foi de esbanjar, guardou dinheiro por toda a vida, ele deve estar se revirando no túmulo agora ao ver que em uma única viagem para Europa você gastou um quinto da herança que recebeu.— Isaura bufou forma brincalhona abrindo a porta do armário e começando retirar de lá os casacos de pele que iriam ser despachados em um baú — você está bem Bela?
Beladona desviou o olhar da janela e seus olhos pousaram nos de Isaura.
— Tô tentando ficar bem.
— Foi por causa da cigana Sarah? Ainda está de luto por ela?
— É realmente uma pena que aquela cigana tenha... bom não sei bem o que aconteceu com ela, no sonho que tive com Sete Saias a história contada foi que ela morreu, mas eu não acredito que seja possível uma alma morrer, porém de qualquer maneira pelo que parece Cigana Sarah já não é mais parte deste mundo e nem do mundo dos espíritos, e por mais que eu jamais tivesse tido qualquer simpatia por ela pois sempre foi uma chata do caralho, ela era a melhor amiga da Sete Saia e por isso eu respeitava muito. Imagino como isso deve estar doendo em todas aquelas moças.
— Mas não é isso que está te incomodando não é? Ainda é sobre o bebê?
Instintivamente Belladonna abaixou o olhar e mirou a própria barriga.
— Mais ou menos, a questão do aborto mexeu muito comigo mas não foi pelo fato de eu ter perdido aquela criança mas sim por quê... Eu não fiquei triste pela morte dela.
Isaura largou os casacos em cima da cama, afastou a necessaire para o lado e sentou bem perto de Belladonna.
— Nós já conversamos muito desde que... de que tivemos que ir ao médico...
— Está falando quando eu fui vasculhada por dentro e lavada feito uma caixa d'água suja? Pelo amor de Deus se eu soubesse que a tal curetagem era desse jeito eu mesma teria feito um aborto caseiro muito antes da criança estar daquele tamanho e eu precisar passar por isso.
— Durante todas as conversas que nós tivemos você disse muita coisa mas eu te conheço desde que você era um bebezinho de colo, eu sei o que está te incomodando, e eu também sei que você é do tipo que se não por para fora não vai melhorar.
— Mas eu já coloquei para fora, Pergunte para o médico que levou os restos dentro de um saco de lixo.
— Não fale assim do bebê. Eu estou falando dos seus sentimentos pela sua mãe.— Isaura segurou uma das mãos e Beladona entre as suas.
Belladonna voltou seu olhar para a janela vendo o sol alaranjado diminuindo de intensidade sumindo no horizonte.
— Eu sou Idêntica a ela. A Mag já disse isso muitas vezes, Doralice também disse. Eu sempre me imaginei extremamente diferente de Sarana, ela sempre foi uma mãe horrível para mim e muitas vezes quando nos encontramos, quando eu ainda era uma menininha andando por aí com o uniforme escolar e meia três quartos, não sei quantas vezes ela me olhou nos olhos e disse que me odiava, que preferia que eu tivesse nascido morta e que estava muito feliz de papai ter me aceitado caso contrário ela teria me afogado em um balde de água tal qual as pessoas fazem com as crias dos cachorros de rua. Eu sempre achei isso a coisa mais horrorosa do mundo, uma mãe que não ama seus filhos. E eu na primeira oportunidade que tive também não Amei meu filho.
— Belladonna você não se parece nada com Sarana, e eu posso dizer muito bem porque a conheci antes mesmo de conhecer seu pai. Sobre você não ter tido sentimentos a respeito do bebê, nenhuma mãe ama um filho simplesmente porque ele está dentro da barriga há poucos meses, o amor é algo que se constrói e mesmo as mães que desejam extremamente a maternidade Só realmente tem amor pela criança quando acontece a hora do parto e a mãe pode olhar nos olhos daquele bebê que carregou durante nove meses. É claro que as mulheres por aí sofrem muito quando acontecem abortos espontâneos mas elas sofrem por causa da desilusão e não por luto de um ente querido, você não pode se comparar com Sarana pois ela olhou nos seus olhos quando você nasceu e não sentiu nada, nem por você nem por Henrique, e eu duvido que se você tivesse tido a chance de dar à luz a uma criança faria a mesma coisa que ela.
— Talvez eu fizesse.
— Bella, que nome era que ele escrito na sua agenda? Na última página da sua agenda.
— Você leu?
— Sim, aquilo não era um diário então tomei a liberdade de pegar para organizar seus horários, e na última folha da sua agenda havia um nome de menina escrito. Era o nome que você ia dar para ela não era?
— Betânia... era o nome que eu ia dar para o bebê. — Belladonna ergueu a mão livre rapidamente para enxugar uma lágrima antes que ela escorresse pela bochecha.
— Você é uma mulher jovem e fértil, guarde este nome, no futuro quem sabe você não decide ser mãe? Então você poderá ter um bebê no colo chamado bebê Betânia.— Isaura soltou uma risadinha.
— Talvez eu faça isso mesmo, talvez um dia eu tenho uma filha para ensinar a ela como ser uma mulher independente.
— Me diz uma coisa meu bem, por que você não vai se eles pedir de Mag? Em algumas horas vamos embora e sabe Deus quando veremos a Europa de novo?
— Você quer que eu vá me despedir dela ou quer que eu vá receber o dinheiro que ela te deve?
— Ah sabe como é né meu bem, eu tenho minhas economias mas não posso me dar o luxo de deixar nenhum vintém para trás.— disse Isaura sorrindo com timidez.
Belladonna ficou em pé, vestiu seu casaco de lã branca, apanhou sua bolsa e deu um beijo na testa daquela que era a pessoa que ela mais amava no mundo, então saiu do quarto caminhando com passos pesados pelo corredor tentando gravar na memória tudo o que pudesse ver, todas as lembranças que poderia ter da Itália.
Na rua ela estendeu o braço para o primeiro carro que passou, o taxista, um rapaz loiro de olhos azuis intensos a olhou de modo curioso mas por estar com carro cheio não parou.
Belladonna mesmo que por um único segundo olhou no fundo dos olhos aquele rapaz e sentiu um arrepio nas costas, sinal que um dia o veria novamente.
Foi até a casa de Mag, apanhou o envelope com dinheiro e então retornou ao hotel.
Às vinte e duas horas o Cruzeiro partiu de Porto de Civitavecchia rumo ao Rio de Janeiro, e por mais que tentasse negar, Belladonna estava aliviada em estar voltando para casa.
🌹- III
Era um pântano, o cheiro de barro podre cozido pelo calor da selva era insuportável, as árvores de troncos finos em tons escuros, folhas pegajosas e os malditos caranguejos que zanzavam de um lado para o outro causavam nela repulsa.
A belíssima mulher ia caminhando pelo Pântano em plena luz do dia porém pelo tamanho das Copas das Árvores era impossível que a luz do sol tocasse sua pele morta, assim nenhum redemoinho se formava a sua volta.
O homem indígena de beleza Incomparável parou sua caminhada e olhou para trás, alguns metros vinha ela segurando as barras de seu vestido vermelho de saia armada com as pontinhas dos dedos para que não agarrassem no lamaçal, a mulher de pele clara e olhos verdes como Esmeraldas sorriu para ele enquanto a brisa balançava a cabeleira cacheada que caia até abaixo da cintura em um tom de negro petróleo.
— Desculpe, eu não sei o que está acontecendo mas os meus sapatos estão afundando nessa merda.— disse Maria Padilha olhando desgostosa para seus pezinhos adornados por um par de sapatos de saltos tão altos que deixavam o peito do pé totalmente na vertical.
Rudá balançou a cabeça.
— Pelos Deuses Padilha, você está morta, não se esqueça que tanto seu sapatos quanto seus pés ou seu vestido não existem no mundo real, não são de matéria e sim apenas ilusão projetadas pela força da sua alma. Se o seu saltos estão afundando na lama é porque você está tão apegada a sua própria beleza que está fazendo a sua aparência se tornar real, pare com isso.
— É difícil não acreditar na própria beleza quando realmente se é bela.— disse ela dando um salto curto sobre uma poça de lama.
— Vai lamentar por isso?
— Você não faz ideia mas ser uma gostosa é um fardo pesadíssimo. — Ela riu baixinho.
Cerca de uma hora antes Padilha havia mandado um recado a Rudá através de uma entidade infantil, aquelas coisinhas extremamente irritantes que eram chamadas de Exu Mirim. Dama da noite sempre trabalhou junto com Tetemburu, já Padilha havia conseguido formar uma aliança com um pequeno menino morto chamado Alaster, um menininho com aparência de aproximadamente sete anos de idade e cabelo loiro encaracolado com uma pele branca albina e olhos grandes de Iris vermelhas, Alaster havia encontrado Rudá na floresta próximo à casa de Doralice e transmitido a ele a mensagem de que devia encontrar Maria Padilha sem fazer alarde próximo da entrada da toca de Dama da Noite.
Rudá jamais teve intimidade com Maria Padilha, porém sabia da fama dela de levar tudo muito a sério, assim que chegou do mausoléu no centro do cemitério, Tumba esta que dava entrada para a toca subterrânea da pombagira do ouro, lá estava Maria Padilha com seu deslumbrante vestido vermelho o esperando.
Rudá ouviu o som da discussão das moças que estavam em baixo da terra, na casa de Dama da Noite se ouviam os gritos furiosos de Rosa Vermelha que discordava das demais, ele ouviu também as vozes de tantas outras moças que a muito tempo não tinha Notícias como Figueira e Rainha.
— Nossa... estão todas aí embaixo?
— Sim.— disse Maria Padilha torcendo os lábios em uma careta de reprovação— Todo o nosso time de princesas e também Dama da Noite e mais umas doze ou treze que nós conhecemos, todas muito preocupadas.
— Com destino de Sarah e das outras que foram exterminados?
— Não, Rosa Vermelha, Rosa Caveira, Sete Saias e Navalha com certeza estão extremamente preocupadas com o que aconteceu com Sarah, mas na realidade todas as outras vieram apenas para garantir que elas mesmas não tenham o mesmo destino. Estão lá discutindo faz dois dias e eu já perdi a paciência, comigo as coisas têm que ser resolvidas de imediato e não suporto essa ideia de todas as moças juntas entrarem em consenso, gosto de ser o ponto fora da curva então vou agir sozinha. Você pode me ajudar nisso Rudá?
— Depende. Sei da sua fama Maria Padilha, e sei que faz mais de uma década que você passa mais tempo lá embaixo — ele apontou o dedo indicador para o chão— do que aqui em cima.
— Não entendo qual é o medo que vocês têm de dizer o nome, eu conquistei um Palácio no inferno e não tenho nenhum problema em ficar dentro da minha casa, venha para cá quando tenho que vir. Enquanto a minha fama você deve convir que sou famosa por não perder tempo com bobagens.
— Então para que precisa de mim?
— Invés de ficar discutindo com as outras moças sobre como nós podemos enfrentar uma deusa, eu quero ir diretamente conversar com uma igual aquela que causou todo o mal. Preciso que você me leve até sua mãe Rudá.
Então Rudá levou o Maria Padilha por um caminho na floresta, mas por caminho muito estranho, começaram ali por trás da mata fechada da Mambucaba, andaram por entre trilhas prontas e depois entraram pela Mata intocada, após cerca de quinhentos metros dentro da Mata densa Maria Padilha ficou totalmente desnorteada, a região da Mambucaba era Rio de Janeiro porém conforme seus passos iam avançando os dons que ela adquiriu com o passar do tempo a respeito de localização começaram a confundi-la, a energia que ela sentia era algo como sul da Bahia, mais alguns passos sentiu uma energia Idêntica a Roraima, mas como isso seria possível se nitidamente ela estava no Rio de Janeiro? Sem dizer nada Maria Padilha deu um salto no ar atravessando a Copa das Árvores, imediatamente um redemoinho de vento se formou a sua volta mas ainda assim ela conseguiu ver que estava no meio de uma selva e não havia Nem sinal da cidade do Rio de Janeiro ali próximo.
— Ruda, Que tipo de Magia é essa? Onde nós estamos? Que parte do Brasil é?— disse ela ao pousar com suavidade sobre um tronco tombado.
— Você não espera que eu vá lhe dar o endereço de onde os deuses originais moram, espera? Tudo que tem que saber e que ainda está no Brasil, mas o local é impossível de detectar, se buscar pela energia vai encontrar partes referentes a todas as regiões inclusive de fora do Brasil, tem muito de Bolívia aqui também.
— Tudo bem, só me diga que você vai me levar de volta quando tudo acabar, não quero ficar perdida numa maldita Floresta úmida.
E assim eles continuaram até que chegaram naquele pântano, mas uma hora de caminhada e finalmente o pântano desapareceu e Padilha pisou seu sapato sujo de lama em uma clareira de terra batida, e o mais interessante é que quando ela caminhou sobre o sol nenhum redemoinho de vento se formou à sua volta.
— Nossa... que diferente.
— É que o sol desse lugar não é o mesmo sol natural de lá de fora, este sol que está nos iluminando é a casa do meu pai Guaraci, mas vamos lá, se quiser falar com a minha mãe, pode entrar.— Rudá Estendeu o braço apontando para o centro da clareira onde não havia absolutamente nada.
Mas assim que Padilha deu alguns passos naquele terreno aberto imediatamente como em um Piscar de olhos se formou em sua frente à visão de uma grandiosa maloca coberta com com palha tão branca que parecia ser pintada à mão fibra por fibra, e o cheiro que invadiu seu nariz era tão doce como a das mais suculentas frutas da estação.
— Nossa que lindo... Mas o que eu faço? Bato palmas e gritos "Ô de casa"?
— É só entrar, mamãe domina toda a floresta pela qual passamos, se ela nos permitiu passar é porque você é bem-vinda, caso contrário teríamos andado por dias sem encontrar saída.— disse Rudá animado.
Maria Padilha entrou atravessando o portal de madeira na entrada da maloca onde se via carimbado em cada viga pequenas meia luas em tinta branca, lá dentro sentada em uma grande cadeira de Bambu trançado com cipó estava a deusa Jaci, nua e delgada penteando os longos cabelos brancos prateados enquanto olhava para frente e mirando-se no espelho que era sustentado por dois daqueles espíritos chamados curumins.
O interior da Maloca era iluminado como se fosse refletido nele o brilho da própria lua e só depois de procurar por todos os lados a fonte da luz é que Padilha percebeu que a fonte era a própria deusa que luzia através de sua pele cor de canela e de seus cabelos misteriosamente resplandecentes.
Um terceiro Curumim passou por trás de Padilha esbarrando de leve na saia armada do vestido, trazia sobre a cabeça um pequeno banquinho feito de madeira, então colocou próximo a deusa apontou para ele depois apontou para Padilha e disse com a voz aguda infantil:
— Vermelhona, aqui.
Padilha se dirigiu até o banquinho e com toda a boa educação que tinha sentou de maneira graciosa.
— Me desculpe senhora Jaci, por mais que eu conviva muito com... seres espirituais, ainda não possuo noção da etiqueta ser usada diante de uma divindade.— disse ela com a cabeça baixa.
— Levanta a cabeça princesa,
Senão a coroa cai... — disse um curumim de modo a zombar dela.
— Quieto Nonoko! — a deusa gritou com voz estridente, em seguida com um tom, macio e gentil se dirigiu a Padilha — não se preocupe meu bem, meu filho se comporta como se fosse um fantasminha qualquer, eu já sabia que ele jamais iria exigir qualquer reverência, a partir do momento que você convive com Deus e ele não te informa não é sua culpa não saber. Publicamente é Claro que temos muitas regras de bons modos, mas estamos apenas nós aqui então vamos direto ao assunto sem gastar tempo com bobagens.
— E a senhora poderia me ajudar? Imagino que já esteja a par de toda situação.
Um dos curumins entrou correndo na Oca trazendo uma peneira de palha e dentro dela um pente feito de marfim acomodado sobre um farto chumaço de algodão, Jaci apanhou aquele pente e voltou a tratar dos cabelos.
— Todos nós sabemos, quando Oxum quase matou aquela humana usando aquele garoto feito de terra ou sei lá o quê, aquilo foi um escândalo.
— Está dizendo que o ferimento de Alexandra causou mais comoção do que o extermínio de diversos espíritos? Minha grande amiga cigana Sarah foi destruída, Rosa cigana, Rosa de Fogo, Rosa Kalunga... isso não te incomoda em nada?
Jaci parou de pentear os cabelos e olhou para Padilha.
— Agora sim eu estou decepcionada.
— Porquê?— disse Padilha sobrancelhas em arqueadas de surpresa.
— Entre todas as entidades que vem surgindo nas últimas décadas, realmente entre todas elas você é a que mais se destacou Maria Padilha, Inclusive eu nutria a esperança e que você viesse um dia assumir o meu lugar.
— Assumir?
— Sim, estou cansada de ser uma grande deusa e todo o blá blá blá que isso envolve, e pelo seu crescimento tão rápido Achei que você seria uma figura deslumbrante e não alguém que faria perguntas tolas
— Qual foi a tolice que eu disse?
— Ora essa minha Pequena Garota ingênua, todos sabem que é impossível matar uma alma. Obviamente suas amigas estão vivas.
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📚 Glossário:
1. Urutau: Pássaro que tem seu canto similar a um grito ou lamento humano. É comumente chamado de "alma penada" ou "mãe da Lua".
2. Maloca: tenda indígena de grandes dimensões dedicada à moradia de líderes de aldeias, a palavra Maloca significa uma oca Grande.
Nossa como são exuberantes, eh muito criativos os seus contos, sou sua grande fã, eh não perco uma .... esperançosa por demais para os próximos capítulos, *aí Felipe não demora muito não* , não me mate de tanta curiosidade eh ansiedade. Bjosss, forte abraço, sucessos sempre.
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