Contos das Muitas Marias - Segunda Temporada - PARTE 2

Aqui continua a Novela "Contos das Muitas Marias - segunda Temporada"

A partir do sétimo conto.

Para ler os 6 contos anteriores clique no Link:

 PARTE-1-da-segunda-temporada


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Contos desta Pagina:


🌈🍷Sete Saias (05/04/2021)
Conto 7: A Bruxa e a Cigana


🌼 Tata Mulambo (09/04/2021)
Conto 8: Bicho-de-Pé 


🌹 Rosa Vermelha (14/04/2021)
Conto 9: O Marinheiro


👑 Rainha das 7 Encruzilhadas (20/04/2021

Conto 10: A Rainha de Cantábria 


🌺Maria Farrapo

Conto 11: Jurema (01/05/2021)


⚰Sete Catacumbas (22/05/2021)

Conto 12: O Setimo Cadeado


👄Maria Padilha (03/06/2021)

Conto 13: Passarinhos 


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CONTO 7: A BRUXA E A CIGANA

🕯⚰🗡🕯⚰🗡🕯⚰🗡🕯⚰🗡🕯⚰🗡🕯⚰🗡
Ela nunca me procurava...
Nunca.
Mas eu sempre ia atras dela.
Ainda era minha filha,
Apesar de tudo ela era.
Eu me sentia muito culpado,
Entende?
Dividido.
Eu sou um homem morto,
Um cigano Kalon.
A alma cigana pertence
A um lugar chamado Lemúria,
É para lá que nossas almas
Tem de ir.
Mas após a minha morte
Eu não fui para lá,
Eu não quis.
Se eu fosse... nunca mais
Veria minha Soraya.
Insisti muito para ve-la,
Ela chegou na hora marcada,
E nos encontramos na mesma
Clareira da floresta,
Lugar onde havia,
muito tempo antes,
Nosso acampamento.
Sentei em uma pedra,
A observei vir caminhando
por entre as árvores até
Ela sentar ao meu lado.

🌙 — Minha filha... como tem passado?
🍷 — Sua bênção pai. Eu estou bem, na medida do possível estou bem. E o senhor?
🌙 — Bem meu anjo, sempre bem.
🍷 — E quando o senhor vai embora?
🌙 — Não seja assim Soraya...
🍷 — Sete Saias. Meu nome é Sete Saias. Soraya não existe mais.

A olhei nos olhos,
Me lembrei de quando era
Viva e tinha belos olhos verdes,
Olhos como os meus,
Mas agora apenas o olho
direito era verde, a iris do
Olho esquerdo era vermelha.
Ao analisar bem aquele rosto,
Em uma fração de segundo
O vi se deformar,
Era como se fosse feito de
Massa, as formas ficaram confusas,
Metade do rosto teve as feições
intensificadas como se ela
Esivesse com ódio, mas
A outra metade exibiu uma
Expressão muito serena.

🌙 — O que foi isso?

Ela levou as mãos ao rosto
Segurando a face como
se tivesse medo que desmoronasse.

🍷 — Nada.
🌙 — Soraya, seu rosto...
🍷 — ja disse que não é nada. Não se preocupe com besteiras quando deve se preocupar em partir.
🌙 — Só partirei quando tu puder ir junto.
🍷 — Os portões de Lemúria não ficam abertos eternamente.
🍷 — Isso não é justo.
🌙 — Nós somos uma família.
🍷 — Éramos.
🌙 — Somos. Eu errei com você, mas...
🍷 — Não fale disso, ja faz décadas.
🌙 — Preciso sim. Eu lhe abandonei em vida, e por isso... por isso tu morreste daquela forma... naquele lugar. Não vou lhe abandonar de novo.
🍷 — Todo o clã depende do senhor, eles não podem ir para Lemúria se o senhor não for com eles. Não é justo, só o patriarca abre as portas. Esmeralda ja manifestou a insatisfação dela com esse assunto mais de uma vez.
🌙 — Esmeralda vai ter de esperar.
🍷 — E Sarah? Igor, Yago, Madalena, Pablo...
🌙 — Todo o clã vai ter de esperar.
🍷— Até quando?
🌙 — Até eu conseguir te libertar. Você não vai ficar presa nesse mundo, não vou deixar. Se eu for para Lemúria, você vai ter que vir junto.

Ela sorriu, mas sorriu triste.
Descansou a cabeça em
Meu ombro, eu fechei os olhos
por um instante.

🍷 — Quem diria, o grande Wladimir se sacrificando por uma mulher...
🌙 — Quem diria... mas é como diz o ditado, a o aço só é forte após passar pelo fogo. Eu vou consertar todos os meus erros Sora... Sete Saias.

Ela se foi, voltou para junto
Daquelas as quais ela agora
Chamava de irmãs.
Eu passava os dias e as noites
Em uma busca incessante
Atrás de uma resposta a respeito
do que prendia a alma de minha
Filha a este mundo,
E mesmo com todo o clã
revoltoso eu me negava
A deixar Soraya para trás.
Ou íamos todos para Lemúria
Ou não iria ninguém.
Foi então que passado algumas
semanas chegou a meus ouvidos
O bochicho de que uma feiticeira
Havia sido assassinada por uma
Alma maldita, a tal Rosa Caveira,
E que o motivo do ato foi que
A feiticeira havia usado um item
Portador de grande magia
E que pertencia a Rosa.
Pensei "se esse objeto é poderoso, pode ajudar a minha filha",
Então fui atras de uma dessas
Moças, escolhi falar com aquela
que eu sabia ter apreço verdadeiro
Por minha Soraya.
Fui até aquela mansão abandonada
Perto da Quinta dos Santos,
E lá encontrei Maria Padilha.
No salão abandonado, repleto
De teias de aranha e morcegos
Encarapitados nas vigas podres.
Ela nem se dignou a ficar em pé
Quando entrei, do jeito que estava
deitada em um divã, fumando
Uma cigarrilha, ela ficou.

🌹 — Boas noites... ou seria melhor de dizer...Optcha!

Ela zombou.
Era muito mal educada.
Eu forcei uma risada,
Afinal precisava daquela uma.

🌙 — Boas noites. Bem, eu queria falar contigo...
🌹 — Falar em pé ou deitado?
🌙 — Não seja abusada.
🌹 — Ai ja é pedir demais. O que quer falar? Veio me ameaçar de morte, como fez varias vezes?
🌙 — Já estamos mortos.
🌹 — Ah sim, que distração a minha... sente-se, diga a que veio.

Sentei em uma
Cadeira velha e empoeirada.

🌙 — Ouvi dizer que Rosa Caveira tem uma caixa que dá poderes, que uma bruxa usou deles e...
🌹 — A bruxa esta presa em um mausoléu, virou um fantasma. Mas sim, existem caixas que dão poderes. O que você quer com elas?
🌙 — Ajudar a minha filha.

Ela se aprumou, sentando
Com as costas eretas.

🌹 — Defina Ajudar.
🌙 — Quero que minha filha venha comigo para Lemúria.
🌹 — Sabe que ela é amaldiçoada, não sabe? Ela é como eu.
🌙 — O que sei é que antes de entrar naquele maldito cabaré e ser maculada com essa feitiçaria imunda de Quitéria, ela era cigana.
🌹 — E o que tem ser cigana?
🌙 — Corre Magia nas veias do meu povo.
🌹 — Acha que a linhagem cigana pode quebrar a maldição?
🌙 — Com alguma ajuda, acho que pode. Você é a melhor amiga dela, é a pessoa que cuidou dela quando eu... me isentei. Sei que se preocupa com minha Soraya, então... me ajude a salvar ela.

Padilha ficou em silêncio
por um longo tempo.

🌹 — Sete Saias esta em conflito. A alma dela é... dividida. Metade da alma é como eu, metade é como você Wladimir.
🌙 — A metade mais antiga é como eu, essa é a parte original dela. Minha mãe, Lurdes, criou Soraya para ser uma princesa Cigana, não uma prostituta ou uma bruxa de encruzilhada. Sem ofensas.
🌹 — Não ofendeu. Tudo bem, vou ajudar.

E ela me disse o que iria
Acontecer, marcou para a
Noite seguinte, as três da madrugada
Ali naquela mansão velha,
Ela traria uma das tais caixas,
Nós iríamos ajudar minha filha.
Na hora marcada eu estava lá,
Levei comigo Esmeralda e Yago,
Uma precaução para acaso Padilha
Resolvesse prontar alguma traição.
O grande salão de bailes da mansão
Estava completamente vazio,
Apenas quatro mulheres lá,
Minha Soraya, Padilha, Mulambo e...
Quitéria.
Yago cochichou no meu ouvido:

💍 — Tio, porque as três Marias estão aqui?
🌙 — Não sei...
💍 — Cuidado, elas se odeiam, só se unem quando querem fazer feitiçaria pesada...
🌙 — Acha que tem tramóia?
💍 — Acho.

Soraya sorriu para nós
Enquanto se aproximava.

🍷 — Padilha disse que iria ajudar vocês a irem para Lemúria.
🌙 — Com você junto, é claro.

Soraya fez feição de confusa,
Olhou para Padilha que moveu
Os labios dizendo "Confie em mim".
Ela então Soraya sorriu para nós
e se colocou no centro da sala,
Vi que ali haviam duas caixas
De madeira, Soraya subiu sobre elas.
Meu coração apertou,
Havia alguma coisa errada ali.

🌙 — Padilha, o que realmente vai acontecer aqui? Porque vocês três vieram juntas?

Ela gargalhou, desgraçada!

🌹 — Esse conflito em Sete Saias, essa questão de ser metade bruxa metade cigana... vamos por um fim nisso. Como um bom cigano que és eu creio que se lembra da lenda de Santa Sara Kali... foram as três Marias da biblia que intercederam pelas almas naquele barquinho, não é? Maria Madalena, Maria Cleófas e Maria Salomé. Pois bem, hoje temos aqui tres marias também, a diferença é que não somos santas. Eu, Mulambo e Quitéria vamos fazer o serviço inverso daquele que as tres santas fizeram no passado, afinal elas salvaram a alma de Sara Kali... mas hoje nós vamos atacar a parte cigana que esta nela. O intuito é matar quaisquer resquício da tal "Cigana Sete Saias", o que deve prevalecer é a feiticeira... a Bruxa Sete Saias, a linhagem de Sara Kali tem que morrer dentro dela.
🌙 — Não vou permitir isso!
🌹 — Faça o que puder, eu sempre gosto de uma briga justa.

Corri até minha filha e a puxei pelo braço.

🌙 — Soraya desça daí! Não entendeu o que elas querem fazer contigo?
🍷 — Entendi sim.
🌙 — Ora, então desça logo daí!
🍷 — Não.

Padilha correu e a segurou
Pelo outro braço.
🌹 — Ela disse não, respeite homem!
🌙 — Soraya! Não renege a sua linhagem Cigana, nos somos o povo mais antigo do mundo e...
🍷 — Ah pai... cale essa boca!
🌙 — O quê? Não fale assim comigo, eu sou seu pai!
🍷 — Eu não reneguei agora a minha linhagem cigana, o senhor me expulsou! Eu tinha treze anos! Treze! E o senhor queria me obrigar a casar com seu primo velho gordo... e quando eu me recusei, o que recebi foi um surra, uma trouxa de roupas e fui largada a própria sorte no meio da floresta.
🌙 — Eu não fiz por mal, era a tradição! As coisas tinham de ser assim!
🍷 — Me fale papai, me fale de Maraieva, a minha irmãzinha, como ela sumiu? Como uma criança de um ano de idade some?
🌙 — Ela... era defeituosa, você sabe!
🌹 — O que vocês, ciganos malditos fizeram com ela?
🌙 — Você sabe o que foi feito, não sei porque está desenterrando essa história agora!
🍷 — E Silon? Meu primo Silon?
🌙 — Por Kali Soraya, era um efeminado, nos tínhamos de expulsar!
🍷 — Você não entendeu ainda não é? Vocês ciganos de merda prezam pela pureza, pela linhagem nobre do sangue, mas é com os diferentes que é o meu lugar. Eu fui parar no cabaré, no cabaré sim, no meio de prostitutas, efeminados, deformados, negros e asiáticos, no meio dessa gente que para mim é a MINHA GENTE.
🌙 — Pense o que quiser, diga o que quiser! Mas a sua alma Cigana sempre vai ser parte sua, nunca vai se livrar dela! Quem sai aos seus não degenera!

🍷 — EU NÃO QUERO SER CIGANA!

🌹 — Agora Quitéria!

Então aquela Maria Quitéria
Também segurou no pulso de
Soraya, ela e Padilha estenderam
As mãos livres para trás para que
Mulambo as puxasse,
Mulambo assim fez enquanto
Cantava:

“Cabra Preta que no monte subiu,
Traz a tona a Sete Saias que
Da encruza sumiu.
Sete Saias, assim como o galo canta,
Burro rincha, o sino toca e a
Cabra berra, assim tu hás de ser livre
Do laço de cetim!
Assim como Caifás, Satanás, Ferrabrás
E o Maioral do Inferno,
Que fazem todos dominar,
Fazei Sete Saias se dominar,
Para fazer de Kali um cordeiro,
Presa debaixo do teu pé esquerdo.
Nada ha de rachar, a luta vencerá
Pela da Cabra Preta do mal eterno,
Que é senhora do alto do Ararath
E da cova profunda do inferno.
Sete Saias, com dois eu te vejo,
Com três eu te Solto,
Com Caifás, Satanás, Ferrabrás
Lhe faço ser irmã de Yeborath!

Mulambo repetiu a ladainha,
Padilha e Quitéria repetiram
Entoando aquilo em coro.

🌙 — Rapido me ajudem!

Os meus ciganos vieram,
Esmeralda segurou no pulso
de Soraya junto comigo,
Yago segurou os nossos pulsos livres
e assim ficamos na mesma posição
que as bruxas.
Começamos a cantar
O hino de nosso Clã,
Isso era a oração mais poderosa
Afim de avivar a alma cigana
De minha filha.

" Ô Cirandeiro, ô Cirandeiro ó!
Ô Cirandeiro, ô Cirandeiro ó!
A Luz do anel brilha mais
Do que o sol!
Ô Santa Sarah, ô Santa Sara ó!
Ô Santa Sarah, Santa Sara ó!
A luz do teu olhar
Tinha fogo e me queimou!
Os teus olhos me enfeitiçam,
É tao grande a tua beleza!
Os sete mares tu abrange,
Pois Kalon é o teu sangue!
Nós ciganos podemos até
Muitas vezes o caminho errar!
Santa Sara lhe entrego  com fé
Esse meu caminhar!
Nossa vida é liberdade,
E agora eu vou lhe dizer,
Nunca temo o caminho
mesmo com medo de se perder!
Nunca temo o caminho
mesmo com medo de se perder!"

Era uma confusão de vozes,
Nosso lado e o lado delas
Cântando a plenos pulmões.
Então senti meus pés se
Erguerem do chão, era como
Se estivesse a um centímetro
Do solo.
Soraya deu um tranco,
O corpo dela começou a girar,
E nós segurando firme nela
Giramos junto.
Segurava com toda a força no
Pulso dela, Esmeralda e Yago
Também não se renderam,
Mas infelizmente o lado de lá
Também estava firme.
Chamas de fogo azulado brotaram
Das caixas, era como se
Minha filha estivesse girando
sobre uma fogueira diabólica.
Os olhos dela emanavam luz,
O olho direito era como um prisma,
O esquerdo um farol rubro,
Ela escancarou a boca e gargalhou,
Mas a voz era duplicada,
Eu pude ouvir nitidamente um
Riso suave e uma gargalhada
Cheia de deboche.
A velocidade do giro
Aumentou tanto que a saia dela
estava aberta, girando no ar,
Os cabelos revoltos espalhados
Pelo vento que agora assolava a sala,
E de repente um clarão amarelo,
Um som de trovão,
E todos nós fomos arremessados
Para longe.
Me ergui rapido olhando em volta,
Vi do outro lado do salão
As três Marías também se levantando.
Esmeralda perguntou:

💚 — O que é aquilo?

Olhei para o meio do salão,
O corpo de minha filha reluzia
Como uma brasa,
Estalava como um carvão aceso.
Aos poucos foi se dividindo,
A massa do corpo se entortou
E então  se tornou duas
E essas massas se tornaram
Duas mulheres abraçadas.
Aos poucos desfizeram o abraço
e deram um passo para trás
admirando uma a outra.
As duas eram idênticas,
O mesmo rosto, mesma pele
E cabelos, mas os olhos e as roupas
eram distintas,
Os olhos de uma eram vermelhos
e os da outra, verdes.
A de olhar vermelho usava um vestido
Flamenco, rubro e negro,
A de olhos verdes usava o mesmo
vestido mas nas cores do arco-íris.
Elas se olharam confusas.

🌹 — Deu certo!

Olhei para Padilha.

🌙 — O que é isso?

A mulher de roupa arco-íris
sorriu para mim.

🌈 — Sou eu pai, Soraya. Eu sou a Cigana das Sete Saias. Eu sou... Cigana.

Me aproximei dela incrédulo.
A outra mulher, a de roupa rubro-negra
Me olhou torcendo os lábios
Sem disfarçar o asco.
Padilha foi até ela e a abraçou.

🍷 — Feiticeira! Obrigada.
🌹 — Agora vai ficar tudo bem, você é uma única mulher. Sete Saias das Sete Encruzilhadas...

🌙 — Vocês duas... vocês eram a mesma pessoa? Vocês...
🍷 — Sim.
🌈 — Sim.
🍷 — Mas agora vamos ter paz. A parte cigana não mais me assolará com culpas e conceitos.
🌈 — A parte bruxa não mais me sujará com magia negra.

🌙 — Como isso é possível? Como uma alma pode se tornar duas? Eu não compreendo?
🌈 — Tudo é possível para aquele que crê. Agora vamos embora, quero ver vovó Lurdes e Pablo, Filomena e... Ah Esmeralda, que saudades.

Ela correu e abraçou Esmeralda
Que assustado não retribui o abraço.
A tal Sete Saias das Sete Encruzilhadas
Gargalhou nos vendo juntos.

🌙 — Porque ri de nós?
🍷 — Sabe da onde veio a maldição que me prende a esse mundo? Veio justamente daquilo que estas caixas guardam. Sabe qual é a maior graça? Qualquer um que tenha contato com essa magia é amaldiçoado. Você estava segurando meu pulso, não estava? Bem no ato da magia? Ah Wladimir... Nada de Lemúria pra você, nada de Lemúria pra sua gente. Somos todos malditos agora.

Olhei para a Cigana das Sete Saias.

🌙 — O que ela disse é verdade?
🌈 — Infelizmente... sim.

Tentei muitas vezes ir para Lemúria
Com meu povo, mas não pude,
Todos os ciganos de meu clã,
todos os que estavam sob a minha
liderança ficaram presos neste
Mundo comigo.
Eu recuperei metade de minha filha,
A metade cigana, e a amo muito,
Minha querida Cigana das Sete Saias.
Mas a outra metade eu também amo,
Ela agora se auto intitula
"Pombagira das Sete Saias".
Ainda não entendi o que é
Ser Pombagira, mas é o que
Ela afirma ser.
Ela não gosta de mim,
Não se aproxima de qualquer
Coisa que seja cigana,
Mas ela é uma de nós,
La no fundo eu sei que
O destino das duas metades
é se unir novamente.
Fico pensando se um dia
Poderei sair daqui e ir para
Lemúria.
E devo confessar que... se eu
puder ir... quero levar as duas
Sete Saias comigo.

Hoje eu fiquei pensando muito
Nisto.
Eu estava indo junto com
Meu povo todo para uma festa
Cigana, em uma casa de mediuns
Que prezam pela espiritualidade.
Chamam agora isso de Umbanda,
Pois a gente de hoje é criativa
Em dar nomes aos credos.
No meio desta festa haviam
Lá duas mediuns, uma se
Deixou incorporar pela cigana,
A outra pela Pombagira.
Enquanto dançavam
era como se fossem figuras
Espelhadas,
Dançavam de modo igual
uma de frente para a outra.
Fiquei olhando aquilo e me
Lembrando de quando éramos
Vivos e minha Soraya era uma
Menina animada e faceira
Dançando em torno das fogueiras
nas noites de festa do nosso povo.
Eu não entendo porque tudo
No caminho dos espíritos é
Tão confuso.
Mas eu juro que vou juntar
As duas metades de minha
Soraya novamente.
Tanta gente vai até estas
Partes dela pedindo por felicidade...
Eu queria ter alguém a quem pedir,
E eu pediria apenas que
Ela finalmente fosse uma.
Que ela finalmente fosse... feliz.



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CONTO 8: BICHO-DE-PÉ

🌼🌕🌖🌗🌘🌑🌒🌓🌔🌕🌼
Eu corria pela mata com Zangão
E com Tentém.
Tentém é menina mas corre
Rapido quinem a gente.
A gente é gente morta, espírito.
Éramos vinte e um, 
Doze meninos e nove meninas.
Todos nós eramos crianças,
E Tata dizia que a gente era Mirim.
É nome que indio dá
Pra criança, sabe.
Tata é quem cuidava da gente,
Ela que foi atrás de cada um.
Ah eu falei de Zangão e de Tentém,
Mas não falei de eu, e eu sou
Bicho-de-Pé.
Sabe, a gente que é espírito criança
Fica muito perdido.
É porque a gente não sabe como 
Ou quando, ou onde morreu.
A gente nunca sabe.
Tata diz que é porque foi morte
Muito feia, e que por isso
A gente esquece.
Esquece pra não ficar melindroso
O tempo todo.
A gente corria na mata,
Porque Saúva, que era uma
Molecota muito chata,
Ficava mexendo com a gente,
Então a gente corria dela.
Mas ja era quase de dia, o céu
Ja ia laranjando, e Tata
Disse que não era pra ficar 
Solto no mato de dia.
Então a gente voltou pra gruta.
Era na gruta atrás da cascata
Do Sete-Quedas que Tata Morava,
E a gente morava com ela.
Tata era bonita sabe,
Tinha a cara de boneca
e o cabelo branquinho feito algodão.
Corremos prá lá, mas quando
chegamos na beira da agua,
Ziquizira veio e disse que Tata
Mandou todos nós voltar pro mato
E ficar bem quietinho.
Eu nem perguntei o motivo,
Ziquizira era uma boba, nunca
Que ela sabia das coisas.
A meninada correu de volta
Pro mato, mas eu não.
Eu fui curiar.
É, eu sou fofoqueiro sim,
E sou futriqueiro assumido. 
Trepei na parede de pedra da gruta
e fui miudinho pra ver
O que Tata tava fazendo.
Então me joguei de trás de 
Um pedrão e espiei,
Lá na parte grande da gruta
Tava a Tata Sentada naquela
Cadeira de Rainha dela,
Sim pois não era porque era gruta
Que era lugar pobre,
Não, tava fez da joça um 
Verdadeiro palácio.
Tinha tapete no chão e tudo mais.
Espiei queitinho e vi que na frente
De Tata tinha uma moça baixinha
De vestido de laço e fita,
Ela era bonita mas... tinha uma
Cara de quem comeu e não gostou...
Tata riu de alguma coisa que
A moça falou e depois disse:

🌼 — Vai me refazer repetir quantas vezes? Eu não vou lhe dar nada. Menina, sei que Quitéria pôs medo em você e nas outras, mas é mentira dela, não tem nada naquelas caixas que prejudique vocês.

A tal Menina suspirou aborrecida.

🌸 — Na verdade Tata, não foi Quitéria que me pôs medo. Eu tenho o dom da visão, e eu vi ela Tata, eu vi a...
🌼 — NÃO! Você não viu nada, não sabe de nada. 
🌸 — Tata, Sete Catacumbas ja tem a chave.
🌼 — Pouco me importa o que aquela destrambelhada tem, ela pode abrir todas as seis caixas que Quitéria estupidamente escondeu naquela árvore seca, não significa nada, as caixas mais importantes estão comigo. Se você tem o dom da visão como diz que tem, me responda se há alguma de vocês que seja forte como eu? 
🌸 — De fato...
🦂 — Quitéria se gaba como se fosse a própria Morgana Lefay, mas quando eu ja era uma feiticeira completa ela ainda estava aprendendo a ler e escrever. Vocês são PATÉTICAS!

Eu não aguentei, 
Achei demasiado engraçado
Ela chamar a fulaninha 
Daquele nome, ai um risinho
Me escapou da garganta.
O chato foi que elas ouviram.

🌸 — Quem é essa criança? 

Tata arregalou os olhos quando
Me viu.

🌼 — Vá pra fora Bicho-de-Pé, vá agora.

Eu dei meia volta ja saindo,
Mas senti um calafrio na espinha
E quando olhei para elas
A tal Menina tava me encarando,
E os olhos dela tavam dourados
Como bolas de ouro.
Me encarou uns segundos,
Depois se virou para Tata.

🌸 — Entendo.

Tata ficou muito nervosa,
Pulou do trono e avançou na Menina.

🌼 — Como ousa a usar isso nele? Como ousa fazer isso na minha casa?!
🌸 — Desculpe, eu não controlo meus dons, mas não vi nada demais, eu apenas vi que esse garoto...
🌼 — Saia! Vá embora! Eu não quero você ou sua laia perto deste lugar! Vá agora!

Então a Menina rodopiou 
Fazendo a saia girar no ar,
E assim ela desapareceu dali.
Tata caiu pra cima de mim,
Ficou tão brava que berrou
E até esquentou meu traseiro
Com uma sova de tapa.
Eu não entendi o motivo
de ela ter ficado tao brava,
Ficava dizendo que tinha
mandado eu me esconder,
Que a minha desobediência 
Ia arruinar tudo,
Mas não disse que tudo era esse.
Tata ficou nervosas por dias,
Apreensiva,
Juntou todas as crianças na gruta
E não deixou a gente sair por mais
De um mês.
Foi uma chatice sabe,
A gruta era grande mas a gente
Gostava mais era do mato.
Esse aparreio acabou
porque a meninada começou
a chorar muito pedindo pra sair,
E eu que não sou de choro
Acabei forçando um pra ver
Se ela deixava.
No fim deixou.
Tudo voltou ao normal,
Tata na gruta fazendo aquelas
coisas de diabo que ela gostava
com vela preta, cabeça de bode
E uns trecos feios lá,
E a gente no mato brincando.
O tempo passou, uma noite
O sol se pôs e nós começamos
A sair da gruta, mas quando
chegamos na frente da cachoeira
Tomamos um susto,
Tinha lá quatro mulheres
Ali paradas, uma delas
Era aquela Menina.
Nós ficamos com medo,
Muito medo de verdade.
Sabe, a gente não lembra
Como morreu, mas sabe que
O nome "Bruxa" teve haver
Com a nossa morte.
Ali eram quatro bruxas,
Eu podia sentir dentro de mim
Que eram.
Azulão correu pra chamar Tata,
Mas antes que ela pudesse vir
Uma das mulheres me agarrou pelo 
Pescoço e me levou para junto
das outras.
Eu gritava muito, tinha
Muito medo de sentir dor.
Dentro de mim eu sabia que
Um dia tinha sentido muita dor
Por causa de uma bruxa,
E mesmo sem lembrar o que
Tinha acontecido eu sentia
Tanto medo que só gritava.
A mulher tampou minha boca
com a mão pra acabar
com o escândalo.

Tata veio até a entrada, 
Olhou para mim com uma 
Cara de assustada, 
Depois falou com uma delas.

🌼 — O que quer aqui Quitéria?

Uma das mulheres, aquela
Com uma cara de maléfica
Deu um passo a frente.

👿 — Matar a saudade, você é ou não é minha tia avó? Espero que nos sirva chá com bolachas, como manda a boa educação, afinal não é todo dia que a família se une.
🌼 — Me poupe desse cinismo, mande sua capanga soltar a criança, não seja covarde.
👿 — Padilha não vai machucar ele, não se você for boazinha e fizer o que eu mandar. 

Saúva choramingou lá
dentro da gruta:
🐜 — Tata eu to com medo.

Tata acenou pra ela ir se esconder.

👿 — Tata... Tata... Sabe, eu acho de pessimo gosto esse seu novo nome "Tata Mulambo", preferia muito mais o antigo, era chique. Como era mesmo? Há sim... Maria Lezinska.

A mulher de pele escura,
A que tava mais distante de nós
falou:

👄 — Não zombe do nome dela, é igual o meu.
👿 — Mulambo combina com voce, não com ela. Ela tinha um nome nobre, austríaco... E eu soube que você conseguiu esse nome "Tata Mulambo" com um Deus, é verdade?
🌼 — Não interessa. As caixas não estão comigo.
👿 — MENTIROSA! Eu sinto elas, estão dentro da caverna. Vá buscar, ou então eu vou usar as caixas que estao comigo, vou usar no garoto. 
🌼 — Desgraçada, como tem coragem de fazer isso?
👿 — Eu sei o mato que lenho, você é uma das poucas que poderia me vencer, mas se quiser lutar... eu posso ate cair, mas o garoto cai junto.
🌼 — Não posso... eu não posso... 
👿 — Ah que feio Tata, vai sacrificar o bem estar dessa criança apenas por orgulho? Não é vergonha ser derrotada.

🌸 — Não, ela não esta agindo por orgulho.

Todas as mulheres
inclusive Tata, olharam
Para Menina.

🌸 — Quitéria, você quer que ela escolha entre as caixas e o menino, ela não pode fazer isso, eles são uma coisa só. O menino existe através da magia da caixa, eu vi quando olhei pra ele naquele dia.

Então Quitéria me olhou,
Me olhava apertando os olhos.
De repente os arregalou e 
Deu uma gargalhada.

👿 — Não acredito! Não acredito que esse menino é  Delfim! Que coisa intrigante... eu aposto que você apagou as lembranças dele não é?

Achei estranho,
Meu nome era Bicho-de-Pé,
Não Delfim.

🌼 — Cale a boca...
👿 — Pelo contrário! As minhas amigas aqui não conhecem a sua história, acho que devo contar... 
🌼 — Solte ele agora!
👿 — moças, essa mulher que agora se chama Tata Mulambo foi minha tia avó, em Toulouse na França. Vocês sabem que eu vim de lá. Pois então, a nossa família é um remanescente clã de bruxas, o que com certeza não surpreende vocês. Existem três ramificações na família, a Moura, a Gótica e a Austríaca. Eu era da ramificação gótica, Sete Catacumbas é Moura e Tata é a austríaca. 
🌸 — As três são parentes de verdade? De sangue?
👿 — Sim. Nossa Família trabalhava no digno ramo dos cabarés... mas uma de nós não aceitou bem envelhecer sabe... Maria Lezinska ja tinha quarenta e cinco anos quando engravidou. Eu era uma adolescente na epoca mas lembro bem, ela com aquele barrigão... o pai ninguém sabia quem era, acho que nem ela sabia. Ela pariu uma menino, era lindo demais. Mas Lezinska não ficou bem, a gravidez tão tardia acabou com o corpo dela, flácida, cheia de estrias, apos amamentar ela tinha peito tao caidos que nem com o melhor espartilho ficava bem... pelos sete anos seguintes após o parto ela decaiu tanto que nenhum cliente a queria mais. Era feia. Então Lezinska fez o impensável...

Tata deu um passo a frente,
Os punhos cerrados.

🌼 — Eu ja disse pra calar a boca.
👿 — Deixe eu concluir a história, todos querem saber. Bom, Lezinska rompeu um pacto da família, e foi até as caixas. Na época as caixas estavam sob a posse de minha mãe, mas ela as roubou, e usando a chave ela abriu duas caixas, uniu os conteudos e fez um pedido.
🌸 — Pedido? Ela pediu pra quem?
👿 — Ótima pergunta, ela pediu para o demónio que esta preso nas caixas, pediu para ele "quero ser bela novamente", e ele disse que so faria se ela abrisse todas as caixas, mas ela se recusou, abriu apenas duas e forçou o demónio a servi-la. Um grande erro. O demónio se fez de solicito, disse
que daria sim a beleza, mas em troca ela deveria dar a coisa mais preciosa que tivesse. Lezinska era uma tola, aceitou, levou para o demónio uma tiara de esmeraldas que era a coisa mais cara que tinha, mas... não era disso que ele estava falando. O demónio riu quando Lezinska lhe mostrou a tiara, ela não entendeu a princípio mas... o processo rejuvenescimento se iniciou, a pele dela se tornou lisa, o corpo torneado. Ela agradeceu o demónio e ofereceu novamente aquela tiara, mas o demonio riu dela. Então ela entendeu, a coisa preciosa não era a tiara. Lezinska correu para casa, la encontrou Delfim, o menino. Ele gritava, berrava caido no chão do quarto, a carne dele estava se esfarelando. A cada instante que ele definhava Lezinska ficava mais bela, a juventude que a preenchia estava sendo sugada dele, do filho dela. Ela estava linda, a unica parte de seu corpo que não rejuvenesceu foram os cabelos, possivelmente a vitalidade da criança não foi o suficiente para torna-los louros como antes, então ficou assim grisalha. Ela ficou lá, linda como uma ninfa, segurando o menino no colo, segurando ele até que aquele corpinho fragil virou pó. Então o menino se tornou um espírito, alguém como nós, preso neste mundo. É esse menino ai que Padilha esta segurando, ele é Delfim.

A tal Padilha acabou por me soltar.

😇 — Sô não, meu nome é Bicho-de-Pé! Fala pra ela Tata, fala pra ela que você me achou na bahia! Eu nunca nem fui em França, eu sou só daqui, fala pra ela...

Então olhei pra Tata,
E ela... ela tava olhando
pra mim, ela tava chorando.

😇 — Tata... fala...

👿 — Quando o menino morreu e Lezinska entendeu que ela era a culpada... ela se atirou de cima de um penhasco. Tanto esforço pra ser jovem de novo e quando conseguiu... se matou. Ficou lá em Toulouse como um fantasma, cuidando do espírito de Delfim. Só que... eu e Sete Catacumbas  tivemos um mal entendido com o resto da família e... nós decidimos trazer as caixas para cá, para o Brasil. Mas... o espírito de Delfim é ligado a elas não é? Ele nos seguiu. E foi por isso que assim que chegamos aqui você Tata Mulambo, roubou duas das oito caixas e escondeu nesse buraco. Enquanto as caixas estiverem aqui... Delfim vai estar também.

🌼 — E-eu não posso dar a caixas, eu não posso. Achei que podia quebrar a ligação dele com as caixas então.... Eu fui até uma pessoa que me deu esse nome novo, esse nome que uso agora é poderoso...
🌸 — Mas não o suficiente para separar o menino das caixas.
🌼 — Não o suficiente. 
👿 — Você tem cuidado desse monte de espíritos de crianças por pura culpa eu suponho. O que são? Crianças mortas em rituais? É isso? Vitimas das bruxas? Só isso explicaria crianças serem fantasmas. Mas essa sua boa ação não vai reparar o mal que fez a Delfim, e inclusive o mal que continua fazendo. O pobrezinho acha que se chama Bicho-de-Pé...

Eu ja não sabia o que pensar,
Mas antes que pudesse fazer
Qualquer coisa eu tive um
Choque, foi algo tão forte que
Cai de joelhos, e então me lembrei
da dor, era uma dor tão forte
Que cai no chão e me encolhi.

Eu lembrei quem eu era,
E eu era Delfim.
Lembrei da dor de morrer,
Do corpo queimando.
Eu so conseguia gritar.

👿 — Farrapo conseguiu! Vamos embora!

Não sei o que aconteceu,
Houve uma gritaria da parte
Das moças, ouvi barulhos altos,
Pedra quebrando, som da água,
Pareciam que estavam lutando.
Senti as mãos de alguém me 
Puxando para trás, e depois
as mãos de outra pessoa 
Me agarrando pelas pernas,
Tata gritava palavras em uma
Língua que não sei qual é,
Minha visão tava turva
Mas eu vi raios passando por 
Cima de mim, algum
Animal rugiu,  uma arvore
Tombou bem do meu lado.
E então veio o silencio.
Senti que alguém me 
Pegava no colo, eu ainda
Sentia muita dor.
Era Tata que me segurava,
Ela tava ali abaixada na beira
Da água, me segurava do mesmo
Modo que fez no dia que morri.

😇 — Mamãe... dói muito...
🌼 — Eu sei, eu sei...
😇 — Porque dói tanto? Eu não entendo...
🌼 —  Elas me enganaram. Enquanto Quiteria falava... outra mulher entrou dentro da gruta, eu não vi.  aquela tal Farrapo, foi ela que pegou a caixa. Eu só percebi que a caixa havia sido roubada quando você começou a gritar. Eu lutei, mas elas fugiram.
😇 — Ela levou as duas caixas? 
🌼 — Eu só tinha uma, e ela levou. Sem a caixa... 
😇 — mamãe, dói muito...

Tata me encostou no peito,
Fazia carinho em meu cabelo,
A voz tela era tremula?

🌼 — A caixa que te mantinha bem, Sem a caixa eu não sei o que fazer meu anjinho, eu não sei.

Minha vista escureceu,
Eu senti que meu corpo mudava.
Eu sabia o que era, me lembrei
que isso ja tinha acontecido antes,
Longe a caixa eu ia virar uma coisa,
Um bicho, um diabo.
Tata cantarolava uma cantiga
de ninar baixinho, cantava
E chorava.
Meu corpo se tremia 
Em espasmos.

Então eu senti várias mãos 
Tocando em mim, mãos pequeninas.
Abri os olhos e com dificuldade
Enxerguei a meninada, eles
Vieram pra junto de nós
e tocavam meu corpo.
E ai a dor passou.
As crianças brilhavam,
O corpo delas brilhava
com a luz branca igual
A da lua.

🌼 — O que vocês estão fazendo?

Zangão cochichou pra ela:

🐝 — A gente acha que pode ajudar. Cê sempre cuida de nós Tata, a gente também quer lhe ajudar.

As mãozinhas me apertavam
No braços, nas pernas,
Nas costas, no peito,
E eu sentia que ia
Ficando menino de novo.
No fim fiquei bem.
Senti que era gente 
Outra vez.
A meninada me fez ser livre
Da caixa, com a luz que eles
Tinham por dentro.
Eu era livre finalmente.

Tata tinha uma expressão
de muita surpresa no rosto
Quando eu fiquei em pé
Na frente dela.
Então todos nós abraçamos ela,
E abraçou a gente de volta.
Eu fiquei bem,
E continuei minha vida
De espírito junto com todo
O resto da meninada.
Mas Tata... bom, belaficou 
Muito feliz por eu ser Delfim 
De novo, ficou muito grata 
A toda a meninada por ter feito
aquilo por mim.
Mas ela queria vingança.
Me disse várias vezes que
Se a meninada não tivesse lá,
Se não tivessem usado a luz
Das almas pra me ajudar,
Eu tinha virado um bicho,
Uma diabo do mato, uma
Coisa que ela chamava de
"Espírito obsessor".
Então ela foi atras da outra,
A tal Sete Catacumbas.
Eu disse pra Tata não fazer isso,
A gente tava bem ali
Vivendo na paz,
Mas ela era bruxa
E bruxa de verdade 
Não consegue sossegar,
O coração não se apazigua,
Ela amaldiçoava Quitéria
dia e noite, e so teve paz
Quando finalmente,
Do modo mais cruel
Ela se vingou.




_


CONTO 9: O MARINHEIRO 

🌷🌹🥀🌷🌹🥀🌷🌹🥀🌷🌹🥀🌷
Eu era militar,  servia na
Fortaleza de Santa Cruz da Barra.
Era madrugada, e eu estava
Regendo os cabos, e estava
Muito irritado pois fazer vigilha
Com os baixa patente era coisa
Para um tenente, não para mim.
Mas que tenente? Portugal
Estava era uma zona e nós
Aqui da colónia é que padeciamos
Sem contingente.
Fiquei então na vigilha.
Nunca ninguém
Sabia se um maldito navio
Francês, Holandês ou Espanhol
viria descer o balaço na tentativa
De invadir a cidade do 
Rio de Janeiro, ja haviam
Tentado varias vezes 
então ficávamos ali
Sempre de guarda, sempre
Com os canhões prontos.
As três e quinze da madruga
Era meu horário
De descanso, teria um hora e meia 
Para comer e dar um breve cochilo.
Fui caminhando para fora da
Fortaleza, mas de repente me vi
Diante da capela da fortaleza,
Quando olhei para dentro vi que
a porta estava aberta e todas
As velas do altar de Santa Bárbara
Haviam sido acesas.
Senti o cheiro de rosas.
Sabe, no fundo da minha alma
Eu sabia que aquele dia iria chegar,
O dia de pagar minha divida.
Entrei na capela e fechei 
A porta, tirei o pente do bolso
e dei uma arrumada no bigode,
Queria fazer presença.
Lá na primeira fileira
Estava sentada uma mulher
De vestido vermelho.
Sentei-me ao lado dela.

💂 — Eu achei que não viria nunca mais.

Ela sorriu para mim,
Tinha um sorriso lindo
Com dentes bem certinhos.

🌹 — Infelizmente meu caro, eu sempre cobro os que me devem. Está com medo?
💂 — Não... não, eu ja tenho mais de sessenta anos, e sinceramente ja estou farto disso.

Joguei meu quepe em cima do banco.

🌹 — Falas-te como um porco indo para o abate. Eu só vim pedir um favor, nada demais. Que foi Sezefredo? Está tristinho? 
💂 — Um dedinho.
🌹 —Ah... Não fique de contumácia.
💂 — Triste, Triste não, mas enfezado com certeza. Trabalho demais, sabe?
🌹 — Quando eu lhe conheci, tu usavas um simples caxangá, agora um quepe de comandante, sinal que progrediu.
💂 — Não sou comandante, sou Capitão-de-Mar-e-Guerra.
🌹 — Pomposo.
💂 — Pois é. Fiz tudo pelos meus pequenos, eles vão ter uma vida boa, vão receber pensão e tudo mais até se casarem. Então valheu a pena.
🌹 — Tsk tsk tsk... esta falando como um derrotado. 
💂 — Estou é? Impressão sua. Mas não se deixe levar por isso, eu lhe fiz uma promessa e hei de cumprir.
🌹 — Eu sei. Mas não vamos perder tempo, eu preciso da sua ajuda para resolver algo ainda esta noite.

Ela ficou em pé e me estendeu
o braço.

🌹 — Vamos?

Me levantei e segurei em seu braço,
Senti um tranco forte e então
quando dei por mim estava
em uma clareira em uma mata,
A lua brilhando forte sobre nós
E os pinheiros altos fechando
o círculo a nossa volta.
No meio da clareira havia uma mesa
De pedra, um tipo de granito cortado
Precisamente. 
Sobre ela duas caixas
de madeira, 
Ambas do tamanho
de estojos de violino.

🌹 — Preciso que me diga o que há dentro dessas caixas. 

So de olha-las senti
um mal estar horrendo.

💂 — Vai doer? Se eu tocar nelas?
🌹 — Teve a impressão que iria doer.
💂 — A sensação que estou agora é como se estivesse desarmado no meio de um descampado e com uma onça bem na minha frente.
🌹 — Ah que firula, isso ai é medo. Mas respondendo a sua pergunta, creio que não vai doer, porém não posso garantir nada. Sê valente meu caro.

Eu era o que se chama
De médium de transporte,
Podia absorver energias,
Identificar, compreender.
Mas eu não nasci assim
Com este dom, na verdade
Fui amaldiçoado com ele.
Não hei de contar a minha história,
Ela não importa em nada,
So o que posso dizer é que
Uma vez, por influência de
Espíritos malignos eu quase
Tirei a vida de minhas duas filhas,
Pois a minha mediunidade é
Tão forte que eu não consegui
Controlar e acabei sendo
fantoche na mão de uns diabos.
Foi Rosa Vermelha quem salvou
As minhas meninas, foi ela
Quem me livrou daquele tormento,
E em nome desta gratidão eu
Prometi sempre ajuda-la no que
Fosse preciso.
Me aproximei da mesa 
De pedra e com alguma 
Dificuldade li a inscrição
dourada que se repetia
nas duas caixas. 

💂 — "Ad Regina Cantábria Quae Dormit Perpetuum".

🌹 — O quê?
💂 — A inscrição na tampa das caixas diz isso.
🌹 — Que inscrição? 

Ela se aproximou e examinou
As caixas.

🌹 — Não vejo nada.
💂 — Mas está escrito ai, eu estou vendo. Significa "Que a Rainha de Cantábria durma para sempre".
🌹 — Seus olhos são muito bons, eu não pude ver. Deve ser isso que mantém as caixas seladas. Rainha de Cantábria... Cantábria deve ser uma palavra de comando na magia negra...
💂 — Não, Cantábria era um reino, eu estudei sobre isso em cartografia.
🌹 —Um local real? Diga mais.
💂 — Atualmente a Rainha Maria Cristina reina na Espanha como um território absoluto, mas antes disso a Espanha era dividida em pequenos reinos como Castela, Leão, Aragão, Navarra e... Cantábria. Essa caixa deve ter pertencido a uma Rainha de Cantábria, e deve ser bem antiga pois o reino se desfez faz mil e novecentos anos. 

Rosa ficou pensativa, 
Passou as mãos pelos cabelos
Penteando sem necessidade.

🌹 — Existem oito caixas como esta, aliás sete pois a que foi aberta tinha uma chave como conteudo. Tem havido um certo frenesi de minhas companheiras para proteger essas caixas, tudo porque uma mais velha entre nós diz que o conteúdo é terrivelmente maléfico, porém ela se recusa a dizer o conteúdo das caixas. Nunca na minha vida eu agi por impulso, antes de fazer qualquer coisa eu preciso saber o que tem dentro delas. 
💂 — Compreendo. Então vou começar.

Coloquei as palmas das mãos
abertas sobre as caixas
e fechei meus olhos, 
Enviava meu espírito para
Dentro delas afim de sondar
O conteúdo.

💂 — Eu... vejo dedos finos tocando uma harpa com delicadeza, as pontas dos dedos pintadas de henna...  pulseiras de ouro tilintando em um pulso magro... tecido de uma vestido, da manga de um vestido roçando no braço... uma mão erguendo um pente de marfim...
🌹 — Ai dentro tem uma harpa, pulseiras, um pente e um vestido?

Abri os olhos assustado.

💂 — Não Rosa... Essas coisas são manejadas pelas mãos, pelos braços... dentro de cada caixa estão os braços de uma mulher... nesta aqui o direito e na outra o esquerdo. São os braços da Rainha de Cantábria...
🌹 — Braços? Você tem certeza?
💂 — Sim, os ossos estão ai dentro, úmero, clavícula, escápula, rádio, ulna, todos os pedaços do carpo, metacarpo e as falanges dos dedos, são braços, mãos e ombros, inteiros.
🌹 — Oh...
💂 — Surpresa?
🌹 — Sim, eu não esperava por isso, não mesmo. Está vendo mais algo? Algo importante?
💂 — Sim, eu estou quase vendo, quase entendendo o nome dela... ela se chamava... hum... Rainha Cassandra Calpúrnia mas... mas era mais conhecida como Regina Mestiza.

Senti um tranco forte nos
Meus braços, as palmas 
Nas minhas mãos foram
Pressionadas contra a tampa
das caixas.

💂 — Rosa! Rosa alguma coisa esta segurando as minhas mãos, eu estou preso, me ajude.

Rosa tentou me afastar das caixas
Mas não conseguiu, eu estava
literalmente colado nelas.
Então senti a queimação,
Era como se a madeira das 
Caixas houvesse se convertido
em ferro quente,
Rosa olhou para as caixas
Muito assustada.

🌹 — Está reluzindo vermelho, elas... elas estão aquecendo?

senti a pele das minhas
mãos fritando como se 
Estivessem sobre o fundo
De uma frigideira.

💂 — Está queimando! Meu Deus! Rosa! Rosa me ajude! Me ajude!

Ela não pôde fazer nada,
Eu senti algo quente como
Chumbo derretido subindo
pelos meus braços, pelas 
Minha veias, então meu corpo 
Estremeceu e algo passou
A controla-lo.
Senti minhas costas inclinando
para trás e a minha boca 
Abrindo, escancarando a ponto
De doer nos cantos, e então 
Um som de gargalhada irrompeu 
De minha boca, uma voz
Que não era minha pois
Aquilo era a estridente gargalhada
De uma mulher.

🌹 — Quem é você? Eu ordeno que responda!

Aquela coisa monstruosa 
Falou através de minha boca.

👑 — Nemo dat imperium!
🌹 — Fale a minha língua coisa desgraçada, ande!
👑 — Ninguém me da ordens, ninguém!

Senti as mãos de Rosa agarrando
meu rosto com força.

🌹 — Eu dou! Eu estou livre, você é que está trancafiada, então obedeça!
👑 — Livre? Livreeee? Sua estúpida! Tu és tudo, menos livre!

Ela gargalhou de novo,
Senti meus pulmões doerem
pelos trancos do ar saindo
Com violência.

🌹 — O que tem nas caixas? Nas outras cinco caixas?
👑 — Não é óbvio? Uma perna, outra perna, ossos do tronco, meu crânio e na última... minha coroa! 
🌹 — Quem te prendeu nas caixas? 
👑 — Meus filhos, Maria... Rosa... e Septimus... os amaldiçoados! Nomes dos meus traidores, nomes de todos os malditos!

Rosa arregalou os olhos.

👑 — Ah sim, está entendendo não é? A maldição... vocês todas repetem os nomes deles, nem percebem mas acabam se chamando sempre Maria, Rosa e Sete! Suas tolas! A maldição continua geração após geração!
🌹 — Seja clara, não compreendo.
👑 — Mas logo vai compreender.
🌹 — Porque te prenderam? 
👑 — Porque? Medo! Eles me temiam.
🌹 — Porque?
👑 — Porque eu tenho poder de controlar todos os amaldiçoados, todos os que foram tocados pela minha magia. Porque você acha que está presa neste mundo? Antes de ser assassinada, a minha ultima ordem a meus servos foi de permanecer na terra, então vocês permaneceram.
🌹 — Eu não sou sua serva! Eu nem a conheço!

Senti meus olhos se arregalarem.

👑 — É sim minha serva, minha escrava. Quer que eu prove?
🌹 — Pois tente.

Um risinho cínico saiu
De minha garganta.

👑 — Eu ordeno que mate este homem.

Rosa mudou a expressão
Do rosto, a seriedade deu
Lugar a medo, vi o
Queixo dela tremer de pavor.

🌹 — Não! Não! Pare com isso! Pare já com isso!

Senti as mãos de Rosa
Descendo até meu pescoço
E então ela começou a apertar.
Com o pouco de ar que ainda 
Dispunha, a rainha falou
Através de minha boca:

👑 — A minha unica descendente fiel vai abrir todas as caixas, vai montar meu corpo e libertar a minha alma, e então eu serei Rainha novamente, Rainha não de Cantábria, que sei que já não existe,  mas sim do mundo dos mortos, eu vou reinar nas sete portas dos sete mundos, eu vou ser a Rainha das Sete Encruzilhadas e você e suas iguais estarão... sob os meus pés.

Então senti meus lábios esticando 
Em um sorriso gélido,
E o ar me faltou.
Rosa estava me inforcando.

🌹 — Sezefredo eu... eu não consigo parar! Eu não consigo soltar!

Minhas mãos finalmente
Soltaram as caixas,
Eu podia me controlar novamente,
Mas estava tão fraco que
cai no chão, Rosa 
Acompanhou minha queda
Sem tirar as mãos de meu pescoço.
O aperto era tão forte que
eu sentia as veias da testa 
Pulsando desesperadas,
Meu rosto devia estar vermelho,
Eu não sei, mas via
Na expressão de rosa o
Mais profundo horror
eu tentei empurrar ela,
Tirar as mãos dela de
Minha garganta mas
Ela era uma alma maldita
E eu somente um 
Humano idoso, 
O aperto daqueles dedos 
Delicados eram tal qual
um laço de cabo aço,
Eu não tinha chances
contra isso.

🌹 — Eu não quero fazer isso! Por todos os deuses eu sei que não quero! Sezefredo! Me perdoe! Me perdoe!

E ela que sempre foi
Forte e até mesmo seca,
Começou a chorar ali em
Cima de mim. Senti as lágrimas
dela caindo e batendo em
Minhas bochechas.
Não eram lagrimas de agua
e sim algo do outro mundo,
Não sei dizer.
Não durou muito tempo,
Nem mesmo um minuto
Inteiro.
Logo eu estava em pé 
Observando aquela bela
mulher enforcando um
Corpo idoso e ressequido. 
Olhei para minhas mãos,
Meio translúcidas, e entendi
Que agora o fanstama era eu.
Me agachei ao lado dela e 
Toquei seu ombro.

⛵ — Pode soltar Rosa, já foi, eu ja estou morto.

Ela soltou as mãos
do pescoço do cadáver
com movimentos bruscos,
Então as levou ao rosto
E cobriu a boca.
Todo o corpo dela tremia
Em espamos.

🌹 — Sezefredo eu... me perdoe, eu... eu não queria...
⛵ — Eu sei que não queria. A culpa é da Rainha, não sua.
🌹 — Eu... Eu não imaginava...
⛵ — Não fique assim Rosa, eu ja era velho, ia morrer de todo modo.

Ela ficou em pé lentamente
E então me olhou ainda
Mais assustada.

🌹 — Ela disse que todas as almas amaldiçoadas pela Magia dela acabam tendo os mesmos nomes que os filhos, Maria, Rosa e Sete. Eu me chamo Rosa Vermelha, no meio de minhas companheiras ha outra que também se chama Rosa, e há muitas Marias e muitas Sete. 
⛵ — Sim... então a Rainha disse a verdade.
🌹 — Sezefredo, você morreu através da Magia dela. Me diga meu amigo, qual é seu nome.

Sorri achando a pergunta tola,
Afinal eu era
Agnaldo Sezefredo de Mendonça
Ela sabia muito bem disso,
Mas então no intimo do meu
Ser eu percebi que agora
enquanto morto eu não tinha
Mais este nome, havia outro
Nome se formando dentro de mim.

⛵ — Eu agora sou... Marinheiro.
🌹 — Marinheiro?
⛵ — Eu sou... Marinheiro das... Sete Praias.
🌹 — Um Sete...
⛵ — Sou amaldiçoado também não é? Sou como você?
🌹 — É meu amigo, agora é como eu.

Ficamos em silêncio por 
Um longo tempo.
Depois Rosa me ajudou a 
Levar meu cadaver para 
A Fortaleza de Santa Cruz,
Os cabos o encontram boiando
na maré pela manhã,
Acharam que eu tido um
Passamento e caído 
Na agua, me afogado.

Eu quis ficar junto com Rosa,
Mas ela não deixou, 
Disse que a partir dali
ela iria se expor a grande perigo
E que não queria me expor 
Também.
Então me levou para as margens
do Rio São Francisco,
Esperamos em uma prainha.
Lá ficamos juntos vendo o sol
Nascer, e como era lindo
O sol nascendo no céu alaranjado
E refletindo a cor nas aguas.
Foi a primeira e única vez que
Vi Rosa Vermelha a luz do dia,
O sol iluminando aqueles cabelos
Tao negros, os olhos verdes
Brilhando.
Ela apontou para o rio e
Ao longe vi vindo, navegando
na correnteza uma Galé 
De duas velas que se movia
Pelas aguas mesmo sem os remos.
O barco estava cheio de marinheiros
Debruçando no gradil,
Assobiaram para Rosa Vermelha,
Um deles chegou a uivar feito
Um lobo, ela piscou para eles
E balançou os ombros
fazendo o busto chacoalhar,
Então os marinheiros foram
A loucura, um até fez menção
de se jogar do barco gritando
Que ia se casar com ela,
Mas os outros o seguraram
Bem a tempo.
Eles vestiam uniformes de 
Diferentes modelos, 
De diferentes marinhas
Pois haviam desencarnado 
Em diferentes épocas e em
Diferentes lugares.
Lançaram a tábua na praia
E o capitão do barco
Desceu por ela,
Era um homem preto
Que se vestia de modo simples,
Barba ja grisalha,
Descalço, mas vinha com
um canecão de cerveja na
Mão e parecia bem humorado.
Rosa deu-lhe dois beijos,
Uma em cada face.

🌹 — Este é Martim pescador, um grande amigo. 

Eu bati continência ao homem,
Pois era o certo,
Ele riu e bateu uma continência
desajeitada.

🐦 — Meu caro, esta é a barca das almas, lar dos marinheiros, pescadores e caiçaras que manifestam o desejo de querer continuar no mar mesmo após a morte. Vi que é um Marinheiro também.
⛵— Sou na verdade Capitão-de-Mar-e-Guerra.
🐦 — Era, a patente vai ser enterrada junto com seu corpo de carne. Aqui nos somos todos apenas homens do mar. Se quiser, eu lhe garanto um bom lugar na tripulação, aventuras sem fim nas ondas salgadas e nos rios de agua funda.

Olhei para o barco
E de repente me senti
garoto de novo, 
Não só por dentro mas
Minha aparência mudou,
Eu voltei a ser aquele jovem
Que um dia se alistou 
Na marinha por ser apaixonado
Pela navegação, pelo cheiro
da maresia, pela aventura.

⛵ — Eu quero sim capitão.
🐦 — Pode me chamar só de Martim.

Rosa sorriu para mim,
Senti que estava ainda triste
Mas sorria para me animar.

🌹 — Cuide bem dele Martim, é um bom amigo.
🐦 — Nenhum marinheiro fica pra trás Rosa, não se preocupe.

Abracei Rosa 
E ousei dar-lhe um 
Beijo nos labios,
Ela sabia que era apenas
Uma despedida então não
fez caso disso.
Subi na barca, recolheram a tábua 
E o barco começou a se mover rumo
A Alagoas, onde ia desaguar
no mar.
Corri para a popa e fiquei lá
Acenando para Rosa,
E ela acenando para mim
Da praia até que aquela figura
Vermelha de mulher sumiu
No horizonte.




_
CONTO 10: A RAINHA DE CANTÁBRIA


👑🔥👹🔥👑👹👑🔥👹👑🔥
Em tudo que passei, 
Que vivi, nunca tive
Ódio no coração.
Tive muita raiva, fúria,
Mas ódio não.
Porém ao ser traída
Por aqueles que eu 
Verdadeiramente amava
Mudou tudo.
Me encheu de Ódio.

Era fim do quarto século após Cristo.
Não que algum de nós entedesse
O que era Cristo, afinal um
Homem morto per Roma
Não inspirava muita admiração.
Mas nós entendiamos sim
De guerra, e os Romanos
Estavam a nossa porta 
Afim roubar nossas terras
E escravizar nosso povo.
Minha mãe,
Rainha Voadika de Cantábria,
Já entendia que o tempo do
Povo das montanhas estava
chegando ao fim, mas ainda 
Assim resistia.
Ela era sábia, e prevendo 
Que o futuro seria Latino,
Decidiu batizar os dois filhos
com nomes comuns em Roma.
Eu me chamava 
Cassandra Calpúrnia,
Meu irmão era Otaviano.
Eu era a mais velha,
A herdeira do trono de Cantábria.
Quando minha mãe faleceu
Os sacerdotes logo trataram
De me preparar para a coroação.
Eu tinha apenas dezessete anos.

Pelo costume de nosso povo
Fui recolhida para ser purificada
Durante doze dias de rituais
No templo do Deus Dagda,
Deus maior de nossa gente,
O templo maior era 
No meio da floresta.
Me lembro como se fosse hoje,
Era madrugada do quarto dia,
Estava me banhando na tina
De pedra sagrada de Dagda,
Aguas perfumadas cheias
de óleos e essências.
Mas aquele momento sagrado
foi interrompido
Quando o templo foi invadido
por um agrupamento de 
Soldados Romanos.
Gritei por ajuda, ninguém
veio em meu socorro.
Me arrancaram nua da água 
E me levaram para fora.
Estava muito frio, eu cobria
Os meu seios com os braços 
E me encolhia enquanto tremia.
Tive vontade de chorar
mas aguentei.
A minha comitiva estava
Parada atras dos Romanos,
Todos com expressões 
Cheias de medo,
Eram reféns assim como eu.
Ali no meio dos soldados
Um general se aproximou,
Desenrolou um papiro e leu
Em voz alta, falando em Latim:

"É sabido e confirmado que Otaviano Calpúrnia, filho da Rainha Pagã Voadika de Cantábria, jurou lealdade ao Imperio Romano."

Todos os soldados em volta
Berraram em coro
"Ave Império".
O general prosseguiu:

"O Imperador, nosso amado e venerável Theodósio o Grande, recebe com alegria o Rei Otaviano de Calpúrnia como mais um entre seus veneráveis vassalos, após este ter aceitado de bom grado a conversão a fé verdadeira, a fé de cristo."

Meu coração ficou gelado.
Otaviano um Rei?
E ainda por cima um
Rei cristão?
Meu irmão havia me traído,
Era um golpe.

"Sendo assim, Cantábria passa a ser regida pelas leis Romanas. Isso significa que nenhuma mulher pode ocupar posição de soberania. É sabido que esta mulher diante de nós, Princesa Cassandra Calpúrnia, tinha por direito o trono de Cantábria segundo as leis antigas de seu povo, mas... com a nova legislatura imperial ela, ou seja você..."

O general sacou a espada
E colocou a ponta dela no
Meu quiexo, me obrigando
a erguer a cabeça.

"Está a partir deste momento deposta de quaisquer direitos ao trono. Entretanto... o Rei Otaviano imagina que você, princesa Cassandra, tem o apoio popular, coisa que pode incitar revoltas dentro do reino. Portanto, para o bem geral de Cantabria você Cassandra Calpurnia esta condenada a morte."

Os soldados riram,
E varios disseram que 
Antes de eu ser degolada
Deveria servir para diverti-los
Um pouco.
O general, no auge de sua
perversidade decidiu fazer
Uma competição,
Disse que por eu ser uma
Rainha deveria ser "usada"
Apenas pelo melhor dentre
Os soldados.
Eu seria solta na floresta,
Me dariam algum tempo
Para correr, depois os soldados 
Entrariam na floresta
E o primeiro que me encontra-se
Poderia fazer o que quisesse
comigo.
Eu seria caçada como
Um animal
Em um jogo imundo.
Esse era o jeito Romano
De se divertir, assim
Como faziam assistindo
massacres no coliseu,
A matança e a crueldade
Os contemplava
Mais do que qualquer
outra coisa.

Fui empurrada na direção 
Nas árvores, e imediatamente
comecei a correr, 
Meus pés doiam ao pisar
Descalça no solo
Cheio de pedras e galhos secos,
Fazia tanto frio que 
A minha pele doía
Contra o vento.
Corri por alguns minutos,
Estava tão escuro que não
era possível ter uma real
Ideia de para onde estava indo,
E então ouvi o barulho
dos passos pesados e metal
Das armaduras tilintando,
Os soldados corriam
Atras de mim.
Eles riam, debochavam,
Estavam se aproximando.
Então senti uma dor aguda
No ombro, haviam atirado
Uma flecha em mim.
Continuei correndo,
A flecha fincada ardia,
Corri mais, e minha vista 
Começou a ficar turva,
Os soldados estavam a menos
De duzentos metros 
E iam me alcançar logo.
Estava sem forças,
Era uma garota magra
E pequena, e não aguentava
mais correr.
Então vi na penumbra
Uma grande árvore com
Um vão oco no tronco,
E achei que podia me
Esconder ali.
Me enfiei no buraco,
E para a minha surpresa
Despenquei por um poço 
Muito profundo,
Pois o buraco não tinha chão,
Cai por varios metros
Me estabacando em uma
Poça, algo que eu acreditei
ser lama.
Me vi dentro de uma caverna
No subsolo da floresta.
Ah como eu agradeci a Dagda!
Os Romanos jamais
Iriam em encontrar ali,
Eu estava salva.
Mas em seguida eu
Percebi que sozinha
não conseguiria sair de lá,
Então estava condenada
A morrer ali a mingua.
Fiquei escutando
Os passos dos Romanos
Na superfície, estavam
vasculhando tudo.
Me ergui da lama e com
Certa dificuldade caminhei
para a parte mais profunda 
Da caverna, talvez pudesse
achar alguma saida.
Estava cansada, meu ombro 
Doía muito, mas continuei.
Então vi na escuridão
Dois pontos vermelhos,
Pareciam tochas muito ao longe,
Porém esses pontos Desapareciam
As vezes.
Segui rumo a eles, tinha ouvido
falar que os antigos Druidas faziam
templos subterrâneos para a 
Deusa Epona, se houvessem
Druidas ali eles poderiam curar
Meu ombro e me esconder.
Andei alguns metros rumo
As tochas, mas paralisei de 
Terro quando uma voz aspera,
Voz que soava como a de
Um velho moribundo
Soou baixinho na caverna:

👤 — le tuá debrá hatí...

Eu não entendia aquela língua,
Mas sabia que era do povo
Do deserto, minha mãe 
Matinha comércio com alguns
Mercadores Sassânidas.
Limpei a garganta e tentei
falar na lingua dele:

👑 — anáhe... salam ...
👤 — Fala Latim?

Fiquei aliviada.

👑 — Sim, eu sou cantábrica mas sei falar latim.
👤 — Que bom, seu árabe é uma merda. Falemos em latim então.
👑 — Desculpe senhor, eu não posso ve-lo, onde o senhor esta?
👤 — Como não me vê? Esta olhando em meus olhos desde que caiu nesse maldito buraco.

Fixei meu olhar
Nas tochas distantes 
E finalmente entendi que 
Não eram tochas, eram
Um par de olhos flamejantes
me encarando a poucos
Metros.

👑 — Quem é o senhor?
👤 — Eu sou Baal-Berith.
👑 — Qual é a sua tribo? Seu povo?
👤 — Djin.

Eu sabia o que era Djin,
Para os árabes eram seres
Poderosos do deserto,
Seres muitas vezes malignos.
Por mais que eu fosse
Uma mulher de fé, 
Eu não acreditava nas
Lendas dos estrangeiros,
E ao me deparar com
Uma eu tive muito medo.
Senti o ar falhar, minha
Voz tremeu:

👑 — O s-senhor é como os filhos de Carman?
👤 — Carman? Não menina, nada tenho com sua Deusa Bruxa, eu sou um filho de outro Deus. Eu sou o que os Romanos chamam de Demónio.

E ele se fez visível,
Todo o corpo acendeu
Envolto em uma luz avermelhada,
Vi ali meio deitado, escorado
em uma grande pedra.
Com mais de quatro metros
O ser tinha a pele vermelha,
Chifres enrolados como
os de uma cabra montanhesa,
Barba e cabelos grisalhos,
Olhos amarelos, dentes grandes
Envoltos por lábios negros,
De suas costas brotavam um
Par de asas de couro.
Ele estava ferido, uma enorme
Lança dourada de cabo quebrado
Varava o largo peito.
Soltei um grito agudo de terror.

👹 — Menina não tenha medo, eu sou como você, um fugitivo. 
👑 — O-Os Romanos lhe f-fizeram isto?
👹 — Não... humanos não podem me ferir... foram os Malach, eles me caçam.
👑 — O que é... Malach?
👹 — Aquilo que os Romanos chamam de "Anjo". Me escondi aqui sob a terra, mas os Malach continuam rondando a região atrás de me achar. Menina, me ajude... tire essa lança do meu peito.
👑 — Eu? Mas se o senhor é um Demónio, e os Romano falam de Demónios como se fossem Deuses, então porque não remove sozinho?
👹 — Não posso, essa lamina foi feita para ferir a minha espécie, mas não a sua. Você pode remover, mas eu sozinho não.
👑 — Se eu fizer isso, o que impede de me matar logo em seguida?

Baal-Berith ficou calado,
Então entendi que ele
Realmente pretendia me 
Matar assim que eu 
Terminasse de ser útil.

👹 — Posso lhe fazer uma promessa inquebrável.
👑 — E como eu poderia ter certeza?
👹 — Se tu comerdes da minha carne e aceitar que eu possua seu corpo por um breve período, eu não irei lhe fazer mal. 
👑 — E porque eu aceitaria algo tao absurdo?
👹 — Porque essa lança me paralisa, mas não me mata. Mas a fome e sede e o frio logo irão tirar a sua vida, em quatro ou cinco dias estará morta. Se aceitar este pacto comigo eu poderei sair daqui em segurança, os Malach não me verão se eu estiver oculto dentro de ti, principalmente se tu comer a minha carne e beber meu sangue. Isso sera um pacto, um casamento.

Olhei em volta, eu ainda 
Estava nua e ferida,
Meus pés dormentes pelo frio.
E iria morrer de qualquer
Jeito, então decidi arriscar.
Fui até o Demónio, e
segurando com ambas as mãos
A haste da lança, a puxei, 
Era pesada e eu tinha um
Ombro ferido quase não pude,
Mas acabei por conseguir
remover aquilo.
BaalBerith suspirou aliviado,
E imediatamente seu corpo
Reluziu e ele sentou e
Esticou as asas.
Observei a ferida em seu peito
Fechar e cicatrizar em segundos.
Ele ficou ali sentado me olhando,
Seus olhos pareciam cheios
De malicia. 
Cobri meus seios e virilha
Com os braços receando
Que aquele ser monstruoso
Quisesse cometer alguma
Violência para comigo.

👹 — Não seja estupida menina, eu sinto muito desejo por você, mas não é como os que os machos da sua espécie sentem. Não tenho a menor vontade de copular com alguém tão minúscula e... me desculpe falar, mas insossa. Eu te olho assim pois tenho fome.
👑 — Achei que iria fazer o pacto comigo.

Ele bufou aborrecido.

👹 — E vou. Não tenho escolha. Escute isto.

Estendeu a mao na minha 
Direção, seu dedo indicador,
Cuja a ponta era maior que
Meu rosto inteiro,
Encostou na lateral de minha
cabeça, e quando minha 
Orelha tocou a pele vermelha
Eu ouvi o farfalhar de muitas
Asas e vozes femininas que
falavam, conversavam entrei
Si em tom de cantoria lírica.

👑 — O que é isso?
👹 — Malach, estão bem acima de nós, sondando a floresta atras de mim.

Então Baal-Berith
Afastou a mão de minha orelha,
Observei ele mover as
Unhas negras a cumpridas
Sobre a propria coxa e ali
Arrancar um naco de
Carne de cor marrom escura
Do tamanho de uma maçã.

👹 — Quem é você? Por qual nome teus pais te chamam?
👑 — Sou Cassandra Calpúrnia, Rainha de Cantábria.
👹 — Cassandra, você aceita ter comigo uma aliança eterna?
👑 — Aceito.

Com a ponta da unha encostou
Aquilo na minha boca.

👹 — Tome e coma pois isto é o meu corpo.

Mordi, a carne era saborosa
E doce, fibrosa mas macia,
Era como mastigar tâmaras
Bem maduras.
Em seguida o demónio fez um 
Gesto riscando o ar com
As unhas dos dedos menores,
Ali apareceu
um cálice de ouro que ele
Apanhou e encheu 
Com o sangue espesso que 
Vazava da ferida na coxa.
Me ofereceu o cálice e disse:
 
👹 — Beba dele, pois isto é o sangue da aliança, que é derramado em favor de ti, para a ampliação  da tua resistência as potestades da noite.

Bebi, era quente e espesso,
O gosto era como o de 
Uma enfusão de muitas ervas,
Era tanto que vazou pelas 
Laterais da taça e escorreu
Pelo meu rosto e corpo.
E então senti a mão 
De Baal-Berith agarrar
Minha cintura e me erguer
no ar, gritei a plenos
Pulmões quando as unhas dos
dois dedos da outra mão 
Rasgaram a carne de meu peito,
E as usando como pinça
ele removeu meu coração.
Vi diante de meus olhos
o órgão ainda pulsando.
Vi o demónio engolir aquilo
Que era o cerne da minha vida.
Então ele arrancou mais um 
Naco de carne de coxa
e enfiou no buraco vazio
De meu peito.
Aquele carne se moldou
Na forma de um novo
coração humano.
A ferida se fechou
e ele me pôs no chão
Sem dizer absolutamente nada.
Tomada de um sono
Avassalador, me deitei
E dormi.

Quando abri meus olhos
Estava no alto de um monte,
Em meio a fumaça e a odor 
De enxofre.
Era o vulcão Etna.
Baal-Berith estava ao meu 
Lado. 
Me explicou que havia
possuido meu corpo pelos
Ultimos doze anos.
Eu realmente me senti 
Mais velha, meus cabelos
Estavam tao cumpridos
Que iam até os joelhos,
E estava vestida com 
Uma túnica negra.
Não tive reação ao saber
Que havia perdido doze
Anos de minha vida,
Me sentia fria, apática.
Baal-Berith me beijou
Nos lábios e disse que
Pelo fato de ter permanecido
Seguro, escondido 
Dentro de mim pela dezena
De anos, Nosso casamento 
Seria inquebrável e eterno
Pois ambos haviam cuprido
Suas obrigações.
Como pagamento eu 
Receberia todo o conhecimento
absorvido dele,
Pelo coração demoniaco
Que batia em meu peito.
Então ele se lançou para 
Dentro da boca do vulcão,
Me deixando livre
Para seguir com minha vida.
Senti desejo de voltar para casa,
E assim que pensei em Cantábria,
De repente me vi diante
dos portões do palácio Real.
Haviam quatro guardas 
Romanos ali, e eu os matei,
O sangue deles jorrou em
Jatos que tingiram as paredes
Caiadas do lugar.
Entrei, cada Romano que encontrei
Estraçalhei, e somente após
matar uns vinte ou trinta
é que me dei conta de que
os matava sem sentir nada.
Alias, sentia sim um pouco
de prazer ao ver a luz
Se apagando daqueles olhos.
Invadi a sala do trono
e lá estava meu irmão
Com a coroa sobre a cabeça.
Não tenho como explicar 
O calor que senti no peito
Quando o vi.
Ao lado dele estava
uma mulher e duas crianças,
Eram os Reis e Príncipes de
Cantábria?
Usurpadores!
Alguns momentos depois 
Eles eram apenas liquido
Vermelho escorrendo
Pelo piso do salão.
Eu estava coberta de sangue
mas me sentei no trono
E coroei a mim mesma,
Cassandra Calpúrnia, 
A verdadeira Rainha.

Meu povo me recebeu 
Com festejos e alegria,
Me saudavam como 
A esposa verdadeira 
Do Deus Dagda.
Armei minha gente
Com espadas, escudos
e lanças, e com o auxílio
dos dons que agora 
Eu tinha, amaldiçoei toda
A minha gente, 
Os tornando tão violentos
No campo de batalha
Que os romanos não 
Conseguiam resistir,
Eram estraçalhados sem
A menor chance de se defender.
Cantábria se tornou independente
E eu a Rainha mais temida
De toda a Europa.
Me chamavam de Regina Mestiza,
Que quer dizer "A Rainha mestiça"
Pois acreditavam que eu era
Uma semideusa.
Reinei por nove anos
até dar a luz a minha 
Primeira filha, a chamei 
De Maria, como a mãe do
Cristo Romano.
Maria era alta e magra, loura
como o soldado Romano que 
Eu havia usado em uma noite 
De festa e que provavelmente 
Era seu pai.
Antes de degolar o porco eu
Lhe prometi que se ficasse 
Grávida iria nomear o bebê
com o nome da sagrada mãe
da igreja de Roma.
Sim, uma zombaria a mais
Sempre dava tempero as coisas.
Depois de Maria pari outra
Menina que nomeei Roza.
Esta era de pele cor de canela,
A gerei com um mercador árabe.
Por fim um menino, Septimus.
Septimus era preto e alto,
Exatamente como o
Africano que havia sido
meu amante por alguns meses.
Os tres cresceram sob o peso
de minha espada, eram
Os generais de meu exército.
De todas as pessoas,
As únicas que eu amava
eram meus três filhos.
Eram valentes como eu,
Mas não fortes como eu.
Jamais dei a eles a minha 
Força verdadeira,
Não queria que fossem
Condenados como eu sabia
que eu seria.
Mas conforme as decadas
Foram passando, Maria
se tornou um tanto inquieta.
Eu sabia que estava esperando
A minha morte para enfim
Se tornar Rainha.
Mas eu estava a cinquenta anos
No trono e ainda parecia
jovem.
Alias a minha aparência era
Mais jovial que a de meus filhos.
Nao sei dizer quando entenderam
Que eu nunca iria morrer,
Mas vi a mudança no olhar
deles depois que os cabelos
brancos surgiram em suas
Cabeças
E eles viram que na minha não.
Então começaram a se rebelar.
Foi difícil, mas eu tive de 
Ensina-los do modo mais drástico
que princesas e príncipes
Não falam mais alto que Rainhas.
Eles tinham de ser punidos.
Então removi deles o livre arbítrio.
Sim eu podia fazer isso.
Não poderia com as pessoas 
Comuns mas com aqueles gerados
A partir do meu sangue eu 
Podia dominar perfeitamente.
Se ordenasse que Maria não
Dormissse por uma semana,
Os olhos dela permaneciam abertos
Pelos sete dias.
Se ordenasse a Roza que 
Matasse os proprios filhos,
Ela me traria as cabeças em
Bandejas de prata.
Se ordenasse a Septimus que
Queimasse as aldeias de seus
amigos, eu sentiria em poucos
Instantes o cheiro da fumaça.
E fiz bem, 
Logo os três passaram
a ser como cordeirinhos
Respeitando a cumprindo
as minhas vontades.
O meu desejo era a Lei.
Então no aniversário de 
Ciquenta e cinco anos
de Maria ela me pediu
Permissão para fazer uma
Grande  festa,
E eu claro que permiti.
Me lembro do salão
repleto de nobres.
Me lembro do vinho
estar estranho.
Me lembro de sentir
muito sono.
E então não me
Lembro de mais nada
Com clareza.

Na escuridão que
Se seguiu, ouvi a voz
de Baal-Berith soando
em meus ouvidos.
Ele me contou que meu
Maior erro foi ter revelado
Sobre meu casamento 
Demoníaco a eles.
Ao contar a minha história
eu dei aos três a ideia de
Como poderiam me eliminar.
Maria me envenenou,
Mesmo sabendo que eu
Não morreria.
Tudo que ela queria era
Me fazer dormir.
Meus filhos
Levaram meu corpo
inerte para o subterrâneo
Do palácio, me despiram
E... me devoraram.
Comeram cada pedaço de minha
carne e lamberam cada
Gota de meu sangue
Na esperança de adquirir
poder, queriam emular
O ato que eu tinha cometido
com Baal-Berith.
Mas não deu certo,
Nenhum deles ganhou
grandes poderes,
Pois um pacto para ser
Válido tem de ser feito
Por livre vontade,
E não por traição.
Ali no piso umido do
Quarto de pedra onde
Meus filhos estavam
a me devorar, eu voltei
A vida por um breve instante.
Meu esqueleto já branco,
Sem carne alguma,
Se tremeu, e os ossos do 
Meu maxilar bateram.
E eu disse:

"MALDITOS SEJAM OS TRAIDORES, MALDITOS SEJAM OS MATRICÍDAS! NENHUM DE VÓS, NENHUM DA VOSSA DESCENDENCIA, NENHUM QUE FOR MACULADO PELA SOMBRA DE QUEM EU FUI, NENHUM TERÁ DESCANSO. NÃO VERÃO NEM A LUZ DO PARAISO, NEM AS TREVAS DO INFERNO, FICARÃO ONDE ESTÃO, ATÉ QUE EU VOLTE, OS JULGUE E OS CONDENE!"

Então meus filhos
sentiram medo.
Medo que eu fosse me
Levantar a qualquer momento
e fustiga-los com fúria maior
que a de mil dragões,
Eles decidiram quebrar meu
corpo em sete partes.
Em sete caixas de marfim imperial,
que é o nome dado a maldita
madeira da figueira branca,
Que árvore que corta qualquer
tipo de magia ou encanto,
Eles trancaram meus ossos
E minha coroa com fechadura
e chave de prata,
Chave confiada sempre a herdeira
Do sangue de minha filha 
Mais velha.
Então eu não pude voltar
A vida.
Cada geração após meus
Filhos tem se dedicado
a esconder as caixas
E a mantelas seguras.
Mas para que eu os 
Indentifique, cada geração
tem involuntariamente
Assumido os nomes dos tres
Desgraçados.
Todas e todos que tem parte
Comigo se chamam e se chamarão
Maria, Rosa e Sete.
Minha alma tem hibernado
Pelos séculos dentre os
Séculos, esperando o dia
em que serei libertada.
E quando as caixas forem abertas
E meu corpo for remontado
Eu irei retornar, 
E serei grande
E serei pior que quaisquer 
Demónio do inferno.
Eu sou feita de ÓDIO.




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CONTO 11: JUREMA

✡⚰🔮✡⚰🔮✡⚰🔮✡⚰🔮
Ser bruxa cansa.
Chega em um ponto que não 
Se quer mais fazer magia,
Eu só queria que o mundo
acabasse em barranco pra
Eu morrer escorada.
Tinha setenta e seis anos
Quando aconteceu.
Naquela época
eu gostava de toda noite
Ficar na varanda com os pés
Dentro de uma tina de salmora.
Quem é velho sabe como isso
Alivia a dor nos pés,
E o que eu mais tinha eram dores.
Então naquela noite de sábado
Sentada na rede vi ao longe
aquela figura vestida de vermelho
Se aproximando da entrada da casa.
Os cabelos ao vento, descabelada,
E aqueles olhos cor de mel...
Maquiagem mal feita porem 
Ela era ainda assim linda, 
Mas a forma como a luz 
Da lua se refletia
Esbranquiçada demais na pele
Dela... aquilo era uma alma
E eu sabia.

👵 — Quem é você? E porque vem até a minha casa?

A mulher parou na entrada
Bem rente aos degraus 
Da varanda e me olhou 
Batendo aqueles cílios longos.

🌺 — Me chamo Maria, Maria Farrapo. Me disseram que a senhora é... a Judia.
👵 — "A Judia"? Eu sou judia sim, mas tenho nome, me chamo Nazaré.
🌺 — Ouvi um boato sobre seus dons.
👵 — Ah... e as almas agora fazem fofoca sobre velhotas? 
🌺 — Disseram que a senhora é descendente da bruxa de Endor.

Eu não gostei nada disso, 
Não gostava que minha vida
Estivesse na boca de quem
Não conheço.

👵 — Você está muito longe de casa, aqui é Recife e não o maldito sul. Volte para a capital e vá assombrar algum palacete ou alguma floresta.
🌺 — Eu nasci aqui também, também sou de Pernambuco.
👵 — Mas não é uma Mestra, nunca lhe vi na Jurema.
🌺 — Não sou uma mestra.
👵 — O que você é?
🌺 — Eu não sei.

E então ela me contou tudo
sobre a tal Rainha de Cantábria
E sobre ser uma descendente
Amaldiçoada.

👵 — É uma história e tanto, mas no ela me toca?
🌺 — Seus dons podem me ajudar.
👵 — Desculpe, mas meus dons hereditários não chegam a tanto.
🌺 — Você é descendente de Endor, então... pode invocar qualquer espírito, não pode?
👵 — Posso. Mas não entendo em que isso iria lhe ajudar.
🌺 —  não precisa entender, apenas fazer o que eu pedi.
👵— Mas porque eu faria isso? 
🌺 — Você é velha, doente e sozinha, eu posso te dar saúde e mais tempo de vida. Não quer viver mais?

👲 — Ta falando com quem vó?

Meu neto apareceu no batente
Da porta.

👵 — Com o diabo.

Ele bufou e se foi, 
Não gostava das minhas
crenças ja que não podia
Ver espíritos.

🌺 — Então?

Pensei um bocado, 
E então decidi que valhia a pena.
Meu neto tinha apenas nove
Anos de idade, meu filho e 
Nora estavam mortos,
E eu precisava de saúde pra
Criar o menino.
Olhei para tal Farrapo
E a chamei para dentro
De minha casa, fomos
Até o quarto das rezas,
Um quarto onde eu fazia
Meu trabalhos.

🌺 — O que é isso? Eu achava que judeus não acreditavam nisso.

Ela olhava desconfiada
Para as imagens de santos
católicos no altar.

👵 — Eu não acredito, mas a guarda da cidade não gosta do meu povo, então tenho de fingir ser católica. Me diga, que espírito quer que eu invoque?

Ela sorriu.

🌺 — Júlia Galega.
👵 — Mestra Júlia? Que papagaiada, você não precisa da magia de Endor pra falar com Júlia, qualquer Juremeiro...
🌺 — Sei que ela vai onde é chamada, mas a questão é que ela não quer estar perto de mim, então preciso que a force.

Dei de ombros, elas que
São mortas que se entendam.
No meio do cómodo havia 
A minha mesa de jogar Tarô,
Sob ela o cesto onde estava
a ferramenta que podia trazer
Uma mestra ate lá, era
Um chocalho de cabaça,
Uma maracá. 
Acendi sete velas sobre 
A mesa, cortei a pontinha 
Do dedo mindinho com
uma faca de rito e passei
O sangue no maracá
Desenhando ali o símbolo
de Endor,
Depois chamei meu neto,
Lhe prometi uns trocados
se ele tocasse o tambor,
O menino me achava a maior
Das doidas mas aceitou,
Entrou no quatro e no cantinho
Sentiu em cima de um tijolo,
Pegou o tambor e ficou pronto.

👵 — Ela não vai gostar de ser arrastada pra cá, tem certeza que quer isso.
🌺 — Tenho.
👵 — Pois bem.

Olhei para meu neto.

👵 — Para de chupar esse dedo, começa a bater ai.
👲 — A senhora ta falando olhando pro nada como se tivesse mais gente na casa, porque nao toma uma chá e vai tirar um cochilo vó?
👵 — Bata logo o tambor e não encha a paciência.

O menino revirou os olhos.

👲 — Queritmo vó? 
👵 — Zuela de Mestra.

Ergui o maracá acima
Da cabeça e comecei a 
Sacudir levemente,
O menino batucava 
Enquanto cantava:

👵 — "Ôooo Umburana de Cheiro!
Do Angico e Vajucá!
Tô-tô na Jurema, tô-tô a Juremá!
Eu vou chamar a Júlia Galega
Para ela trabalhar!"

Meu neto respondeu:
👲 — "Tô-tô na Jurema, tô-tô a Juremá!"

👵 — "Júlia Galega é princesa!
É princesa do Juremá!
Salve a dona Julia Galega
Que ela vem do alto mar!!

👲 — "Tô-tô na Jurema, tô-tô a Juremá!"

👵 — 'Venha pra cá dona Júlia
venha cá me ajudar!'

👲 — 'Tô-tô na Jurema, tô-tô a Juremá!"

👵 — "Foi lá no cabaré que ela se passou,
Mas seus cabelos dourados na Jurema 
Ela deixou!
Foi lá no cabaré que ela se passou,
Mas seus cabelos dourados na Jurema 
Ela deixou!
Ela é Júlia Galega, 
É la da banda sul,
Se pega o nego da-lhe um tapa,
Tira o couro e come cru!"

👲 — " Ela é Júlia Galega, 
É la da banda sul,
Se pega o nego da-lhe um tapa,
Tira o couro e come cru!" 

👵 — "Se pega o nego da-lhe um tapa,
Tira o couro e come cru!
Se pega o nego da-lhe um tapa,
Tira o couro e come cru!"

Então a mesa no centro da sala
Foi esmagada, meu neto berrou
Assustado pois so o que viu foram
As pernas na mesa quebrando,
Lascas de madeira espirrado,
O tampo batendo no chão e as
Cartas de meu tarot voando
para todo lado, 
Mas eu vi Júlia Galega cair sobre
a mesa, foi ela que a arrebentou.

💎 — Que sandice é essa?! Quem me chamou aqui?

La estava Julia, belíssima
em um vestido azul claro
Cheio de pedrinhas de brilhante
Incrustradas, os cabelos louros
Cumpridos volumosos,
Olhos azuis como diamantes.

🌺 — Olhe só dona Júlia, fui eu que a chamei mas não quero nada com a senhora, fiz tudo a mando dessa moça ai, então por favor não culpe a pistola e sim o dedo no gatilho.

Júlia virou o rosto e seus
Olhos se encheram de ódio
quando viu a Maria Farrapo
Ali diante dela.

💎 — O que tu pensa estar fazendo Madalena? Eu ja não deixei claro que não quero nada contigo?
🌺 — Pare de me empatar Júlia! Paulina, Ritinha, Bagaço e até a Luziara não vêem problemas em me ajudar, você é que está me impedido! 
💎 — De mim você não pode esperar nada além de desprezo.
🌺 — Rancorosa!
💎 — Pro inferno!
🌺 — Nós somos irmãs Júlia!
💎 — Irmãs na baixa da égua! Você não tem meu sangue, não é porque meu pai se engraçou com a vadia da sua mãe que você de repente virou minha irmã! Eu sou Júlia de Aguiar! E você Maria Madalena filha daquela que abre as pernas pra qualquer um!
🌺 —  A essa altura do campeonato tu ainda acha que falar da minha mãe vai me ofender?
💎 — Ah eu esqueci... você a matou não foi?
🌺 — Você não tem provas.
💎 — Cadela! Ah esqueça, não tenho nada que fazer aqui. 

Júlia virou as costas e sua
Figura começou a desvanecer,
E ai que eu vi que havia sido
Enganada.
A Maria Farrapo, porca 
E desleixada se tranformou
Em um piscar de olhos
em uma mulher belissima
De vestes purpura e dourado,
E os olhos brancos como
O do rei dos raios!
Farrapo se mostrou a mim
Como uma alma torta, esdrúxula,
Mas o que via agora era
Uma feiticeira.
As cartas do tarot espalhadas
Pelo chão começarão a voar
Pelo comodo, Júlia desapareceu
E imediatamente o comodo
Estremeceu e eu e meu neto
Fomos arremassados para cima,
Me lembro de ouvir ele berrando
e de ver as vigas do teto
Chegando bem perto de meu rosto,
Mas de repente o telhado da casa 
Não existia mais
E quando dei por mim estava
deitada em um chão de terra
E folhas secas.
Meu neto correu pra junto de mim
E me ajudou a levantar.

👲 — Que lugar é esse vó? E quem são essas moças?

Ele agora podia ver as duas,
Elas lutavam como duas leoas
Diante de uma árvore.
Olhei com atenção para a árvore,
Era gigantesca, em seu tronco
Eu vi uma cobra coral enorme,
Maior que a maior das jibóias,
Ela se enrolava no tronco
Sem parar.
Olhando em volta
vi sete batentes de portão,
Portais.
Através de cada um era 
Possível ver um lugar diferente.

👲 — Vó! Eu to com medo!
👵 — Isso... eu acho que é a Jurema sagrada... 
👲 — A árvore onde Jesus chorou?
👵 — é... eu acho que é... 
👲 — Meu Deus... existe mesmo...
👵 —  Em volta esta vendo os portões? São as sete cidades sagradas de Jurema. 
👲 — Vó eu quero ir pra casa... eu não quero ficar aqui, eu tenho medo!

Eu também tinha medo.

👵 — Olha meu anjinho, eu acho que... na verdade eu não sei, eu não sei o que fazer.

Então meu neto 
Correu até um dos portões,
Um que através dele era
Possível ver uma aldeia
Com ocas e uma grande maloca.
Meu neto tentou atravessar
O portal mas não conseguiu,
Era como se houvesse uma
Folha de vidro, ele bateu várias
vezes mas não conseguiu passar.
Fui até ele levando meu maracá.

👲 — Vó, essa é aldeia dos caboclos, não é?
👵 — Eu acho que é, parece ser uma morada indígena.
👲 — Então o Sultão das Matas mora ai, não mora?
👵 — Eu... não sei.
👲 — Ele era o caboclo do meu pai, ele vai me ajudar, sei que vai! Ele vai me tirar daqui!

Fiquei surpresa, meu filho
Tinha morrido a muito tempo,
Não sabia que o menino lembrava
De seu Sultão.
Olhei para trás, Farrapo e Júlia
ainda lutavam se rasgando
com as unhas cumpridas.
Eu limpei a marca
De sangue do maracá 
Com o pano da minha saia,
Dei ele a meu neto.

👵 — Lembra como seu pai chamava ele? Chame também.

Meu neto tremia um pouco
Mas começou a sacudir o maracá
E a cantar:

👲 — "Três-cima-na-cacique! 
 Três-cima-na-caçada!
Três-cima-na-cacique! 
Três-cima-na-caçada!
Rodeia a mesa caboclo e vamo trabalhar!
Rodeia a mesa caboclo e vamo triunfar!
Caboclo sultão das matas assobiou!
Assobiou, no terreiro deu pra ouvir!
Meus irmãos, vão ver quem é!
Ele é Sultão das Matas, o caboclo vem ai!"

Vi através do portal vários
Indios saindo de suas ocas
E olhando espantados para nós,
Então em instantes o portal 
Reluziu e um homem indígena 
De mais de dois metros 
De altura atravessou, 
Usava um saiote
De couro de onça e um cocar
De penas de arara,
Ele olhou para nós dois
E imediatamente nos ajoelhamos
diante dele.

👲 — O senhor é o Sultão das Matas?
🦜 — Uhum.
👲 — O senhor pode...

Meu neto tentou falar 
Mas o índio ergueu a mão 
Pedindo silencio,
Então passou por nós e
Foi direto para as duas
Que ainda lutavam diante
da árvore, as agarrou pelas
Vestes e jogou as duas no
Chão com tamanha força
Que elas cairam e permanceram
Derrubadas.

🦜 — Que ser isso? Que pensam vocês? Desrespeitando mãe Jurema! 

A voz dele era tão grossa
Que tremia dentro da gente
quando falava.

🦜 — Diz você Galega, porque faz isso? E quem é essa mulher?
💎 — Ela é uma amaldiçoada, quer tocar na arvore sagrada pra se livrar da maldição! Quer usar a Jurema Sagrada pra se limpar da sujeira!
🌺 — Me desculpe meu senhor, mas eu achei que Jurema sagrada era para todos.
🦜 — Para todos os justos. Galega, porque esse mulher não merece tocar em mãe Jurema?
💎 — Porque ela é má. Veja o que fez com aqueles dois, a velha e a criança, elas os trouxe para cá a força.
🌺 — Era a minha unica oportunidade, no momento em que você estava partindo era o momento que se eu usasse de magia poderia a seguir.
🦜 — matou o curumi e a anciã só para vir até aqui?
🌺 — Como matei? Não, eu só os trouxe até aqui e...
💎 — As almas sua estupida, aos pés da árvore Jurema so podem se achegar as almas. Os corpos deles ainda estão naquela casa.

Meu neto começou a chorar
Ao ouvir aquilo,
E eu quis abraca-lo 
Mas antes que pudesse 
Um galho da arvore
Baixou e o agarrou,
O menino gritou desesperado
E eu fiquei boquiaberta
ao ver o galho se transformar
Em um braço, a copa da arvore
Se derramar em uma cabeleira 
Negra, longa e lisa, 
A cobra coral se tornar 
Um colar e de repente
A árvore era uma mulher
Gigantesca usando um cocar
De penas negras e pinturas
vermelhas pelo corpo nu.
Meu neto era como um
Passarinho em sua mão
enorme, ele se debatia
assustado, ela assoprou
Em cima dele e
Então ele desapareceu.
O índio e as duas mulheres
Estavam agora prostrados
Em reverência diante da giganta.

👵 — O que você fez com meu neto!?

A giganta sorriu para mim
E com uma voz suave falou:

🌳 — Mandei de volta, a alma dele voltou para o corpo. Nenhum inocente deve sofrer diante de mim.

Então eu entendi,
A giganta era a mãe da terra,
Era a Cabocla Jurema.
Me prostrei diante dela.

👵 — Senhora, meu neto só tem a mim, me permita voltar a meu corpo, eu tenho de cuidar dele...
🌳 — Tu não é uma inocente, não tenho de lhe fazer favor algum. Por outro lado, aqui diante de mim ha duas mulheres com justa causa, uma que justamente quer impedir alguém que crê ser má de me alcançar, outra que quer me alcançar com a justa causa de ser livre. 

🌺 — É só isso que quero minha senhora, apenas ser livre.
🌳 — Então que seja assim, vê aquele portal? O que a lua aparece através dele? 

Olhei para trás, realmente um
Dos portais tinha uma lua
Bem grande e reluzente
Brilhando sobre um morro.

🌺 — Sim minha senhora, eu vejo.
🌳 — É o portal para o mundo dos vivos, de onde tu viestes. Agora para ser justo eu deixarei o portal aberto, se Júlia a empurrar por ele... tu nunca mais terá a chance de ser parte da mesa da Jurema Sagrada, mas se tu conseguir tocar em mim, ai sim será quebrada toda a maldição sobre seu espírito, pois não há rainha que mande em um dos meus. Se tu me alcançar, poderá ser livre e também poderá ajudar a anciã a voltar a viver.

O indio deu um grito agudo
E os sete portais se abriram,
Muitas pessoas sairam deles,
Eu reconheci Mestres, Mestras,
Marinheiros, Caboclos e caboclas
de pena ou de boiada, espíritos da
Floresta e outros que não pude
Distinguir pois não conhecia.
Eles saudaram Jurema com
Vênias e então formaram um 
Círculo em volta das duas mulheres,
Eu mesma fui levada para
o circulo para ver a luta das duas.
Era assombroso, elas usavam
feitiços uma na outra,
Quando Farrapo estava quase
Tocando no corpo da giganta,
Julia a puxou para trás a 
Arremessando longe,
Quando Julia estava quase
Empurrando Farrapo para
Dentro do portal 
Farrapo se safou e deu-lhe
Um bofetão, saiu correndo
disparada até a giganta
Mas foi impedida por 
Júlia novamente.
Os espíritos na roda
Vibravam com a luta,
E eu não entendia realmente
Os motivos de Júlia querer
tanto impedir Farrapo
De alcançar o objetivo,
Mas se ela estava tão
Empenhada devia ter 
Uma razão firme.
A briga prosseguiu
Por algum tempo,
Elas eram muito fortes,
Quando as unhas de uma
arranhava o corpo da outra
Aquilo emitia faíscas
E um cheiro forte de rosas.
Eu estava apreensiva
Mas em um determinado
momento Farrapo conseguiu
Se desvencilhar,
Correu até a grande Jurema
E tocou a ponta do dedo
Em um dos pés dela.
Júlia correu para agarra-la
Mas antes que pudesse
Alcançar, o corpo de Farrapo
Se acendeu como uma farol
E permaneceu brilhando.
Júlia sentou no chão dando
Socos na terra, estava era
Cheia de raiva.

A giganta se inclinou,
Fez um biquinho com os lábios 
E soprou sobre Farrapo,
A figura dela voltou as cores
normais.

🌳 — Diga seu nome.
🌺 — Eu sou Maria Madalena, mais conhecida como Maria Farrapo.
🌳 — E agora tu é parte da Jurema. Vá em paz Maria Farrapo, não tem mais maldição nenhuma sobre ti.

Farrapo ficou em pé.

🌺 — Muito obrigada. Eu... eu posso então sair do mundo dos vivos? 
🌳 — Depende. 
🌺 — Depende do que, senhora?
🌳 — Se os outros mundos vão querer lhe receber.

Dei um passo a frente
para perguntar se agora
Poderia voltar para meu corpo,
Mas quando abri a boca
Ja me vi dentro do cômodo
De minha casa, diante da
Mesa quebrada e com algumas
cartas de Tarot ainda flutuando
No ar.
Toquei meu rosto
Pra ter certeza.

👵 — Meu Deus... eu estou viva...

Ouvi uma respiração forte,
Meu neto estava deitado no chão
Bem ao lado do tambor,
Ele bocejou e abriu os olhos.

👲 — Nossa vó eu tive um sonho tão doido... ué, a mesa quebrou? 
👵 — Sim meu amor, ja era velha, não ligue pra isso. Ande, va se lavar pra ir dormir.

Ele saiu do quarto andando
meio torto, tonto, foi 
Para os fundos da casa
Se arrumar para deitar,
Já eu fui para a varanda,
Sabia que tinha alguém lá.
Sai pela porta e ali sentada 
Nos degraus da varanda
Estava Maria Farrapo,
Linda em púrpura e dourado.

👵 — Conseguiu o que queria?
🌺 — Sim, e tu também.
👵 — Quase matou a mim e ao menino.
🌺 — Não foi de caso pensado. Mas não se angústie, eu vou cumprir a minha parte do trato, tu vai viver bastante Nazaré. Obrigada.

Ela desapareceu como
Se fosse feita de vapor
Ali bem diante de meus olhos.
E Eu? Eu morri na altura
dos cento e onze anos
Morri dormindo, sem doenças
ou dores, deixei meu neto
Com a vida feita,
E hoje ca estou,
Pois hoje moro em uma
Das sete cidades sagradas,
Moro no sobrado de dona Luziara,
E lhes digo, tenho ainda
Muita história pra contar.




_

CONTO 12: O SÉTIMO CADEADO 

👹👺💀👹👺💀👹👺💀👹👺
Eu rezava antes de dormir,
Rezava as vezes  para Jesus,
Outras para o Diabo,
Tanto fazia, eu apelava
Para qualquer um que pudesse
me ajudar a sair dali.
Foi então que uma noite
Aquela mulher
apareceu diante das barras
De ferro de minha cela.
Eu achei que era um anjo.
Que tolice a minha,
Um anjo de vestido vermelho,
Maquiagem e espartilho?
Estava preso na Aljube ja 
Fazia dois meses,
O lugar era um inferno,
Cheirando a bosta
E com gritos interrompendo 
O sossego de quem queria paz.
Dois meses sem ver a luz do sol
Deixa a gente doido sabez
Então naquela noite acordei
Com a voz suave da mulher
Me chamando, abri os
Olhos e a vi ali em pé 
No corredor.
Por Deus eu lhes digo,
Era tão linda eu mesmo
Tendo a percepção que era
Coisa do outro mundo,
Dela não tive medo.
Eu sabia que era coisa do
Outro mundo pela perfeição.
Não existe gente de carne e 
Osso tão perfeita.
Me ergui de salto e 
Corri ate as barras de ferro.

🌹 — Afonso... 
Ela disse meu nome
Cantando as silabas
De um modo galante.

👨 — Que-quem é a senhorita?
🌹 — Se eu lhe disser que sou uma fada, você acredita?
👨 — Não...
🌹 — E uma bruxa?
👨 — É mais provável.
Ela riu disso.
🌹 — Afonso... logo que amanhecer vão vir lhe tirar desta cela, irá a julgamento pela manhã e antes do meio dia teu corpo estará balançando feito um pendulo na praça, enforcado. As crianças irão atirar pedras no cadáver e os pássaros comerão suas vísceras.

👨 — Jesus amado...
Engoli em seco.
🌹 — Ficou assustado?
👨 — Com medo sim, mas assustado não. Eu ja imaginava. É injustiça, eu sou inocente.
🌹 — Eu sei que é, eu sei. Eu posso lhe ajudar, se quiser.
👨 — A senhorita é uma alma penada? Na vera?
🌹 — Quase isso. 
👨 — Então quaisquer ajuda que puder me dar, eu quero.

Ela abriu um sorriso largo
Mostrando dentes tão branco
Que imediatamente fechei
minha boca com vergonha
dos meus amarelos.

🌹 — Para que eu te ajude, deves me dar permissão. Eu posso lhe tirar daqui, mas so se me der total autoridade sobre si.
👨 — Autoridade?
🌹 — Sim, autoridade sobre sua vida.

Ponderei bem, 
Mal conhecia aquele diabo,
Mas a segundo opção
era dizer não e acabar enforcado.

👨 — Pois bem.
🌹 — Não, tens que dizer "Eu me entrego totalmente, me dou de corpo e alma a ti".
👨 — Eu me entrego totalmente a ti, me dou de corpo, alma e tudo mais que quiser dona moça.

Ela gargalhou.
Olhei para o rosto dela
E tentei sorrir também,
Mas tudo ficou turvo,
Minha vista escureceu
E tive algo como um desmaio.
Comecei a sentir uns solavancos
E aos poucos fui retomando
Os sentidos, me vi
Em meio a um matagal.
So podia saber que era 
Matagal pelo brilho
Da lua que refletia
No mato rasteiro,
Pois era alta madrugada.
Andava rápido e logo
Comecei a correr,
Sentia a fricção do tecido
Da calça enquanto corria.
Mas... mas eu não queria,
Não queria correr descalço 
Pelo mato.
Tentei parar, em vão.
Tentei mais, nada, eu
Continuava correndo.
Tentei gritar, ate senti
o ar passar pela garganta,
Mas nenhum som
Saiu de minha boca.
Pensei: 
"Estou endemoninhado"
E de fato estava.
Tinha medo, tanto medo que 
Acabei por começar a rezar
A Nossa Senhora em pensamento
Para tentar livrar meu corpo do
Domínio de Satanás.
De repente fui lançado 
Contra o tronco 
De uma figueira,
Bati ali e girei no ar 
Caindo do outro lado, 
Rolei por uma ribanceira 
E quando parei deitado
de bruços, percebi
Que ja tinha novamente
o controle de meu corpo.
Ao tentar me levantar
senti tanta dor nos membros
que cai de volta com a cara
Na terra.

💀 — Nazareno, o que é que esta se passando comigo?
🌹 — Levanta.

Era a voz dela, daquela mulher.
Tentei levantar, não dava,
Tinha costelas quebradas,
Gosto de sangue na boca.

🌹 — Mandei levantar!

Ela agarrou minha cabeça
puxando meus cabelos,
Me forçando a ficar em pé.
Gritei de dor e de horror
Quando comecei a ser puxado
pelos cabelos,
Andava tropeçando nas 
Touceiras e nas pedras,
Nao conseguia ver direito,
Via sim as costas dela,
A amarração do espartilho
e os cabelos negros.
Pedi para que me soltasse,
Mas ela não soltou.
Então a luz da lua cheia
Clareou o terreno,
Estávamos descendo um morro,
Haviam pontas brancas saindo
do solo, saíam por todos os lados.
Eram ossos.
Chutei um crânio pequeno,
Ouvi o som de rachar quando
Pisei em uma caixa torácica.

👨 — Valei-me Nossa Senhora da Conceição!
🌹 — Ah que delicia, um homem de fé!
👨 —  Isso é ossada de gente moça! 
🌹 —  É sim.
👨 — Me solte! Eu não quero! Não quero ficar aqui!
🌹 — Sabe o que é isso? Um cemitério de escravos. Os donos dos canaviais e cafezais da região mandam os corpos para cá, e como não querem perder tempo, cavam covas razas ou simplesmente abandonam os corpos ao léu. 
👨 — Ka-kalu... ka... é uma Kaluka?
🌹 — Kalunga, é isso mesmo, assim que esse lugar é chamado. 

Ela agarrou meu pescoço com 
Força e me atirou dentro de 
Um buraco no solo, cai derrubando 
Junto um punhado de terra e ossos.
Tateei o chão, era liso como
Se houvesse sido pavimentado.
A mulher veio atras de mim
E me agarrou pelos cabelos
me fazendo ficar em pé.
Então o local misteriosamente
Se iluminou com uma luz 
Amarelada como a de archotes.
Olhei a diante, ali havia
Uma grande caixa de madeira
Podre, retangular com quase 
Dois metros de comprimento
Em volta da caixa contei
Seis corpos de homens
e mulheres, 
Corpos ainda frescos,
Apenas um pouco inchados 
E parcialmente devorados,
Todos com os braços ainda
Esticados, as mãos tocando
O tampo da grande caixa.
Fui forçado a me aproximar,
Tropecei em correntes no chao.
Vi no tampo na caixa
A marca de onde antes haviam 
Estado seis voltas de correntes,
E seis cadeados abertos 
Jogados sobre a madeira dela.

A mulher me jogou sobre o
Tampo, bem diante do meu rosto
Vi uma última volta de corrente
Com um cadeado de prata.

🌹 — Abra.

Ouvi vozes, chiados dentro daquele
buraco, as vozes cheias de medo
Me diziam para não tocar no cadeado.

🌹 — Calados! 
As vozes sumiram.
🌹 — Ande Afonso, abra.
👨 — Eu... eu não tenho a chave.
🌹 — Tente assim mesmo.

Aproximei minhas mãos
trémulas do cadeado,
E quando eu o toquei
ele simplesmente se abriu.
Segurei o cadeado em minhas
Mãos e fui tomado por um
Frio tao intenso que dei um
Salto para trás.
Mas assim que pulei
Vi aquele corpo masculino
Debruçado sobre o tampo
Da grande caixa.
Era eu, era meu corpo.
Fiquei parado, imóvel
Sem saber o que fazer.

🌹 — Obrigada.
A mulher sorriu para mim cheia de deboche.
👨 — Você me guiou até a morte. Porque fez isso comigo?

Ela foi ate meu cadáver e o puxou
Pelos cabelos para que saisse de
Cima da caixa.

🌹 — Porque exatamente você foi parar na prisão de Aljube?
👨 — Roubo.
🌹 — Isso é o que os intendentes sabiam, mas você fez bem mais que roubar, não fez?
👨 — Não...
🌹 — Não minta, não adianta mais. Matou quantas mulheres Afonso? Quatro?

Assenti.
Ela sabia das minha vida.
🌹 — Você nunca ouviu falar em separação de corpos? Achava mais fácil matar as coitadas não é?

Fiquei em silencio.
🌹 — Sua participação aqui ja acabou, pode ir embora.
👨 — Para onde eu vou?
🌹 — Para o raio que o parta.

Eu não me movi, fiquei e
Observei ela Abrir a grande caixa,
E com espanto vi ali dentro
um esqueleto, aquilo era
Um caixão.
A mulher se inclinou sobre o 
Esqueleto e cantou algo, 
Eu não sei repetir as palavras
mas não era em português.
Então o esqueleto se tornou
Gente novamente, a figura 
De uma mulher negra vestida
com um diáfano vestido branco,
A pele reluzente e o rosto 
Emoldurado por uma vasta 
Cabeleira.
A negra no caixão se mantinha
Serena, olhos fechados 
E labios entre abertos.

🌹 — Se lembra Djenane? Se lembra de Quitéria?

Ao ouvir aquele nome
Os olhos da mulher no caixão
Se abriram imediatamente
E ela encarou a outra com fúria.

💀 — Quem és tu?
🌹 — Eu? Uma amiga. Eu a libertei dos sete cadeados.
💀 — Sete Cadeados? Como?

Foi de repente, a mulher
Se ergueu do caixão de 
Modo desordenado,
Apertou as mãos sobre
O estômago e balbuciou:

💀 — Meu filho... meu bebê! Onde? Onde está meu bebê?
🌹 — Não chegou a nascer. Querida, não percebeu? Você esta morta.

A mulher negra se voltou
para o caixão do qual acabara
De sair e então apanhou
dentro dele um minúsculo
Crânio, tão pequeno que cabia
Na palma de sua mão.
Segurou como se aquilo fosse
A coisa mais preciosa do mundo.

🌹 — Ela sabia, Quiteria Sabia que você era muito mais forte que ela.
💀 — Mas no período de gestação... eu fiquei fraca. 
🌹 — E ela... bom, você sabe.
💀 — Me matou... matou uma mulher grávida...
🌹 — Ela não é exatamente uma fã de maternidade.
💀 — Quanto tempo estive presa neste caixão?
🌹 — Quase cem anos.

A expressão da mulher negra
Se tornou dura, cheia de ódio.

💀 — Como você sabe destas coisas? Como soube desfazer as sete trancas? Quem é você?
🌹 — Eu fui aprendiz de Quitéria na época que era viva. Eu a ajudei a mover este caixão para cá, e ela acabou por me contar a sua história. 
💀 — Quem é você? 
🌹 — Maria Padilha, este é meu nome. Djenane... eu vou te ajudar a se vingar dela.
💀 — Ajudar? Como? Como eu me vingaria dela? Se realmente se passaram cem anos, aposto que assim como eu ela ja está morta.
🌹 — Sim ela ja é morta. Mas ainda há como se vingar dela.
💀 — Como?
🌹 — Ela lhe matou para roubar as caixas, eu sei. Mas ela nunca conseguiu usar o poder delas.
💀 — As caixas da Rainha? Ninguém pode usar aquelas coisas,  impossível controlar aquele demónio.
🌹 — Justamente. Vamos abrir as caixas.

A mulher negra arregalou os 
Olhos para aquela que agora
Eu sabia se chamar Maria Padilha.

💀 — Abrir? Ficou louca? Se a Rainha sair, se for liberta... ela vai fazer conosco o pior que posso imaginar.
🌹 — Conosco não, nós a libertaremos. Com ela, o pior vai recair sobre as outras, e entre elas, Quitéria. 

A mulher negra olhou
para baixo como quem
Pensa, cogita.

💀 — Não tem medo desse plano dar muito errado?
🌹 — Pergunte por ai se medo uma característica de Maria Padilha. 
💀 — Gostei...
🌹 — Então vamos Djenane, vou te contar tudo que sei.
💀 — Djenane? Eu? Não mais.
🌹 — Não quer mais seu nome humano? Escolha outro então.
💀 — Que tal... Sete Catacumbas?

E elas saíram dali gargalhando.
Eu? Eu fiquei por aqui mesmo,
Algo que desconheço me impede
De ir para outro mundo.
Eu sou apenas uma testemunha,
Um fantasma com muitas histórias
Para contar.



_

CONTO 13: PASSARINHOS 

🌷🌹🥀🍷🍾🍸🌷🌹🥀🍷🍾🌷🌹🍷
Quando ele me pede ajuda...
Eu ajudo.
Não me julguem por não saber
Dizer não, as coisas do coração
São muito complicadas.
Aquela desgraçada foi a dona
Do meu coração na época em
Que eu tinha um.
Quando me chamou cochichou
Em meu ouvido o local onde
Rosa Vermelha escondia duas
Caixas de Madeira,
Onde Rosa Caveira escondia
Outra, onde Quitéria escondeu
outra. 
Entreguei a Padilha essas quatro
Caixas e ela me mostrou
Ter posse de uma, então ali
Eram cinco. Pediu que eu
Fosse atras de mais uma caixa,
E dessa vez me orientou a ser
Extremamente cuidadoso pois
Teria de Roubar de Júlia.
Ah Júlia era uma miúda
Que mesmo após morta
O povo chamava de Menina.
Não estava confortável com isso,
Mas Padilha fazia beicinho,
Me beijava atras das orelhas
até eu dizer que sim a todas
as maluquices dela.
Era uma noite escura, chuvosa,
Os relâmpagos eram a unica
Luz que clareava a noite.
Fui sorrateiro ate a morada
De Menina, uma casa de dois 
Andares abandonada
Em São Pedro, vasculhei
A casa todos os quartos, 
Mas não encontrei nada.
Quando ja estava de saída
Atravessei matagal
Que outrora havia sido um
Belo jardim e fui surpreendido 
Por Menina sentada em 
Um balanço velho amarrado 
Ao galho de uma árvore,
Estava la com a costumeira
Cara de Sonsa, tinha apoiado 
No colo a caixa que eu procurava.
Bateu os pés no chão e parou 
O balanço.

🌸 — Sabe Tranca Ruas, ela devia saber... devia saber que eu ia saber. 
🎩 — Eu acho que ela sabe que você sabe.

Rimos da repetição de palavras.

🌸 — As vezes eu vejo o futuro sabia?
🎩 — Sim, sabia.
🌸 — Você confia nela? 
🎩 — Sinceramente? Não.
🌸 — Mas ainda assim faz tudo o que ela quer. Sempre fez.
🎩 — Sim.
🌸 — Eu vou te dar a caixa, depois vou soar o alarme. Tu corre rápido Tranca Ruas?
🎩 — Mais veloz que uma chita.
🌸 — Será? Vamos ver.

Ela estendeu os bracinhos curtos,
Eu apanhei a caixa.

🎩 — Porque esta entregando sem resistência?
🌸 — Não sou uma Maria, nem uma Rosa, nem mesmo uma Sete. Eu não sou uma delas, então... meu papel nessa jogada é apenas ver o que vai acontecer. 

Não entendi o que ela quis dizer, 
Apanhei a caixa me virei de costas
Pronto para ir embora,
E então Menina gritou
Um grito tão agudo e tão alto
Que me deixou um pouco tonto.
Aquilo era o alarme.
Corri para a cidade, pelas ruas
Da Cabo Frio, em uma encruzilhada
foi surpreendido por três delas,
Pelos brilho dourado, purpura e prata
Eu reconheci Dama da Noite,
Maria Mulambo e Rosa Caveira.
Inclinei o corpo e como um 
Corisco eu desviei delas,
As unhas negras e pontiagudas
de Dama da Noite por pouco
não me rasgaram.
Elas vieram atrás, mas na
Corrida não eram pario para mim.
Quando o pavimento da 
Cidade acabou, entrei na floresta 
E continuei a corrida deixando as 
Trêspara trás, mas então me 
Preocupei quando vi o vulto 
Vermelh correndo entre os troncos
A minha direita, era Rosa Vermelha,
E ela sim poderia me ganhar 
Em uma corrida, então
dei o melhor de mim
corri como o vento e ja
Estava chegando no local
Combinado quando Rosa Vermelha
Conseguiu agarrar meu braço,
Mas não parei de correr,
Por uns duzentos metros
Corremos assim, agarrados.

🌹 — Porque esta fazendo isso?! Devolva! Não tem ideia do que tem dentro dessa caixa.
🎩 — Largue!
🌹 — Entregue a caixa!

Ela enfiou uma de suas
pernas entre as minhas,
Caímos, na verdade rolamos
Por vários metros.
A caixa saltou de minhas mãos
e deslizou pelo gramado 
Umido de chuva.
Nisso me dei conta que
ja estava no local combinado,
O cemitério da Boa Fé.
Rosa Vermelha olhou
Para o lado e gritou:

🌹 — Padilha ele roubou a caixa de Menina! Pegue e esconda! Não sei o que ele quer, mas acho que esta mancomunado com a Sete Catacumbas.

Olhei para a direita e la estava 
Maria Padilha, ela apanhou a caixa
no gramado, e sorridente disse:

🍷 — Obrigado Tranca Ruas, sempre me ajuda muito. Assim que acabar aqui vou lhe recompensar por esse gesto.

Eu sorri e ergui o polegar para ela,
Ela gargalhou e deu as costas,
Desaparecendo atras de um mausoléu.
Rosa se levantou aturdida.

🌹 — Ela te agradeceu... não... foi ele que lhe mandou roubar a caixa? 
🎩 — As suas duas eu também roubei.

Ela abriu a boca assustada e correu
Atrás de Padilha, e enquanto
Eu ficava em pé vi passarem
Correndo Rosa Caveira, Navalha
Mulambo, Quitéria, e Dama da Noite,
E assim que passaram ouvi
Gritos e uma luminosidade
alaranjada banhar as tumbas,
Então as segui para ver
O que ia acontecer. 
O que eu vi foi fantástico,
Um tanto absurdo mas sem
Dúvida fantástico!
Sete Saias rodopiava na ponta
Dos pés como uma bailarina
E de sua figura saia fogo!
Ela trançava um círculo perfeito
girando e erguendo atras de si
Uma parede de chamas vermelhas
Impedindo as recém chegadas
de passar.
Ouvi Navalha falar:

♠ — Não sabia que Sete Saias podia fazer isto...
🌹 — A questão não é ela poder fazer, mas sim o motivo de estar fazendo. Ela esta do lado de Padilha.

Saltei sobre o telhadinho
de um mausoléus, 
Queria ver o que sete Saias
Protegia das outras,
Ali de cima vi que
no meio do círculo estava
Maria Padilha e uma mulher
de vestido Branco, elas 
Estavam abaixadas posicionando
Todas as caixas, as quais 
Contei serem sete,
Na posição de uma cruz deitada.

🍷 — Pronto, agora por obséquio, as abra.
❄ — Certo. — disse a mulher de branco.

Ela mostrou a Padilha 
Uma chave de prata e a
Segurando com a mão tremula
Ela fez menção de abrir uma
Das caixas, mas parou e 
Olhou para Padilha receosa.

❄ — Tem certeza que isso é uma boa ideia?
🍷 — Claro que sim, Sete Catacumbas nós temos esse plano a anos, não da pra voltar atrás agora.

A tal Sete Catacumbas
engoliu em seco 
E foi abrindo caixa por caixa,
E então ela e Padilha se 
Afastaram. 

🍷 — Pode parar Sete Saias.

Sete Saias parou com o giro
Pirotécnico e caiu de joelhos no
Chão, arfando, o fogo se 
Extinguiu e Quitéria deu 
Um passo a frente
berrando furiosa:

💜 — O que vocês fizeram?!

Dama da Noite também berrou:

🌟 — Como você pôde nos trair desta maneira?!
🍷 — Tolas...
❄ — Vocês deviam ter suspeitado. Eu sempre as achava, sempre sabia onde estavam, o que estavam fazendo. Nunca passou pela mente de vocês que alguém estava me contando essas coisas? Eu fui ate o amante de Mulambo, ate o estalajadeiro de Quitéria, até o morro de Maria Navalha, ate o convento... como eu saberia dessas pessoas e desses locais?
🌟 — Padilha era quem lhe contava tudo...
🍷 — Sim, eu sempre adorei uma boa fofoca. Agora silêncio, vai começar.

Ouvi estalos altos, nisso as 
Tampas das caixas se 
Partiram e lascas de madeira
Voaram para todos os lados.
Ossos humanos flutuaram para 
Fora de seus delas e 
Se ergueram no ar,
Como se fossem influênciados 
Por magnetismo os ossos foram
se unindo, montando um 
Esqueleto perfeito,
Que se pôs ereto flutuando
a um metro do chão.
Então a última caixa liberou 
Uma peça dourada, 
Uma coroa de puro ouro 
Com rubys incrustados
Que flutuou até pousar no
Topo do crânio do esqueleto.
O que se seguiu foi uma ventania
tão absurdamente forte
Que eu mesmo sendo um
Espírito de homem morto
Tive de me agarrar a estátua
de um anjo erguida ali
Sobre o telhadinho.
Então aconteceu, do esqueleto
saltou uma luz vermelha
Uma bolinha minúscula
Que cresceu e cresceu
ate criar tronco, cabeça,
 braços e pernas, e em um
Piscar de olhos pisou no 
Solo do cemitério uma mulher
de vestes vermelhas em
Estilo medieval, com os
Olhos e labios cheios de kajal
E com a cabeça adornada pela
Coroa dourada, os ossos cairam
Displicentes pelo gramado
Mas a coroa permaneceu sobre
A cabeça daquele espírito.
Era notoriamente uma Rainha.

👑 — Enfim... fui libertada. Quem me libertou?
❄ — Eu minha senhora. 
👑 — Serei eternamente grata. Agora... todas vocês, de joelhos perante sua Rainha.

Todas que estavam ali cairam
De joelhos, e eu fiquei atónito
ao ver obediência nelas.
Então vi pelas posturas rígidas
Dos corpos que aquilo não era
Uma escolha, elas foram impelidas
Por alguma força da qual desconheço
A se ajoelhar.
A Rainha foi caminhando entre 
Elas, dando tapinhas leves
nas bochechas de cada uma
Tal qual se faz nas ancas de um
Cavalo ao avalia-lo na hora
Da compra.

💜 — Rainha nós... 
👑 — SILÊNCIO!
 
Os lábios de todas se selaram.

👑 — Vocês vão me servir muito bom, tenho propósitos... grandes propósitos que vocês irão realizar... para mim.

🍷 — Iremos é?

A Rainha virou o rosto
E encarou Padilha que 
Se erguia do chão.

👑 — Como... EU MANDEI FICAR DE JOELHOS E CALADA!
🍷 — Eu ouvi da primeira vez, mas estou cagando para os seus desejos, majestade Sereníssima...

Então ela fez uma vénia debochada.

🍷 — Majestade a senhora está muito exaltada. Aposto que meia hora de pica é o que lhe faz falta, Milady. 
👑 — O QUE?!
🍷 — Pare de gritar, piranha velha, vai acordar os passarinhos.
👑 — Passarinhos? Do que está falando? E como ficou imune a meu poder?

Padilha sorriu a apontou para cima,
Rainha ergueu a cabeça, 
E eu também, o céu chuvoso estava
Preto de tao escuro, mas de repente,
Por um curto instante a escuridão
Foi cortada pelo clarão de 
Um relâmpago e eu vi muitos,
Dezenas daquelas sombras escuras
Voando sobre nós, circulando
o lugar como urubus atras 
De carniça. No extremo alto,
No exato meio da roda de alados
Vi um maioral entre eles,
Um que era alto e forte
E que me fez sentir medo.

👑 — Lúcifer... 
A Rainha balbulciou incrédula.

🍷 — Sim, eu fiz amizade com Lulu, e ele é um amor. Sabe, dona Rainha sei-la-do-quê, eu sempre gostei da sua história. Sim, quando eu era viva, Quitéria me contou muitas vezes, a história da maior da bruxas, a que foi devorada pelos próprios filhos... nessas decadas em que estive vagando por ai como um espírito amaldiçoado, tentei replicar a sua história, tentei encontrar um demónio que me desse poderes extraordinários... mas sabe, não encontrei. Essa terra,essa maldita colónia Portuguesa não tem demónios. É uma coisa estranha, os Deuses dos índios proibiram Lúcifer e seus amiguinhos de pisar aqui. Mas estamos em um momento onde os Deuses estão isolados em seus espaços sagrados, lamentando o genocídio de seus povo, e isso significa que não ha deuses aqui agora para proteger o lugar. Significa também que um espírito de feiticeira nascido e morrido aqui, com os restos mortais enterrados neste solo, poderia convidar Lúcifer a entrar. Eu sou exatamente uma feiticeira nascida, morta e enterrada aqui. Uns anos atras sai pelo mundo buscando um demónio que pudesse me levar ate Lúcifer, e encontrei um em uma ilha distante da costa da Bahia, e ele me levou ate o tal. Fizemos um acordo, eu e ele sabe...
👑 — Que acordo?
🍷 — Ele me daria por algumas horas parte do poder dele próprio... sabe qual é o maior poder dele, heim dona Rainha?

Rainha deu alguns passos 
Para trás temerosa.

🍷 — Ah uma mulher inteligente como a senhora saberia, é claro que saberia. Lúcifer se alimenta de Almas, suga a vitalidade delas como um morcego suga o sangue de um porco no chiqueiro. Nao se afaste meu amor, eu so quero lhe dar um beijo.

A Rainha se virou girando,
Fazendo seu vestido abrir
No ar, mas antes que pudesse
Fugir, Maria Padilha a agarrou 
Pelos cabelos e pisou na barra
Da saia da soberana, que caiu
Estabacada no chão.

🍷 — Eu amo ver essa expressão de terror no rosto dos poderosos. Pessoas dotadas de grande poder nunca cogitam a derrota, então quando caem... a expressão de horror e incredulidade é... maravilhosa se ver.
👑 — Escute, eu... você... você não precisa fazer isso, eu posso repartir meus dons contigo por livre e espontânea vontade!
🍷 — Sei que pode se quiser, mas eu quero tomar a força.

Então vi Padilha
Se inclinar, agarrar
A nuca da Rainha.

🍷 — Achou mesmo que essa situação era sobre você? Aprenda desde já mulher, onde eu estiver a situação é sempre, sempre e sempre sobre mim.

Padilha abaixou o rosto
e forçou nela um denso 
Beijo nos lábios.
Então a Rainha caiu desfalecida,
O corpo inerte.
Padilha tocou com o dedo
Indicador o exato
ponto entre os seios da Rainha.

🍷 — Venha para mim...

Dali surgiu uma luz dourada
Que Maria Padilha apanhou 
Com ambas as mãos,
Levou ate a boca e...
Engoliu.
Por algum tempo ficou
com os olhos fechados
Saboreando aquilo,
que eu suspeitava
ser a alma da Rainha.
Então abriu os olhos 
Exibindo agora iris vermelhas
Fulgurantes.
Todas as moças ali ajoelhadas
E caladas puderam finalmente
se mover e falar, o poder
da Rainha não as dominava mais.

❄ — Você me enganou... me usou...
💜 — Padilha o que você fez...

Padilha ergueu o queixo
E gritou aos seres que voavam
Sobre nós:

🍷 — Lúcifer! Cumpriste a tua parte no acordo, agora cumpro a minha! Desça! Eu, filha desta terra permito que habite sobre ela!

E eles desceram, eram seres
Tao brancos que as peles
Até tomavam um tom acinzentado,
Os cabelos longos e louro prateados,
As asas de plumas alvas como a neve
e os olhos de iris de prata
Cheios de maldade.
Eram dezenas, centenas...
E o último a descer foi o líder,
Lúcifer era o único a ostentar
asas e cabelos negros como petróleo,
Ele pousou ao lado de Padilha
E sorriu para ela.
Ela por si ergueu a mão
E ele apanho a beijou sobre
Os dedos.

👹 — Grato. 
Disse com o tom de voz
Mais afinado que ja ouvi.

Ela acariciou-lhe a bochecha
E saiu caminhando, ajudou
Sete Saias a ficar em pé e 
Saíram as duas de braços dados.
Corri atras delas e as parei
Na entrada no cemitério.

🎩 — O que você fez Padilha... tem noção da gravidade do que fez?
🍷 — Sinceramente? Noção de toda a situação eu não tenho, mas hoje derrotei uma Rainha. Sabe como diz o ditado, Rainha morta, Rainha posta. Eu sou a grande agora. E você meu caro terá a chance de ser uns dos poucos que poderá se sentir seguro daqui por Diante, pois eu o protejerei. 
🎩 — E quem você pensa que é com essa megalomania toda?
🍷 — Eu não penso que sou, eu de fato sou Maria Padilha... Das Almas.

E ela gargalhou, se virou e junto
Com a amiga sumiu 
Na escuridão da madrugada.
A daquela noite, por muitos
e muitos anos o que existiu
Aqui nesta terra foi o mais
Puro império do terror.




🌷🌹🥀🍷🍾🍸🌷🌹🥀🍷🍾🌷🌹🍷

Leu até aqui? Agora volte e leia tudo novamente, mas agora na ordem CRONOLÓGICA:

1.👑Rainha das 7 Encruzilhadas
2. ⚰ Sete Catacumbas 
3. 👹 Maria Quitéria 
4.🍸 Dama da Noite 
5. 🦂 Tata Mulambo
6. 🌸 Menina
7. 👠Maria Mulambo 
8. 💋 Maria Navalha 
9. 💀Rosa Caveira 
10. 🍷🌈 Sete Saias
11. 🌹 Rosa Vermelha 
12. 🌺 Maria Farrapo
13. 👄 Maria Padilha 


🕯⚰🗡🕯⚰🗡🕯⚰🗡🕯⚰🗡🕯⚰🗡🕯⚰🗡
Felipe Caprini, Contos das Muitas Marias
Segunda Temporada — PARTE 2
🕯⚰🗡🕯⚰🗡🕯⚰🗡🕯⚰🗡🕯⚰🗡🕯⚰🗡

Espero que tenham gostado!
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Muito obrigado!


Comentários

  1. Ain Felipe.. para de ser tão fabuloso assim pfv? Vai matar outro ♥️ adoro sua arte ;)

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  2. caraca mermão vc é incrivel, seus contos são incriveis, já pensou em lançar um livro? eu seria a primeira a comprar! vou agora reler as historias nessa ordem que vc disse.

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  3. Ah esqueci de falar dos desenhos, eles são apaixonantes e são exatamente iguais aos descritos nos contos! Maravilhosos. Te desejo todo sucesso do universo <3

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