A Família Salvaterra - Capitulo 2 - Final


Felipe Caprini

A Família Salvaterra


Capitulo II
Saraivada



Belladonna trabalhou junto com Cassandra muitas outras vezes tendo de usar de muita paciência para suportar os insultos e ser constantemente chamada de bastarda. Enfim chegou o dia quinze de dezembro, dia da última reunião anual da Strega, todo o conselho se reunia para tratar de assuntos pertinentes ao próximo ano, a reunião se dava como sempre no edifício oficial e todas as treze mulheres se encontraram na sala de Victoria Linneane. Belladonna ficou sentada em uma poltrona na recepção por mais de uma hora até que foi chamada, quando entrou naquela sala exaustivamente branca ficou diante das treze bruxas velhas mais influentes da Europa, todas sentadas em poltronas dispostas em círculo.
     — Senhoras essa é a mulher que eu mencionei, Milena Diva Belladonna de Agrippa Von Nesttesheim, ela não usa o nome Salvaterra mas eu a reconheço agora diante de todas vocês e a autorizo a ser renomeada como Milena Diva Belladonna Salvaterra.
Todas as anciãs olharam para Belladonna com expressões de profundo desprezo.
     — É isso, agora pode se retirar. — Victoria falou torcendo os lábios.
     — Bem... Obrigada. — disse Belladonna já se virando para sair.
     — Ah Cassandra isso é um erro, um erro. Olha para a cara dessa mulher, ela não é uma de nós, não faça isso. — Uma das mulheres falou e Belladonna se virou para ver quem era.
     — E quem é você para me julgar apenas pela minha "cara"?
     — Quem seu eu? Meu "anjo", Eu sou Lilibeth Bolena, lider da família Bolena, ja ouviu falar por acaso ou na sua terra não se conhece a história das Bruxas?
     — Não, eu não me interesso por histórias tolas de gente velha. — Belladonna mentiu, ela sabia muito bem quem eram as Bolena, todas as Bruxas do mundo já haviam ouvido sobre essa família.
     — Empafia! — Lilibeth gritou agarrando os braços da poltrona — Bastarda imunda! Imunda! Nunca uma filha de ninguém falou assim com uma Bolena!
     — Alto lá! — Cassandra interveio — Você não pode chamar ela de filha de ninguém um minuto depois de eu ter concedido a ela o nome da minha casa! Isso é uma ofensa a mim!
     — Não quero te ofender Cassandra mas você sabe que essa bastarda é fantoche de Samyaza, e sabe das minhas suspeitas sobre ela! Misori! Misori de a sua opinião! — Lilibeth chamou a ancião de óculos e xale sentada ao lado que logo se endireitou na cadeira para falar.
     — Sim eu também não acho uma boa idéia. — Misori respondeu.
     — E quem diabos é você? — Belladonna perguntou.
     — Sou Misori Bathory, lider da família Bathory. Menina você nao sabe o nome de ninguém nessa sala?
     — O seu nome eu reconheço, então deixe eu te perguntar, não tem uma banheira cheia de sangue te esperando em algum lugar? Umas meninas virgens presas em gaiolas pra você e sua parentada sairem espetando? — Belladonna zombou por saber as histórias macabras sobre as bruxas Bathory.
     — Ora que falta de respeito! — Misori se indignou — Você não pode falar comigo assim!
Cassandra despencou em uma gargalhada.
     — Como ousa rir disso? — Uma outra anciã falou em tom de censura — Somos as anciãs do conselho das Bruxas, soberanas de todas a bruxas e temos de ter postura e exigir reverência?
     — Reverência? Se é o que quer tome. — Belladonna fez uma vênia exagerada — Mademoiselle me permita refrescar a sua memória, a Strega é o conselho das Bruxas da Europa e só da Europa, ou por acaso vocês tem voz ativa na África, Áustria, Ásia e nas Américas? Seus reinos caíram, vocês não tem mais colônias.
     — Escute aqui fedelha eu sou Guntherina de Bien, lider da casa de Bien...
     — Cujo a bruxa mais famosa da família foi Marga Bien? Eu sei que ela tinha um único talento reconhecido e renomado, o de abrir as pernas pra qualquer vagabundo que piscasse os olhos pra ela. — Belladonna fez piada.
     — Repita isso sua ordinária! — Guntherina se pôs em pé furiosa e apontou para Belladonna uma agulha de tricô de marfim — Fale mais merda e eu te queimo até os ossos!
     — Já chega! — Victoria interveio — Diva Belladonna, a sua parte ja foi cumprida, você já é reconhecida no conselho como uma Salvaterra, agora vá embora.
Belladonna girou rapidamente fazendo os longos cabelos se abrirem como um leque, então saiu da sala batendo a porta com força.

Como a parte do acordo cabida a Cassandra havia sido cumprida, Belladonna marcou o jantar em sua casa para a véspera de Natal, o dia que as bruxas zombam de Cristo, geralmente são festas onde elas louvam os espíritos pagãos e satânicos mas dessa vez seria apenas um jantar comum cujo o prato principal era uma trivial massa fresca. Toda a família veio, até mesmo Vivian que estava ali com único e exclusivo interesse na colher de pau.
Ahiliel recebeu a todos e então foi chamada Belladonna no quarto, ela estava usando um vestido longo azul marinho de mangas cumpridas e justas, a gola rolê, as sandálias de salto alto com plataforma meia pata, cabelo preso em um coque apertado, a maquiagem muito escura, batom marrom e olhos com sombra preta esfumada até as sobrancelhas, os brincos eram pequenas gemas de ametista e usava anéis de metal bruto em todos os dedos.
     — Porque está assim? — ele perguntou — Parece a Morticia Adams.
     — Obrigada, gosto dessa aparência e acho bem adequada para a noite, você sabe que o figurino é que compõe a personagem. Está com a ferramenta que eu pedi?
     — Sim claro, foi difícil de achar mas aprendi a usar bem, pelo menos bem o suficiente.
     — Na hora certa você vai usar. Ahiliel preste bem atenção, a palavra chave é "surpresa", quando eu disser essa palavra você faz a sua parte, e por favor não erre, é um momento decisivo.

Ela desceu para a sala de jantar e encontro a família já a mesa, ao todo eram vinte e três presentes ali, todos os que ela tinha conhecido e mais alguns que pareciam ser maridos e esposas humanos dos mais jovens. Ela se dirigiu a cadeira da ponta da mesa que sua por direito já que era a dona da casa, se sentou e deu uma boa olhada no rosto de cada um, a maioria estava conversando distraído mas Vivian e Cassandra a encaravam como corujas.
     — Muito obrigado por terem vindo, esta noite é de celebração. — Belladonna falou sorrindo para todos.
     — Nós é que agradeço pela gentileza em nos convidar. — Odessa falou com simpatia.
     — É verdade que você ofendeu várias das anciãs do conselho? — Elizangela perguntou afobada.
     — Elizangela cale a boca. — Cassandra censurou a filha.
     — Não, tudo bem. É infelizmente é, perdi a cabeça. — Belladonna fingiu remorso.
Nesse momento Ahiliel entrou na sala com passos largos trazendo um violoncelo e o pôs ao lado da cadeira do fundo atrás da de Belladonna, então saiu para a cozinha e voltou com um grande caldeirão de macarrão, em uma segunda viagem trouxe caçarolas com os molhos e outras com acompanhamentos.
     — Você vai mesmo servir macarrão para italianos? — Cassandra escarneceu.
     — Mamãe! — Elizangela falou em tom áspero — Seja educada. E a última vez que comemos macarronada foi quando viajamos para a Grécia, isso faz mais de dez anos.
     — É claro, nunca mais comemos porque você não sabe cozinhar nada, nem ferver água e por macarrão instantâneo dentro.
     — Eu sei cozinhar muito bem, mas tia Vivian gosta mais do que eu então ela faz a comida, e pare de falar como se a senhora soubesse fazer qualquer coisa doméstica.
     — Eu não preciso saber fazer coisa domésticas, sou uma bruxa! — Cassandra respondeu falando entre os dentes.
     — Eu também sou bruxa! — Elizangela gritou.
Todos emudeceram após o grito.
     — Música ao vivo! Que maravilha! — Luciana disse animada apontando para Ahiliel que a essa altura já estava sentado na cadeira do fundo ao lado do violoncelo.
     — Não ouse cantar — Cassandra falou — Sua voz soa como grunhidos de epilético, eu não tenho que ouvir isso.
     — Mamãe não seja desagradável. — Elizangela deu um soco na mesa — Se não tem nada de bom para falar então fique quieta.
     — Pessoal vamos comer antes que esfrie... — Belladonna pediu e então todos começaram a se servir.
     — O que eu devo fazer? Por eu mesma a comida no prato? — Vivian falou.
     — É muito difícil pra você? — Belladonna perguntou de modo ácido.
um dos filhos serviu Vivian que nitidamente estava incomodada.
— Espero que esteja a contento. — Belladonna disse sorrindo.
     — Tem pessoas que não tem noção. — Vivian falou em tom baixo.
     — O que foi? Quer dizer algo? — Belladonna perguntou.
     — Você, uma garota tola afrontar as anciãs. Pura estupidez, você uma garota tola nos fazendo vir comer macarronada. Você uma garota absolutamente tola. — Vivian remexeu a comida no prato com o garfo mostrando não ter vontade de comer nada — Seria melhor você entregar logo a maldita colher de pau e nos deixar ir embora, não quero desperdiçar a minha noite aqui.
     — Tia! — Elizangela tentou censurar Vivian.
     — Pois bem, eu também não quero desperdiçar a minha noite. — Belladonna ficou em pé e deixou a colher de pau deslizar de sob a manga do vestido onde a escondeu e mostrou a Vivian — Aqui esta, o bem mais precioso da família Salvaterra, a colher de pau que foi matertua da primeira bruxa da família.
     — Passe pra cá. — Vivian ficou em pé e fez menção de sair do assento.
     — Espere, antes eu queria dizer algo. — Belladonna falou a Vivian voltou a se sentar com enfado jogango um guardado sobre o prato — Na primeira vez que vi nossa amada e graciosa Elizangela eu percebi que os filhos dela usavam magia um no outro sem se ferir.
      — É o básico, feitiço de repelo — Cassandra disse.
     — Exatamente. Então se eu fizesse isso... — Belladonna apontou a colher de pau para Elizangela e lançou a partir da ponta faíscas que bateram na pele do braço dela sem causar mal algum. — Vejam só que coisa! Não aconteceu nada.
     — Pare de mostrar o óbvio e entregue logo a minha colher! — Vivian reclamou impaciente.
     — Só mais um segundo. No dia que conheci Elizangela uma outra coisa aconteceu, algo que me abriu os olhos. A filha dela cansada de atirar feitiços no irmão sem ter nenhum efeito acabou por acertar a cabeça dele com a quina de uma bandeja de prata, e adivinhem só! Sangrou! A testa do menino sangrou!
     — Onde você quer chegar? — Cassandra perguntou desconfiada.
     — Como vocês estão obviamente imunes a qualquer tipo de magia eu preparei uma... Surpresa. — Belladonna deu alguns passos para trás.

O que aconteceu a seguir foi muito rápido, os membros da família ouviram um característico som de velcro sendo separado e olharam para Ahiliel que estava ainda sentando ao fundo da sala, porém ele havia destacado o fundo do violoncelo e estava puxando algo de dentro dele. Não houve tempo de fazer nada, Ahiliel sacou uma submetralhadora MP5SD3 de dentro do instrumento, apoiou no ombro, fechou um dos olhos e mirou na família, então puxou o gatilho. O som era ensurdecedor, Belladonna levou as duas mãos aos ouvidos enquanto observava a sala inteira sendo destruída, a arma disparava dezenas de balas por segundo, os flashs que saiam do cano da arma quando cada projétil era lançado eram tão reluzentes que fizeram Belladonna olhas para o outro lado com medo de ficar cega, o estrondo da destruição era similar a estalos de um motor de trator, o lustre, as cortinas, os vidros das janelas, as paredes, as cadeiras e principalmente as pessoas foram massivamente destruídas.
A saraivada durou pouco mais de três minutos e então parou.
     — Achei que esse troço tinha silenciador. — Belladonna comentou dando tapinhas sobre os ouvidos.
     — O cara que me vendeu disse que tinha mas sei lá, acho que deu defeito.

Ahiliel saiu andando pela sala dando tiros de confirmação na cabeça de cada homem, mulher ou criança caídos no chão, os cacos de vidro e louça, as lascas de madeira, tudo estava vermelho pelo sangue espirrado.
     — Parece que alguém tentou fazer suco de tomate mas esqueceu de por a tampa no liquidificador. — Ahiliel fez piada apontando para os respingos vermelhos que combriam o ambiente.
     — Eu sabia, elas eram imunes a feitiços mas não a armas humanas. — Belladonna comemorou tirando as mãos dos ouvidos.
     — Você é pirada. — Ahiliel comentou.
     — Mas porque?
     — Você não tinha certeza se isso ia funcionar, se não tivesse dado certo elas teriam te estraçalhado.
     — A sorte me ronda. Agora eu sou a única da família viva e a cadeira no conselho só pode ser minha.
     — Caralho... Belladonna nos temos um problema. — Ahiliel olhou para ela tenso.
     — O que foi?
     — Falta um corpo aqui, Cassandra não está entre os mortos.

O ronco do motor da limousine veio do jardim e Belladonna correu até a janela para ver o que era e viu o grande carro manobrando e saindo pelo portão em alta velocidade.
     — É ela! Ela escapou! Como ela conseguiu?
     — Ela deve ter se teleportado pra fora. — Ahiliel falou.

Eles correram para a garagem, ele deu partida no Mercedez e começaram a perseguição pelas ruas inabilitadas da região campestre que Belladonna morava, a limousine não corria muito comparada o potente motor Mercedez-Benz que a perseguia, Ahiliel mandou Belladonna se segura e pisou fundo no acelerador fazendo curvas fechadas, alcançando o carro e batendo na traseira com violência, a limousine bamboleou na estrada instável mas conseguiu se manter na corrida.
     — É um carro muito grande, se desestabilizarmos o chaci o eixo parte ao meio — ele comentou.
     — Que isso? Um anjo mecânico? Acha que eu entendo de eixo? Só dirija! — Belladonna respondeu irritada.
Ahiliel pegou a submetralhadora e colocou para fora da janela mirando na traseira da limousine, mas quando foi atirar Cassandra colocou a mão para fora da janela e lançou para trás um raio elétrico que acertou na arma e a lançou longe.
     — Merda! Paguei seis mil dólares naquela arma! — Ele reclamou.
     — Deixe pra lá, alcance ela e eu faço o resto. — Belladonna disse.
Ele acelerou novamente e bateu na traseira de limousine fazendo a tampa do porta malas afundar e estilhaçando o vidro traseiro. Foi então que Cassandra acelerou o carro e quando percebeu que o Mercedez estava exatamente atrás pisou no freio com os dois pés. Ahiliel tentou parar a tempo mas nao conseguiu, meteu o frente do Mercedez na traseira da limousine que por ser comprida absorveu bem o impacto mas o Mercedez foi tão atingindo que por um momento ficou com a traseira no ar e quase virou. O capo estava detonado e a parte do mortor cheirava a óleo queimado, a força da batida foi tão forte que Belladonna e Ahiliel bateram as cabeças no para-brisa com tanta força que se cortaram.
     — Piranha! — Belladonna gritou ao notar sangue escorrendo pelo rosto — Abriu um corte no meu couro cabeludo!
Após tentar fazer o carro pegar três vezes e nada tiveram de abandonar o veiculo.
     — Rápido, vamos para fora! — Ahiliel falou saindo do carro e dando a volta para ajudar Belladonna a descer.
     — Eu estou bem — Ela falou enquanto afastava um filete de sangue da testa — Como vamos seguir agora? Merda! Se ela chegar até a Strega e fizer a denúncia teremos milhares de bruxas atrás de nós.
Ahiliel anuiu e então tirou o paletó e a camisa e logo as asas apareceram, ele pegou Belladonna no colo e correu por alguns metros pegando impulso e alçando vôo.
     — Isso ai! Pensou rápido! — Belladonna agradeceu.

Voando alçaram a limousine em pouco tempo, quando estavam exatamente sobre ela Belladonna apontou a colher de pau para baixo entoando a ladainha " mudkhat alriyah", o ar tremulou como se estivesse quente e desceu em uma lufada até atingir a limousine afundando o teto, ela girou na estrada e parou atravessada mas Cassandra fazendo alguma bruxaria conseguiu endireitar o carro na estrada e prosseguiu a corrida.
Ahiliel bateu as asas e subiu mais alto onde as corrente de ar são fortes e assim foi possível planar em maior velocidade, Belladonna apontou para baixo com as duas mãos, uma segurando a colher e a outra com o polegar segurando os dedos médio e anelar e então entoou "sirae alwahsh" e os fios elétricos dos postes da estrada se soltaram e chicotearam a pista até um enganchar nas rodas da limousine, isso travou o rolamento e causou uma freiada em apenas uma das rodas, o carro entortou, a parte ds frente se inclinou para um lado e a de trás para outro torcendo totalmente a lataria, então capotou três vezes fazendo a roda presa pelo fio saltar pela estrada, rolou estilhaçando todos os vidros e atirando para fora tudo o que tinha na parte traseira, um frigobar e garrafas de champanhe saíram voando para todos os lados, o carro acabou parando inclinado encostado em um poste com fogo saindo das rodas traseiras. Ahiliel pousou perto e Belladonna, os dois olharam a limousine de longe.
     — Será que ela ta viva? O carro deu P.T., ela deve estar despedaçada lá dentro. — Belladonna comentou.
Ahiliel deu alguns passos adiante afim de ver se Cassandra havia sobrevivido mas parou quando ouviu barulho vindo da cabine do motorista, a velha meteu um chute nos resquícios de vidro da porta da limousine removendo os estilhaços e saiu de lá com a vitalidade de uma jovem ginasta, a roupa estava um pouco rasgada e suja de sangue mas ela parecia muito bem, tinha na mão um chifre de boi talhado com simbolos celtas, mostrando que com certeza aquilo era uma mattertua. Ela saltou para o asfalto estalando os saltos do sapato contra o chão duro e ao ver Belladonna ergueu o braço e girou o chifre de boi no ar, um fio de raios surgiu transformando aquilo em um chicote elétrico.
     — Eia! Venha! Me enfrente desgraçada! Venha! — Cassandra gritou.
     — Pare com isso, não tem esperança pra você velhota, você sabe. — Belladonna zombou mas manteve a colher de pau apontada para a Cassandra.
     — Porque fez aquilo? Heim? Aquelas pessoas... Minha família não era ameaça para você! Eu e Vivian com certeza mas eles não. porque fez isso? Eu não entendo onde queria chegar. — A velha perguntou com os olhos cheios de lágrimas.
     — Não entendeu? Eu os identifiquei como obstáculos, e tive de remover. — Belladonna respondeu.
     — Obstáculos? Como se a vida fosse um jogo de xadrez? Seja qual for o seu objetivo, matar minhas filhas, netos, sobrinhos... Isso não era necessário! Não era e você sabe! — Cassandra tinha filetes pretos nas bochechas devido a maquiagem dos olhos estar derretendo junto as lágrimas.
     — Eu... — Belladonna vacilou por um segundo — Não importa. O que está feito está feito.
     — Eles eram toda a família Salvaterra! Você ateou fogo na própria árvore genealogica... — Cassandra Murmurou.
     — Toda a família? Mentira, a família Salvaterra tem mais de trezentas pessoas e você sabe.
     — Está falando dos humanos? Aqueles que nasceram sem poderes? — Cassandra riu nervosa — Eles contam como nada.
     — Meu pai adotivo conhecida muito da família Salvaterra e ele me disse que a maioria de nós não são bruxas, e que quando isso acontece, quando vocês acabam por parir uma criança sem dons ela é dada para ser criada por um ramo da família obscuro. Eu sei que você pariu crianças sem poderes além destas que morreram hoje, onde elas estão? Tem certeza que quer encher a boca pra falar de amor a família? Engula essas lágrimas! — Belladonna gritou.
     — Você não pode me julgar por esse pecado, afinal o que aconteceu com Betânia? Heim? Achou que eu não sabia da sua filha sem poderes? A tal que foi usada de incubadora para parir o Deus do fim do mundo? Você é da família Belladonna, com certeza é, veja como se comporta, exatamente como eu e tantas outras deste sangue.
     — Ok eu não vou ficar de hipocrisia aqui, mas a única coisa reconfortante é que eu sou a última deste sangue. A família Salvaterra morrerá comigo.
     — Você realmente acha que pode me derrotar? — Cassandra perguntou com um sorriso lunático nos lábios.
     — Mas Cassandra olhe para si mesma, olhe para o que aconteceu esta noite, não percebe que eu já te derrotei?
 
Cassandra soltou um urro raivoso e girou o chicote no ar batendo em Belladonna mas esta antes de ser atingida vibrou a colher de pau e lançou uma massa de ar contra a inimiga a fazendo cair deitada.
     — Você está velha demais. — Belladonna olhou para Cassandra com verdeira pena.
     — Você também está velha, é sexagenária que sei! — Cassandra falou arfando enquanto tentava se levantar — Você me olha com medo não é?
     — Medo? Medo de que? — Belladonna riu.
     — Medo por saber que por trás de sabe-se-lá que magia usa para fingir ser uma moça você é velha, e vai ficar tão velha quanto eu. Não existe magia que dure eternamente, nem a magia de Samyaza durará, e então você será como eu, velha e senil.
     — Tem razão eu por na baixo desta pele aveludada e viçosa na verdade sou velha sim, não falta muito para que eu me tornei septuagenária, mas isso de faixa etária só existe para quem é fraco. Bruxa burra morre velha, bruxas como eu não morrem nunca.
     — Vamos ver isso já! — Cassandra gritou e apontou o chifre para Belladonna fazendo o chicote se tornar um raio de fato, a descarga elétrica atingiu a inimiga em cheio mas Belladonna não caiu nem tremeu, bateu no raio com a mão aberta e ele se desviou para o lado.
     — Como fez isso? — Cassandra perguntou assombrada.
 — Passei uma temporada no inferno, e não tem escola melhor.
     — Entendo. Então você me força a tomar atitudes extremas.

Cassandra gritou e seu corpo se elevou no ar, seus pés estavam a mais de um metro do chão, com os braços esticados ela ergueu as palmas das mãos para cima e clamou:
     — Eu sou uma mulher velha, não posso muito e confesso, mas tenho quem lute por mim. Ferrabraz! Ferrabraz demônio a qual eu dei minha alma no raiar da minha juventude, ati servi com meu espírito e meu sangue! Me valha neste momento e trave essa batalha! Que seja a hora derradeira mas a hora da vitória!

Lentamente Cassandra flutuou para baixo até pousar no chão, mas seus quando pisou no solo seus ombros tremeram com violência como se estivesse em síncope, quando olhou para frente seus olhos eram dois buracos negros e da boca pingava sangue.
     — Ai merda, agora a coisa vai ficar feia... — Ahiliel puxou Belladonna pelo braço tentando tirar ela dali.
     — O que foi? Porque está com medo? — Belladonna perguntou.
     — Cassandra está possuída por um cão de caça. — ele explicou.
     — Cão de caça? O que é isso?
     — Um espírito irracional, são escravos dos grandes demônios e usados em guerras, servem apenas para matar, e são incrivelmente poderosos. Nenhum humano consegue incorporar com um deles sem perder a vida, isso significa que Cassandra acaba de se suicidar só para conseguir trazer este cão aqui.
As árvores em torno se mexeram e sons de latidos e uivos vinha de perto, de longe, de todo lado, sombras negras percorreram o asfalto até se aglutinarem a sombra de Cassandra.

Ahiliel se pôs em posição de combate e seu corpo brilhou tal qual uma lâmpada até que quando o brilho se foi ele estava vestido com armadura dourada, uma placa de peito com dois beija-flores gravados e no meio escrito em letras romanas o nome "Adonai", os dois braços eram protegidos por grandes braceletes que iam do pulso até os ombros, havia uma saia curta de tecido branco e as pernas tinham grevas protegendo as panturrilhas sobre a sandália de couro branco com amarração gladiadora. Ele trazia nas mãos um par de adagas curtas estilo "sai".
     — É grave assim? — Belladonna perguntou olhando para ele.
     — Muito. Sugiro que também se prepare, lembra do feitiço de proteção que você treinou?
     — Lembro.
Belladonna ficou com a coluna ereta e quando começou a ladainha foi empurrada por Ahiliel que a tirou o caminho de Cassandra que veio correndo em uma velocidade anormal para um ser humano com a cabeça abaixada em uma posição similar a de um bode que chifra.
     — Merda, olhe os pés dela! — Ahiliel chamou a atenção e Belladonna viu que dos Cassandra dos joelhos para baixo tinha agora patas de bote.
     — É um velocista, vai atacar em alta velocidade então precisamos ter extremo cuidado. — Ahiliel aconselhou.
Cassandra se virou e batendo os cascos com furia no chão correu até Belladonna com a cabeça abaixada pronta para o baque, Ahiliel entrou na frente e erguendo as mãos falou "akhraj ant waqihat" e um escudo místico em forma de diamante surgiu diante dele mas quando a cabeça de Cassandra o atingiu ele se partiu em milhares de micro cacos, ela então acertou em cheio o peito dele o arremessando várias metros para trás.
Belladonna apontou a colher de pau para Cassandra e gritou " eamana" e os olhos dela foram tomados por chamas. Ganindo como um cão ferido Cassandra caiu próximo ao acostamento.
     — O que você fez? — Ahiliel perguntou tossindo.
     — Eu a deixei cega! É um feitiço de cegueira ora essa!
     — Você só o deixou irritado idiota!
Cassandra rugiu como um leão e chifres pontiagudos subiram da testa, então mesmo com fumaça saindo dos olhos ela correu no sentido de Belladonna e dessa vez acertou em cheio, um chifre afundou bem abaixo das costelas.
     — Não! — Ahiliel gritou partindo para cima de Cassandra e cravando as adagas nas costas dela.
O cão uivou de dor e cambaleou para o lado.
     — Caralho! Caralho! Caralho! Ele abriu um rombo nas minhas tripas! — Belladonna gritou desesperada deitada no chão pressionando o furo com as duas mãos mas o sangue escorria em abundância.
     — Belladonna se lembre do básico! o básico! Você não vai morrer, o fio de cabelo de Samyaza não permite, mas tem que parar o saneamento senão vai desmaiar e ai sim o cão te destrói. — Ahiliel disse correndo até ela e pegando a colher de pau caida a alguns metros — Pegue a colher, coloque sobre a ferida e a feche.
 Belladonna pegou a colher e fez o que ele disse, a ferida se fechou imediatamente mas a dor não passou.
     — Ta doendo pra um caralho! Ela gritou.
     — O feitiço fecha e restaura e esse processo doi mais que dano. Veja, o cão está ficando em pé, temos de sair daqui. — Ahiliel falou.
     — Eu tive uma idéia, distraia ela pra mim. — Belladonna cochichou.
Ahiliel assentiu, deu um salto para frente e bateu as asas de modo espalhafatoso, Cassandra imediatamente se virou para ele ainda com as adagas presas as costas e correu para atingi-lo mas Ahiliel saltou e alçou vôo, então começou a cantar em voz alta um dos antigos louvores angelicais fazendo o cão se esquecer de Belladonna por um momento, e ela aproveitando a situação ficou em pé com dificuldade e mancou até o acostamento e apanhou no chão galho cumprido, então mancou novamente até o meio da estrada de terra e começou a girar traçando com o galho um círculo no chão, em segunda desenhou a estrela tetragramaton dentro dele.
     — O que está fazendo? — Ahiliel perguntou do alto.
     — Você disse pra me lembrar do basico, e se isso veio do inferno eu vou mandar de volta do jeito tradicional.
Cassandra ouvindo a voz dela se virou e correu para atacar mas quando entrou dentro do círculo Belladonna deu um passo para trás e saiu, porém Cassandra ficou presa.
     — Tetragramaton! As quatro letras do nome do Santo dos santos! J-A-V-E, eu digo e repito! — Ela rezou e o círculo ficou vermelho como se cada risco estivesse em brasa.
     — Você vai rezar isso? Eu não posso estar presente! — Ahiliel falou assim que pousou.
     — Ora porque não? — Belladonna perguntou parando a reza.
     — Eu também consto como um demônio, essa é a raza soberana, eu vou ser expurgado se ouvir!
     — Então va para longe a ponto de não ouvir a minha voz. — Belladonna ordenou, Ahiliel voou para longe ela voltou a rezar com as mãos estendidas para Cassandra — Spiritus Immundus! Eu que sou carne de Adão, eu que osso de Adão, eu que sou o sangue e o sal da terra lhe comando! Deixe este mundo! A tua casa é a morada da serpente, o buraco que o porco chafurda é o teu lar! Assim como os sete anjos do primeiro dia caíram, assim tu cairá também! Assim como Caim foi castigado mil vezes assim tu será também! Spiritus Immundus! Eu ordeno que diga o seu nome!
 Cassandra como que tomada por uma dor intensa gemeu "Najul-Rajul-Ra" com os dentes travados.
     — Najul-Rajul-Ra! Eu te envio para estar debaixo das catacumbas do Hades! Dez mil luas circundarão a terra antes de tu entrar nela! Eu te julgo e te condeno! Em nome do Tetragramaton! J-A-V-E! Queime!

Cassandra levou as mãos ao rosto e rasgou a carne das bochechas com as unhas, então seus olhos ficaram tão vermelhos que pareciam fornalhas acessas, em seguida veio o baque, o chão tremeu, Belladonna caiu sentada, Cassandra caiu deitada no meio do círculo, morta.

Janeiro de 1990
Era dia cinco, primeira sexta feira do ano, Belladonna estava com Ahiliel bem diante do prédio da Strega, eles haviam passado a semana revirando a mansão dos Salvaterra até que acharam o pingente, um colar de prata com um pingente em forma de lua que somente um membro do conselho podia usar, ela o ostentava no pescoço agora. Assim que o relógio marcou as dez da manhã eles entraram no elevador e então chegaram até o escritório de Victoria, a secretária ao ver a jóia no pescoço de Belladonna não fez perguntas, apenas abaixou a cabeça e abriu a porta. Ao entrar na sala eles se depararam com um círculo de cadeiras, da direita para esquerda estavam sentadas as seguintes anciãs:

 1. Victoria Linneane, lider do conselho e herdeira do assento da fundadora da instituição, a famosa Morgana Lefay.
 2. Lilibeth Bolena, herdeira do assento pertencente a Rainha decapitada, Ana Bolena.
 3. Misori Bathory, herdeira do assento de Isabel Bathory, vulgo "Condessa de sangue".
 4. Guntherina de Bien, herdeira do assento de Marga de Bien.
 5. Um assento vazio.
 6. Ofélia Delfim, herdeira do assento de Artemisia Delfim.
 7. Freda Agrippa Von Nesttesheim, herdeira do assento de Cornelius Agrippa, o único membro masculino a fazer parte da Strega.
 8. Lourice Deshayes Lavoisin, herdeira do assento de Catherine Deshayes Lavoisin.
 9. Callie Wall, herdeira do assento de Mag Wall, mais conhecido como "A Bruxa Escocesa".
10. Margaret Shipton, herdeira do assento de Ursula Shipton, mais conhecida como "Bastarda do Diabo".
11. Eleonor de La Barthe, herdeira do de Angèle de la Barthe.
12. Martha Goldi, herdeira do assento de Anna Goldi.
13. Johanna Koldings, herdeira do assento de Anna Koldings.

     — Meus cumprimentos Senhoras.
     — Belladonna? — Victoria se espantou — O que faz aqui? Você não pode entrar aqui agora, esta é uma reunião do Conselho.
     — Sei disso e por isso vim. Eu estou aqui para assumir o assento de Cassandra Salvaterra no conselho. — Belladonna falou sem rodeios.
     — Mas como assim? — Martha Goldi perguntou com os olhos arregalados.
     — Onde está Cassandra? — Eleonor de La Barthe perguntou.
     — Infelizmente Cassandra faleceu. — Belladonna respondeu com uma falsa expressão de pesar — Mas estou aqui para representar o conselho pois sou a única feiticeira da família Salvaterra viva.
     — A última? — Ofélia Delfim se impetigou.
     — Não, Cassandra possuia pelo menos uma dizia de herdeiros diretos, onde eles estão? — Callie Wall perguntou.
     — Me dói dizer mas é necessário. Eles estão mortos, todos mortos. Foram circunstâncias desastrosas, eu dei uma festa para comemorar o meu encontro com a família, acredito que houve algum vazamento de gás na casa e todos morreram. É uma pena.
Um burburinho de revolta começou entre as idosas até que Victoria Linneane interrompeu.
     — Todas as bruxas e bruxos da família Salvaterra estão mortos? Assim de uma levada só se foram absolutamente todos? — ela perguntou abismada.
     — Sim. — Belladonna confirmou.
Victoria se levantou e foi até um armário embutido em uma das paredes, abriu as portas de correr e apanhou uma grande taboa octagonal negra com constelações desenhadas, voltou para a cadeira e sentou com a taboa no colo.
     — Ela vai consultar os espíritos da verdade... — Ahiliel cochichou no ouvido de Belladonna.
Cassandra passava as pontas dos dedos pela taboa com os olhos fechados em um gestual muito parecido com um cego lendo em braille.
     — As Walquirias confirmam, Cassandra e seus descendentes estão todos mortos. — Cassandra falou — Já a parte de vazamento de gás elas não confirmam.

Todas as anciãs suspiraram.

     — Por favor Madame, me parece que está a desconfiar que a família não morreu naturalmente. — Ahiliel falou.
     — E quem diabos é você? — Victoria perguntou.
     — Ahiliel, Anjo do séquito de Samyaza, estou aqui para acompanhar Belladonna.
     — Entendo. Sim eu desconfio que a uma família inteira de feiticeiros não morreu do nada.
     — Pergunte para os espíritos se eles foram vitimados por feitiçaria ou por qualquer mal sobrenatural. — Ahiliel pediu.
Cassandra voltou a examinar a taboa, então respondeu:
     — Não, não foram vítimas de nenhuma bruxaria ou feitiçaria. A não ser Cassandra que tem em si a marca de um cão do inferno em sua partida.
     — Esse cão do inferno foi atiçado contra ela? — Ahiliel perguntou.
     — A taboa diz que não, o cão foi chamado por ela.
     — Então fica claro que nenhuma bruxa ou bruxo levantou feitiços contra eles. — Ahiliel afirmou.
     — Eu disse. — Belladonna tinha riso na voz.
     — Não vou discutir isso, não agora. Porém a parte sobre você ser a mais velha da família não é verdade, existe outra mulher que tem direito a esta cadeira. — Cassandra completou.
     — Mentira! — Belladonna elevou a voz — Não há mais ninguém em toda Europa! Me diga que mulher é essa?
     — Você está certa, não há ninguém em toda Europa que seja Salvaterra, mas no Brasil existe uma mulher de nome Doralice, e ela agora é a Salvaterra mais velha viva. — Cassandra falou seria.

Belladonna ficou pálida e abriu a boca afim de falar algo mas ficou paralisada com o queixo caído.
     — Ah meu bem você se deu ao trabalho de vir aqui em outro continente fazer uma chacina e esqueceu de eliminar a parente mais próxima? Doralice é sua prima de segundo grau, você a conhece desde menina, praticamente sua vizinha por toda a vida e não se lembrou que ela tem o sangue? — Cassandra riu.
     — E-eu... Eu não... — Belladonna gaguejou.
     — Tudo bem, não se preocupe, você é membro do conselho em cargo interino até que Doralice chegue, e ela vai chegar aqui sã e salva, eu mesma vou me encarregar disso. — Cassandra falou.
     — Ok... — Belladonna respondeu atônita.
     — Então, quer se sentar e participar da reunião ou prefere se resguardar por alguns dias? A final você deve estar de luto, não está?
     — Sim claro. Com licença...— Ela deu meia volta e saiu da sala muda, Ahiliel a seguiu pela recepção, ele apertou o botão uma dezenas de vezes para chamar o elevador e quando as portas se abriram duas mulheres estavam dentro, uma loira de pele clara e a outra negra de cabelos lisos escorridos ata a cintura.
     — Senhora Samyaza! — Ahiliel se espantou e fez uma mesura desajeitada.
     — Entrem. — Samyaza respondeu seca.
Eles entraram e se espremeram contra a parede enquanto as portas se fechavam, então Samyaza falou:
     — Esta é Safira, a primeira Deusa do panteão de Sharir Malaun. Andem se curvem, é uma Deusa aqui.
Eles se curvaram rapidamente e então Safira falou com sotaque árabe:
     — Você vai para o Brasil atrás de sua última parenta viva?
     — Sim Madame. — Belladonna respondeu com os olhos baixos.
     — Não faça essa cara — Samyaza disse — Você pode ter se esquecido da velha Doralice, mas eu não. Tive o desprazer de ve-la faz pouquíssimo tempo, ela passou por um rejuvenescimento muito parecido com o seu, parece uma menina.
     — Uriel deu a dádiva a ela? — Belladonna perguntou.
     — Com toda certeza. A sua parte jornada em Roma está concluída por enquanto, você deve agora caçar Doralice e arrancar os olhos dela fora. — Samyaza falou animada.
     — Eu vou, vai ser fácil.
     —Vai ser tudo menos fácil. Doralice é uma piranha frouxa mas sozinha você não vai conseguir, ela anda com Uriel, a menina bruxa e ultimamente está metida em confusão com as... Mambo. — Samyaza falou.
     — Mambo? Elas estão no Brasil? — Belladonna perguntou levantando o olhar.
     — O anjo vermelho matou a tal Jacqueline um tempo atrás, elas tomaram isso como desaforo. — Safira disse.
     — qEntão você vai até lá, mata Doralice e então pega uma das Mambo e a força a contar onde a Rainha delas vive. — Samyaza respondeu.
     — Eu? Pegar uma Mambo? Sozinha?
     — Não sozinha. — Safira respondeu.
     — Esse pingente de lua no seu colar vai abrir muitas portas, inclusive as portas da cadeia. — Samyaza falou.
     — Cadeia? Que cadeia?
Safira dedilhou o painel de botões com os números dos andares e então ele girou e um outro painel de botões azuis escuros apareceu, ia do -1 ao -9.
     — Isso são andares subterrâneos? — Ahiliel perguntou.
     — Gênio... — Samyaza zombou — Os andares subterrâneos são a cadeia das Bruxas, elas são presas quando fazem algo inadequado, após o julgamento é decidido a prisão perpétua ou a execução. Lá em baixo tem uma menins que está no corredor da morte e que vou recrutar para o nosso time, ela vai trabalhar pra você Belladonna.
     — Entendo... Mas... Me desculpe fazer essa pergunta, porém... porque eu? Eu sei que não sou nem a mais forte nem a mais brilhante bruxa do mundo e agora sou membro do conselho e vou ter uma bruxa a meu serviço? — Belladonna perguntou.
     — Ai em nome de Elohim! Quer falar disso agora? — Samyaza cruzou os braços.
     — Tudo bem Samyaza, ela tem direito de fazer perguntas. — Safira falou — Milena Diva Belladonna, você é a escolhida porque Sharir Malaun nasceu da sua filha. — Safira respondeu.
     — E o que tem isso? — Belladonna perguntou.
     — Betânia te enfeitiçou para que você não veja Sharir, lembra disso? — Samyaza perguntou.
     — Sim. — Belladonna respondeu.
     — Ela fez isso para dificultar a nossa vida. Só a mãe pode encontrar os fragmentos de um deus estilhaçado pelo ritual de Manìa, e na falta da mãe, a avó recebe esse dom. Eu preciso de você Belladonna. — Samyaza falou.
     — Nós precisamos. — Safira completou — Só você poderá nos levar até Sharir.
     — E depois? Depois que eu encontrar os pedaços de Sharir Malaun? O que vai acontecer comigo?
     — Você será elevada a uma de nós, uma deusa no panteão da destruição, e juntas iremos trazer o apocalípce a esta terra. — Safira falou sorridente.
     — Mas e depois que esse mundo for destruído, o que faremos? — Belladonna perguntou.
     — Reconstruir, e sob os moldes de Sharir. Samyaza sentará no trono do inferno e governará absoluta, você sentará no trono de Deusa das Bruxas da nova Era, e eu serei Imperatriz ao lado de Sharir, e tudo e todos estarão sob nossos pés.
     — Puxa vida que discurso impactante. — Belladonna falou.

Safira apertou o botão de número -9 e o elevador desceu, quando as portas ae abriram elas viram nada além de escuridão, não havia nada além do negrume.
     — Aqui é a cadeia? — ela perguntou.
     — Aqui mesmo. Se qualquer uma de nós pisar fora do elevador um alarme sonoro dispara, mas se você pisar e dizer em voz alta os nossos nomes e que temos permissão de entrar o alarme não vai soar. — Samyaza explicou.

Belladonna deu um passo para fora do elevador e assim que o pé tocou no chão o pingente de lua acendeu como se fosse uma lâmpada, então ela falou com a voz firme:
     — Eu sou Milena Diva Belladonna Salvaterra, membro interina do conselho e tenho comigo tres convidados, o anjo Ahiliel, a soberana do Gehinom Samyaza e a Deusa Safira.
Uma a uma centenas de tochas presas as paredes foram se acendendo mostrando que a escuridão escondia um extenso corredor.
     — Conselheira... O que deseja? — Um homem alto de pele palida doentia usando um terno marrom surrado apareceu perto da porta do elevador e perguntou.
     — Eu desejo... — Belladonna olhou para trás.
     — Deseja visitar a prisioneira Momo, esta confinada na cela 53 — Samyaza falou.
     — É isso ai. — Belladonna confirmou para o homem e ele deu de ombros.
     — Certo. Eu me chamo Toni e sou o carcereiro. Me acompanhem. — ele disse pausadamente e com enfado.
Os quatro acompanharam o homem pelo corredor passando por diversas portas de ferro de celas, cada porta tinha um selo, um círculo com uma estrela invertida e dentro dele o desenho rústico de uma chave.
     — Esses selos nas portas fazem o que? — Belladonna perguntou.
     — São "selos alligatum" — Ahiliel falou — As portas são de ferro mas podem ser quebradas, porém com esse selo nada na face da terra pode destrui-las, elas so abrem se o selo for desativado, e como pode ver ele é desenhado pelo lado de fora.
     — E só eu posso desativar. — o homem falou.
Belladonna se aproximou de Samyaza e perguntou em voz baixa:
     — Porque dependeu de mim para vir aqui em baixo? Você pode fazer o edifício virar pó se quiser, não pode? Ou seja lá, simplesmente teletransportar essa prisioneira para outro lugar...
     — Sim você está certa, se eu estalar os dedos essa construção vira farinha, mas isso colocaria todas as milhares de bruxas da Strega contra mim. Eu também não posso raptar alguém da cadeia sem causar um enorme desconforto com o conselho, então o ideal é tirar ela daqui usando os recursos legais. E outra coisa, eu sou um anjo, nós podemos fazer tudo, com exceção de quebrar alguns selos. — Samyaza respondeu.
     — Vocês não conseguem quebrar selos? Porque? — Belladonna perguntou surpresa.
     — Porque nós e que criamos a maioria deles, inclusive aquele que você usou para exorcizar o cão do inferno do corpo de Cassandra. Os selos eram a maior arma dos exércitos angelicais, até que um de nós, um Serafim chamado Asmodiel foi obrigado a revelar isto e outras coisas para o Rei Salomão. — Samyaza contou.
     — Obrigado? Como Salomão conseguiu obrigar um Serafim a fazer qualquer coisa? — Belladonna perguntou.
     — Meu amor nós anjos caídos caímos não porque enjoamos da cara do Deus altíssimo, não, ele fode conosco desde sempre. Foi Deus que deu para Salomão um anel que controlava os Anjos. Deus fez muitas merdas, muitas mesmo.
     — Não se preocupe Samyaza — Safira falou — , na hora certa este Deus que te criou morrerá, cairá diante de Sharir Malaun, ele e todos os demais.
Safira e Samyaza riram.
     — Aqui Senhoras, cela de número 53, prisioneira Heloisa Fujiwara, vulgo "Momo". — Toni parou diante de uma porta maior que as obras e com dobradiças muito mais grossas.
     — Então, abra a cela. — Samyaza ordenou.
     — Hum... Tem certeza? — Ele questionou.
     — Se eu disse é porque tenho. — Samyaza insistiu.
     — Tudo bem, mas antes preciso perguntar, sem querer ser inoportuno mas é praxe, a senhora conselheira tem conhecimento dos crimes que a prisioneira desta cela cometeu? — Ele perguntou.
     — Não, o que ela fez? — Belladonna respondeu com inocência.
     — Heloisa Fujiwara é uma matadora de bruxas. No processo contra ela constam vinte e um assassinatos. — Ele falou com ênfase no "vinte e um".
     — O que? Mas porque uma inquisidora está aqui? Eu achei que isso era uma prisão para Feiticeiras. — Ahiliel falou.
     — Momo é uma feiticeira, o problema é ser louca. — Toni respondeu.
     — Todas as Feiticeiras são loucas. — Samyaza zombou.
     — Não, vejo que as senhoras não me entenderam. Momo é doente, tem um distúrbio mental, esquizofrenia. Quando digo "louca", acredite que não é maneira de dizer. — Toni respondeu.
Belladonna se virou para encarar Samyaza, torceu os lábios mostrando estar com dúvida mas Samyaza respondeu arregalando os olhos fixamente mostrando estar certa daquilo, então Belladonna se voltou novamente para Toni:
     — Entendo. Quero que abra a cela.
     — E que va pegar os formulários de ordem de soltura. — Samyaza completou.
     — Como é? — Toni se surpreendeu.
     — Você ouviu. — Belladonna confirmou — Vamos levar a prisioneira.
     — De forma alguma. — Toni protestou.
     — Como é? — Belladonna se zangou — Eu sou Milena Diva Belladonna Salvaterra, conselheira da família Salvaterra, você esta se recusando a me obedecer?
     — Estou. — ele respondeu sem a menor demonstração de medo — Para abrir uma cela e conceder uma visita a sua autoridade basta, mas para liberar uma prisioneira é necessário uma ordem direita de Victoria Linneane.
     — Eu estou cansada de ser subestimada. — Belladonna falou e então de repente a colher de pau estava em sua mão, ela tocou a testa do homem e disse — Abra a cela, depois vá pegar os formulários de liberação, eu vou assinar, você vai arquivar e depois que eu e minhas companheiras tivermos partido você vai entrar em uma das celas vazias, vai se deitar e desistir de viver.

Toni abriu a boca em expressão de profundo desespero, mas seguida deu um tapa na porta da cela desativando o selo, então se virou e foi caminhando para longe.
     — Isso não era necessário. — Samyaza falou.
     — Não era mesmo, ele vai morrer, vai se deitar e parar de respirar. — Safira comentou.
     — Era necessário, e o que eu fiz fará a morte parecer natural. Ele é velho, uma parada respiratória não é lá uma façanha exótica. — Belladonna respondeu.

Abriram a cela e quando entraram lá estava uma adolescente amarrada em uma maçã com cintos de couro prendendo a cada palmo, era de traços asiáticos e tinha o cabelo curto pintado de verde desbotado.
     — Credo o que é isso? Uma japonesa punk? — Belladonna perguntou olhando assombrada.
     — Vai se fuder cadela! — Momo respondeu se remexendo mas sem conseguir mover nada.
     — Ela fala a minha língua? — Belladonna se surpreendeu.
     — Ela é brasileira — Samyaza falou — Vocês brasileiros são todos cães vira-lata, você mesma é brasileira meio italiana meio indiana meio romana, criada por um alemão e teve uma filha com um roceiro, então não se surpreenda que essa menina tenha cara e nome japoneses mas seja tão brasileira quanto você.
     — Espera ai! Eu conheço você! Você é uma das vozes! Vozes na minha cabeça! — Momo gritou.
Samyaza se aproximou de Belladonna a cochichou:
     — Sabe quando o homem disse que ela é esquizofrênica? É minha culpa... Se lembra que quando comecei a te contatar fazia isso pelos sonhos? Eu fazia o mesmo com ela, queria uma aliada para você desde aquela época já que eram da mesma região. Mas em um dos sonhos eu tive um problema, me distrai ao sair da cabeça dela e deixei o canal aberto, nisso alguns demônios entraram a torturaram a mente da garota por cerca de uma semana. Quando eu voltei a visitar ela nos sonhos... Bom, digamos que consegui arrumar toda a bagunça mas parte da mente dela estava arruinada. Durante a minha "faxina" na cabeça dela murmurei uma frase... disse "bruxas tolas merecem marretadas", mas eu só disse por dizer, era um resmungo.
     — Mas a mente dela gravou isso não foi? — Belladonna perguntou.
     — Gravou. Nas semanas seguintes ela matou todas as Bruxas que conseguiu encontrar, o carcereiro disse vinte e uma mas eu sei de mais de trinta. Matou a golpes de marreta.
     — A parte boa e que essa marreta deve ter ficado muito poderosa, esmagar tantas cabeças de bruxa com certeza tornaram ela uma matertua maravilha. — Safira comentou animada.

Toni voltou catatonico, trouxe uma pasta e um saco de pano, Belladonna abriu o saco e lá estava a marreta, então pegou a pasta a assinou os formulários, Toni soltou as fivelas da maca que prendia Momo e a menina desceu com certa dificuldade.
     — Momo esta aqui é Belladonna, ela é uma bruxa, mas é uma bruxa aliada e você vai trabalhar pra ela. — Samyaza falou.
     — Trabalhar pra ela? A troco de que? — Momo respondeu.
     — A troco de ficar livre. Você gostou de ficar amarrada nessa maca? Se não quiser ir conosco você vai voltar pra ela. No final do corredor tem uma fornalha usada para incinerar bruxas condenadas a morte, você vai acabar lá se continuar aqui. — Samyaza explicou.
     — Tudo bem, mas as vozes na minha cabeça me dizem pra matar essa vaca. — Momo apontou um dedo magro com unhas sujas e amareladas para Belladonna.
     — Eu resolvo isso. — Safira arrancou um fio de cabelo de Belladonna e rapidamente enrolou no dedo da menina, o fio foi absorvido para dentro do corpo e desapareceu.
     — O que foi isso? — Belladonna perguntou.
     — Veja. — Safira arranhou as costas da mão de Belladonna com as unhas mas quem gritou foi Momo.
     — Você nos ligou! — Momo gritou furiosa.
     — Liguei, e isso significa que se você quiser marreta a cabeça de Belladonna a sua também vai ser esmagada. Então eu imagino que não vai tentar machucar ela. — Safira riu.
     — Isso significa o que? Que eu não posso mais matar bruxas? — Momo se enfezou.
     — Pode, e na verdade o plano é esse. Você só nao pode matar Belladonna, do resto pode fazer a festa. Agora vamos embora. — Samyaza escancarou a porta.
     — Embora para onde? — Momo perguntou.
     — Nos temos de voltar para o Brasil, tenho de acertar as contas com minha última parente viva. — Belladonna falou e em seguida os cantos dos lábios se torceram em um sorriso sádico.


Fim




Mas vocês ja sabem que não é o final de verdade, esse conto que acabaram de ler é apenas o terceiro da série "Urdidura das Feiticeiras", em breve trarei outro conto onde vocês poderão ler sobre o que aconteceu com Doralice e Vampira? Uriel e Matiyah estão bem? Belladonna, Ahiliel e Momo vão fazer que desgraçadas no Brasil? E a guerra de Samyaza contra Satanás?

Em breve
Aguardem.
   
 





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